RIO DE JANEIRO, RJ (UOL/FOLHAPRESS) – Henrique Marques se tornou o primeiro brasileiro a ser campeão mundial de taekwondo. Muito antes de alcançar o topo do mundo na edição de Wuxi, na China, porém, ele superou as dificuldades de uma vida em um bairro pobre, uma arritmia cardíaca que quase o fez abandonar a carreira e a perda do pai.
Natural de Itaboraí, no Rio de Janeiro, Henrique conviveu com os obstáculos de morar em uma localidade sem muitos recursos básicos. A Vila Portuense chegou a ganhar um apelido pejorativo de “vale da merda” por conta de um valão que enche de esgoto quando chove.
“Eu venho de um bairro pequeno, e morava no local mais humilde do bairro, que era taxado com termos pejorativos. Morávamos em uma situação muito, muito, muito ruim. O taekwondo me proporcionou uma vida melhor. Hoje, tenho condições melhores do que eu tinha e consegui realizar um pouco do sonho da minha família, que era sair do local onde morávamos. nesta segunda-feira (27), moramos em uma casa melhor, temos uma situação de vida melhor, e sou muito grato ao esporte por isso”, disse Henrique Marques, ao UOL, no Pan-Americano Júnior.
Ele começou na modalidade aos oito anos, a partir de um convite de Iris Sing medalha de bronze nos Jogos Pan-Americanos de Toronto-2015, e conta que foi através do esporte que conseguiu mudar o panorama da vida da família.
“Eu fazia jiu-jítsu antes, mas, de tanto que eu assistia às aulas de taekwondo, ela me chamou para participar. Foi paixão à primeira vista. O taekwondo é muito de superação, todo dia você está se superando. E isso é algo que acho incrível no esporte”, disse.
Henrique cresceu ao lado dos cinco irmãos. Estudou em escola pública e ganhou uma bolsa de 50% para as aulas de taekwondo. Mesmo com o desconto, que fazia a mensalidade ficar em torno de R$ 25, era difícil manter. O pai trabalhava em obras e a mãe como diarista, e, apesar da realidade financeira, não deixaram de apoiar o filho. Eles chegaram a pedir um cartão de crédito emprestado para arcar com os custos de torneios. O próprio atleta também corria atrás de recursos através de rifas.
Foi assim que, por exemplo, pôde estar no Brasileiro de 2018. O título representou uma mudança de chave. “Fui ganhando campeonatos pequenos até que, em 2018, fui campeão brasileiro. Desde então, consegui seguir carreira. Hoje em dia, tenho oportunidades de representar meu país, o que é extraordinário”, completou.
Eu me sinto muito feliz com cada medalha, ver que meu esforço está valendo a pena, mas fico mais feliz ainda de voltar para casa com uma medalha de ouro e falar: ‘mãe, consegui mais uma para a gente. Estamos no caminho certo’, esse é o maior valor de todas essas conquistas que tenho conseguido’ Henrique Marques
QUASE ABANDONOU CARREIRA
Henrique se preparava para integrar a delegação nos Jogos Pan-Americanos de 2023, em Santiago, Chile, quando descobriu uma arritmia cardíaca. Ele foi cortado do torneio e teve de passar por uma cirurgia. Os próximos passos na carreira se tornaram uma incógnita.
Fui cortado dos Jogos Pan de 2023 e, à época, foi algo muito frustrante. Uma arritmia cardíaca foi descoberta nos últimos exames, mas creio que Deus tinha um propósito. Agora, estou zerado da arritmia. Meu coração batia errado 33 mil vezes ao longo do dia… Graças ao apoio que recebi, pude fazer vários exames, descobrir esse problema e ter a chance de operar antes de acontecer algo muito pior
O lutador se recuperou, as dúvidas quanto ao futuro ficaram de lado e ele voltou aos tatames. O atleta já olhava para os Jogos Olímpicos de Paris-2024 quando sofreu um novo baque. “Eu perdi meu pai no meio da preparação e foi algo muito difícil. Mas acho que toda essa superação está me fazendo mais forte a cada dia”.
TÍTULO INÉDITO
Henrique Marques conquistou a medalha de ouro na categoria até 80kg e se tornou o primeiro brasileiro a levar o título do mundial. Antes dele, apenas Maria Clara Pacheco nesta mesma edição e Natália Falavigna, em Madrid, na Espanha, em 2005.
Na final, Henrique venceu o atleta da casa Qizhang Xiang. Anteriormente, deixou para trás o cubano Kelvin Calderón Martinez, Faysal Sawadogo, de Burkina Faso, o norte-americano CJ Nickolas e Artem Mytarev, que disputou sob bandeira neutra.
“Muito feliz com essa conquista, muito feliz com o meu desempenho em quadra, muito feliz com tudo que vem acontecendo na minha vida. Saímos campeões aqui e tudo isso é graças a muito trabalho. Esse foi o primeiro passo e, se Deus quiser, lá em Los Angeles 2028 a gente vai ser campeão também”, contou, ao SporTV.




