SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Se as lâmpadas LED vendidas no Brasil fossem avaliadas por órgãos reguladores da União Europeia, 94,8% delas estariam nas faixas F e G de eficiência energética, as mais baixas da lista. Mas no Brasil, por falta de regulações rígidas, todas são comercializadas livremente e são maioria nas estantes de lojas de produtos residenciais.
Em alguns casos, o cálculo pode ser ainda pior. As luminárias de LED, com os plafon, não são regulamentadas no Brasil e, por isso, nenhum limite mínimo de eficiência é aplicado a elas. Esse produto já é 60% do mercado de LED hoje em dia.
Tal lacuna custa caro para o brasileiro, que gasta muito mais energia elétrica para iluminar um quarto ou uma cozinha do que um europeu ou mais até do que quem mora na Nigéria e na Burkina Faso, que também têm regulamentações avançadas no tema.
A Clasp, organização internacional que fornece suporte técnico a governos sobre eficiência energética, calcula que o brasileiro poderia pagar 2,5 vezes menos em iluminação pública residencial em sua conta de energia se tivesse lâmpadas com a eficiência máxima determinada pela UE. Ainda que fosse na quarta melhor categoria, a economia seria de 1,5 vez.
A EPE (Empresa de Pesquisa Energética), ligada ao governo federal, calcula que o consumo residencial foi responsável por 31% de todo o gasto de energia elétrica do Brasil em 2024, sendo que dessa fatia 4% vêm da iluminação. Parece pouco, mas não é: de acordo com a Clasp, há 500 milhões de lâmpadas LED na casa dos brasileiros.
A escala faz diferença. A organização considera que se as lâmpadas LED vendidas hoje no Brasil cumprissem os melhores índices da regulamentação europeia haveria uma redução de 17 milhões de toneladas de CO₂ por ano, o equivalente a retirar cerca de 740 mil carros a gasolina das ruas. Os dados foram feitos com base em lâmpadas de 20 W.
“No Brasil, se diz que a gente tem um monte de renováveis e que, por isso, podemos gastar e expandir. Mas devido a essas ondas de calor, a gente não consegue equilibrar o sistema só com energia renovável porque ela é instável, o que nos obriga a pagar por termelétricas. Ou seja, a eficiência energética, apesar de nunca entrar como prioridade, é fundamental”, diz Edilaine Camillo, gerente do escritório da Clasp no Brasil.
O tema é hoje alvo de discussão entre técnicos do setor. Desde julho, por exemplo, está na mesa do presidente do Inmetro uma portaria com novas regras de eficiência energética para os produtos LED. O texto, que ainda precisa ser enviado para consulta pública, cria uma tabela de eficiência energética para lâmpadas e luminárias. Já outro texto, feito pelo Ministério de Minas e Energia, deve ser publicado no primeiro semestre do ano que vem com novos limites mínimos.
Hoje, a única regulamentação sobre o tema prevê uma eficiência mínima de 55 lm/W (lúmens por watt) para as lâmpadas, número inferior às das já comercializadas no país. Em outubro, a Folha entrou no site de duas grandes lojas de artigos elétricos residenciais do país e constatou que a maior parte das lâmpadas vendidas de oito marcas diferentes têm eficiência entre 70 lm/W e 100 lm/W. Para efeitos de comparação, a União Europeia, que adotou novas determinações de eficiência em 2021, espera que até o final da década suas lâmpadas LED tenham eficiência de 200 lm/W.
“No momento que a gente publicar o nosso regulamento, eu tenho certeza que essas lâmpadas vão dar um salto na eficiência energética. Hoje, o modelo que o consumidor está acostumado é olhar a potência da lâmpada e não a eficiência energética e, com a regulamentação, a gente vai mudar essa visão”, diz Felipe Monteiro, pesquisador do Inmetro responsável pela elaboração da portaria a ser lançada.
Quase todas as lâmpadas e luminárias LED vendidas no Brasil hoje são fabricadas na China. Segundo quem acompanha o mercado, isso acontece, porque os chineses conseguem produzir em maior escala, o que reduz os custos. A falta de regulamentações rígidas, no entanto, faz com que as mercadorias que cheguem no país tenham qualidade menor do que as vendidas para mercados mais rígidos.
“Os chineses têm que mudar e melhorar os equipamentos deles a cada cinco anos; essa é a legislação deles para o mercado interno. E aí eles pegam os equipamentos já produzidos e as linhas de produção que eles não querem aprimorar e exportam para países da América Latina que não tem regulamentação”, afirma Edilaine Camillo, da Clasp.
FISCALIZAÇÃO
Uma nova regulamentação é aceita inclusive pela indústria brasileira de lâmpadas. A Abilux, associação que representa fabricantes e vendedores das lâmpadas e luminárias, diz que estipular as regras de segurança das luminárias, por exemplo, é essencial para evitar que consumidores sofram choques ao manusear os produtos. Hoje, como as luminárias não são regulamentadas, não há parâmetros obrigatórios para elas.
A associação, no entanto, teme que o aumento do limite mínimo de eficiência energética desses produtos favoreça empresas que não cumprem a legislação. A preocupação se dá porque os órgãos de controle, inclusive o Inmetro, têm dificuldades em fiscalizar os produtos vendidos nas lojas, o que abre caminho para alguns fabricantes apresentarem informações falsas nos rótulos do produto.
“Se subirmos a régua e não fiscalizarmos bem, daremos mais gordura para aventureiros e o consumidor vai ficar com a sensação de que aquela marca que cobra mais caro é um ladrão. Como o consumidor não entende, ele acha que a LED de R$ 40 é igual a de R$ 20”, afirma Marco Martins Poli, diretor executivo da Abilux.
Hoje, esse tipo de fiscalização fica a cargo dos Ipem estaduais (Instituto de Peso e Medidas), com atribuições delegadas pelo Inmetro. Técnicos do órgão buscam produtos em lojas e checam em laboratórios se as características técnicas informadas nos rótulos são verdadeiras. Mas, por falta de mão de obra e recursos, só 8% dos produtos LED vendidos no Brasil passam por esse processo o último foi em 2019.
“O governo vem cortando recursos e esse tipo de operação é custoso, porque você tem que pagar a colheita desse produto no mercado, o transporte até o laboratório e o ensaio desse laboratório. O governo tinha um laboratório que acabou fechando em 2024, então a gente acaba perdendo vários recursos”, diz Felipe Monteiro, do Inmetro.