BRUNO LUCCA

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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A sigla LGBTQIA+ está com os dias contados. Ao menos é o que afirma uma dissidência formada por lésbicas, gays e bissexuais: a Aliança LGB.

O movimento defende, sobretudo, a busca por direitos baseada na orientação sexual e no sexo biológico, deixando de lado pautas sobre identidade de gênero. Isso significa, explicam, a separação do “T” –de transexuais–em diante.

Fundada em 2019, no Reino Unido, a Aliança lançou seu manifesto internacional no último mês de setembro. Deu certo, e o chamado já chegou a outros 17 países, incluindo o Brasil. Aqui, conta com 50 membros. Em entrevista à Folha, o grupo explica sua atuação e relata seus planos.

A discordância entre a Aliança LGB e o movimento LGBTQIA+ tem origem na semântica de uma palavra: gênero.

Para o grupo de lésbicas, gays e bissexuais, o gênero é uma construção social cujo marcador principal é o sexo de nascimento. Essa argumentação vai contra o pensamento da comunidade trans, que vê o gênero como identidade e acredita que ele pode ou não ter relação com o sexo biológico.

Conforme a aliança, a segunda teoria afeta diretamente a existência homo e bissexual. “Ignorar a realidade biológica e a existência do sexo é também negar a existência da atração sexual por pessoas do mesmo sexo”, defendem.

Acusações de transfobia e a defesa do livre debate

O embate entre a Aliança LGB e a comunidade trans não se resume ao campo das palavras. Os dissidentes se opõem a temas sensíveis para aqueles inconformados com seu gênero de nascimento, como a transição de sexo na menoridade.

Quando conversou com a reportagem, na semana passada, o grupo relatou uma tentativa de integrar, como parte interessada, a ação no STF (Supremo Tribunal Federal) julgando a constitucionalidade da resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que veta procedimentos transexualizantes em crianças e adolescentes.

Não deu tempo. Na última quarta-feira (22), o plenário decidiu pela manutenção da norma.

A escolha por militar contra pautas trans rendeu à Aliança LGB acusações de ser preconceituosa e ter envolvimento com a extrema direita. Seus membros rechaçam tudo isso. “Discordar de políticas e ideologias não é o mesmo que discriminar pessoas”, afirmam. “Nosso compromisso é com a realidade material, a ciência e os direitos humanos universais.”

O grupo declara defender um movimento suprapartidário, no qual as pautas de lésbicas, gays e bissexuais sejam ouvidas sem interferência ideológica. Seus membros dizem não serem financiados por ninguém e abertos ao diálogo com todos os lados.

Eles explicam que suas as críticas não são contra as pessoas trans, mas contra a ideologia de gênero e as políticas públicas que, no entendimento deles, devem ser baseadas em evidências científicas, “principalmente quando envolvem crianças e adolescentes em procedimentos irreversíveis”.

Para os próximos anos, o movimento quer atuar em duas frentes: pela preservação do conceito de sexo biológico em documentos e estatísticas para políticas públicas e para garantir que o casamento homoafetivo não seja ameaçado por mudanças na jurisprudência do STF.

“Queremos um projeto de lei que assegure a manutenção do casamento entre pessoas do mesmo sexo e a contagem precisa dos crimes cometidos, sem distorções que ocorrem quando gênero e sexo são tratados como sinônimos”, explicam.

Além disso, a Aliança LGB defende a retomada das discussões centradas em gays, lésbicas e bissexuais, que, segundo eles, foram absorvidas pelas teorias de gênero, perdendo relevância no debate público.

“A luta pelo movimento LGBTQIA+ só será completa quando for por todas as pessoas, incluindo travestis e pessoas trans. A separação proposta pela aliança não visa enfraquecer o movimento, mas sim garantir um espaço para que a realidade dos LGBs seja respeitada sem imposições externas”, afirmam.

Os debates propostos pela união de homo e bissexuais geraram forte repercussão dentro do movimento LGBTQIA+. Organizações como o Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+ e a Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) criticaram a separação proposta pelo grupo.

O Fórum defende que a diversidade sexual e de gênero deve ser tratada conjuntamente e que a fragmentação das pautas enfraquece o movimento todo.

Já a Antra, em um manifesto, defendeu que a luta pelo movimento LGBTQIA+ só será completa “se for por todas as pessoas”, incluindo travestis e pessoas trans.