Da Redação

Pesquisadores da Fiocruz Bahia identificaram o primeiro caso brasileiro de romboencefalite associada ao vírus zika, uma inflamação rara que atinge o tronco encefálico, região vital do cérebro responsável por funções como respiração e batimentos cardíacos. O achado, publicado na revista científica Viruses, amplia o entendimento sobre os efeitos neurológicos provocados pelo vírus, já conhecido por causar a síndrome congênita do zika e a síndrome de Guillain-Barré.

A paciente é uma mulher de 21 anos, sem doenças prévias, que inicialmente apresentou febre, manchas pelo corpo e dores nas articulações — sintomas típicos da infecção. Dias depois, evoluiu para confusão mental, dificuldade de fala, convulsões e perda de coordenação motora. Exames laboratoriais confirmaram a presença do vírus zika no organismo.

O tratamento incluiu o uso de corticosteroides e medicamentos antiepilépticos, com melhora gradual após quase um mês de internação. A jovem recebeu alta e retomou a rotina, mas ainda apresenta cefaleias e falhas de memória, possíveis sequelas da inflamação.

Zika e o cérebro: novas evidências

O estudo propõe três hipóteses principais para explicar como o zika pode causar esse tipo de lesão cerebral:

  1. Ação direta do vírus sobre as células nervosas, danificando o tecido cerebral;
  2. Resposta inflamatória excessiva, em que o próprio sistema imunológico agrava a infecção;
  3. Mecanismo autoimune, no qual os anticorpos produzidos para combater o vírus passam a atacar estruturas do sistema nervoso.

Nenhuma dessas teorias foi confirmada de forma definitiva, mas todas reforçam a complexidade da interação entre o zika e o sistema nervoso central.

O diagnóstico da romboencefalite costuma ser desafiador: ressonância magnética e tomografia podem indicar alterações, mas nem sempre revelam o quadro completo. Por isso, os sintomas clínicos — como febre acompanhada de convulsões, confusão mental e déficits motores — continuam sendo essenciais para orientar o diagnóstico.

Novo alerta em meio à aparente calmaria

O registro do caso marca um novo alerta epidemiológico. Até então, as complicações mais graves do zika estavam associadas a gestantes e recém-nascidos. Agora, o vírus mostra potencial para afetar também jovens adultos saudáveis.

Embora o Brasil não enfrente um surto expressivo desde 2016, o vírus ainda circula silenciosamente. Dados do Ministério da Saúde apontam 3.874 casos prováveis em 2025 até setembro e mais de 5 mil notificações em 2024 — números que podem ser subestimados pela baixa procura por atendimento médico.

Para os pesquisadores da Fiocruz, o caso reforça que o zika não desapareceu e segue sendo uma ameaça potencial, principalmente em regiões onde o mosquito Aedes aegypti continua ativo.

“Mesmo fora do foco da mídia, o vírus ainda está presente e pode causar quadros neurológicos graves. A vigilância precisa continuar”, alertam os autores do estudo.

O caso da jovem baiana serve, portanto, como um lembrete científico e de saúde pública: o zika pode parecer adormecido, mas sua capacidade de provocar complicações severas segue viva — e exige atenção constante.