SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – A contadora Mariana Almeida Caserta Nocera, 36, está confinada em um resort na Jamaica com o marido, os pais e dois tios enquanto o furacão Melissa —que pode ser o mais poderoso da história do país— se aproxima da ilha. Com aeroportos fechados e previsão de ventos de quase 300 km/h, ela descreve o medo de enfrentar a tempestade.

“A GENTE SÓ QUER SOBREVIVER”

A família chegou à Jamaica antes do alerta de emergência. Mariana desembarcou em Ocho Rios, no norte da ilha, na sexta-feira (24), com o marido, os pais e dois tios. O grupo se hospedou no hotel RIU Ocho Rios e, na recepção, já foi avisado que o país estava sob observação devido à aproximação do furacão Melissa. “Na hora, disseram que estavam acompanhando meteorologicamente, que o furacão estava se movendo devagar. Parecia algo distante”, contou ao UOL.

Os primeiros dias foram normais, mas o clima mudou no fim de semana. Sexta e sábado ainda pareciam dias comuns de férias. “Estava tudo funcionando, piscina, bares”, relata Mariana. Até que, neste domingo (26), o hotel passou a recolher cadeiras, espreguiçadeiras e avisou que o resort entraria em lockdown.

O hotel impôs confinamento e distribuiu kits de emergência. Segundo Mariana, os hóspedes receberam sacolas com dois Cup Noodles, um suco, um achocolatado e um pacote de bolacha. “Disseram que isso seria almoço e janta.” Em princípio, os kits seriam levados aos quartos, mas, desesperados, os hóspedes formaram uma fila onde os kits estavam.

Os comunicados pedem barricadas e isolamento nos banheiros. O hotel orientou os hóspedes a colocar colchões contra janelas e portas de varanda e a se abrigarem nos banheiros durante o auge do furacão. “Eles dizem que os ventos podem chegar a 300 km/h. É assustador”, descreve. “Estamos tentando manter a calma, mas é impossível não sentir medo.”

“É fazer uma barricada na janela frontal, que dá para a sacada, para proteger da quebra do vidro. E nos orientaram a ficar nos banheiros, que são a parte mais funda do quarto”, disse Mariana Almeida Caserta Nocera.

Por não saberem o que pode acontecer, brasileiros tiveram de tomar medidas emergenciais. Mariana viaja com quatro familiares idosos. A mãe e a tia, diabéticas, dependem de medicação contínua —uma delas toma antidepressivos controlados. “A gente conseguiu contato com um médico local para repor remédios.” Além disso, já deixou um carregador portátil à disposição, além de contar com o plano de internet que contratou para a viagem, caso a energia elétrica e, consequentemente, os aparelhos de wi-fi, sejam desconectados.

Funcionários e hóspedes tentam manter a calma, mas o clima é de tensão. Hóspedes formam filas em busca de refeições e há medo de falta de comida e água. “Tem gente pegando o que consegue e levando para o quarto. Eu chorei muito neste domingo (26). A gente nunca viveu algo assim.”

Sem chance de voltar, o grupo espera em local alto e seguro. O voo de retorno ao Brasil estava marcado para quarta-feira (29), mas todos os aeroportos foram fechados. “Estamos no quinto andar, numa área alta. Dizem que aqui é uma das regiões mais seguras da ilha. Mesmo assim, é impossível não ter medo.” A irmã dela ficou em São Paulo, cuidando da avó de 89 anos. Daqui, acompanha, apreensiva, as atualizações sobre o furacão, que já levou o governo jamaicano a decretar estado de emergência e fechar portos e aeroportos.

“Procuramos a imprensa porque a gente quer dar visibilidade a isso. Se for uma catástrofe, que pelo menos saibam onde estamos. Só queremos sobreviver e voltar para casa”, disse Mariana Almeida Caserta Nocera.

O Consulado do Brasil em Kingston informou ao UOL que as informações sobre a situação de brasileiros serão passadas pelo Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty). O Itamaraty também foi acionado, mas até a publicação desta reportagem não enviou resposta. O espaço segue aberto para pronunciamento.

JAMAICA SE PREPARA PARA O PIOR FURACÃO DA HISTÓRIA

Melissa atinge categoria 5 e pode causar destruição sem precedentes. Segundo a emissora americana ABC, o furacão deve chegar à Jamaica entre a noite de segunda (27) e a manhã de terça (28), com ventos de até 265 km/h. Meteorologistas dizem que o Melissa pode ser “o mais forte da história” do país.

Chuvas podem ser até quatro vezes mais intensas que a média mensal. O Serviço Meteorológico da Jamaica prevê até 102 cm de precipitação em quatro dias — 4,3 vezes o volume normal de outubro. A CNN informou que há ordens de evacuação em áreas costeiras vulneráveis.

Tragédia já começou em outros países do Caribe. De acordo com a BBC e a Reuters, Melissa já matou três pessoas no Haiti e uma na República Dominicana, antes de chegar à Jamaica.

Governo mobiliza mais de 800 abrigos e militares. O ministro de Água e Meio Ambiente, Matthew Samuda, disse que “a hora de preparação acabou” e pediu que moradores busquem lugares altos: “Isso pode salvar vidas”, afirmou em coletiva reproduzida pela ABC.

Todos os aeroportos estão fechados e há risco de falta d’água. O governo local alertou para o uso moderado dos recursos, já que redes de abastecimento podem ser danificadas. “Cada gota vai contar”, disse Samuda.

Mudanças climáticas agravam o risco. Especialistas ouvidos pela BBC e pelo Centro Nacional de Furacões dos EUA explicam que as águas mais quentes do oceano estão acelerando a intensificação de furacões como o Melissa, dificultando evacuações e ampliando o potencial destrutivo.