MONTROUGE, FRANÇA (FOLHAPRESS) – Lado a lado, Lélia Gonzalez e Josephine Baker; Carolina Maria de Jesus e Maryse Condé. O que há em comum entre as 15 retratadas na exposição da artista plástica brasileira Panmela Castro na França é o papel histórico na luta pelos direitos das mulheres pretas, no Brasil, na França, na África ou no Caribe.
“Retratos Relatos: Revisitando a História” fica até o final de outubro no espaço cultural Les Jardiniers, em Montrouge, cidade vizinha de Paris e acessível pelo metrô. É um dos últimos eventos da temporada do Brasil na França, programação de eventos culturais que comemora os 200 anos de relações diplomáticas entre os dois países.
A artista carioca tem se destacado no cenário contemporâneo brasileiro pela obra e pelo engajamento. Participou de mostras recentes que discutiram o racismo, como “Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro”, no Sesc Belenzinho, em 2023; e “Protagonismos”, na galeria BNDES do Rio de Janeiro, no ano passado. Nesta última, seu “Autorretrato como Tarsila do Amaral” propunha reflexões sobre os privilégios da elite.
“Foi comissionada uma exposição que tivesse recorte de gênero”, conta Panmela. A escolha de incluir o recorte étnico foi natural, em função da trajetória da artista. Em 2022, ela foi selecionada para a prestigiada residência artística Black Rock, no Senegal, travando contato com histórias que até então desconhecia.
Há mulheres praticamente desconhecidas dos brasileiros, como Maryse Condé (1934-2024), escritora de Guadalupe, arquipélago do Caribe que pertence à França; e outras desconhecidas dos franceses, como a escritora Carolina Maria de Jesus (1914-1977), autora de “Quarto de Despejo”; e a ativista Lélia Gonzalez (1935-1994).
“Por mais que tenham feito coisas muito importantes em seu tempo, elas foram muito apagadas”, lamenta Panmela. “Tanto que, de algumas, praticamente não havia imagem para eu usar de referência.” Foi o caso, por exemplo, da baiana Mãe Gilda de Ogum (1935-2000), vítima da intolerância religiosa.
Talvez o nome mais conhecido dentre as retratadas seja Josephine Baker (1906-1975), cantora e dançarina americana que se radicou em Paris e, em 2021, teve os restos mortais sepultados no Panthéon, mausoléu dos heróis nacionais franceses.
Três dos retratos foram pintados durante a própria exposição, em sessões de “live painting” diante dos visitantes. “Minha pintura é de exercício, processual. Então os traços são muito rápidos”, explica.
A rapidez esconde uma pesquisa demorada, que para a mostra na França contou com a ajuda da curadora, a historiadora paranaense Maybel Sulamita. As duas trabalham juntas na Rede Nami, entidade sem fins lucrativos fundada por Panmela no Rio para promover o acesso de grupos marginalizados à arte como instrumento de transformação.
O tema da mulher negra esteve presente em outra exposição importante do calendário da temporada do Brasil na França, “Vênus”, da fotógrafa Val Souza, que ficou em cartaz em setembro na Maison Européénne de la Photographie, em Paris.
Os painéis de Val subvertem os estereótipos sobre o corpo da mulher negra brasileira (mas não apenas negra nem apenas brasileira), com imagens das mais variadas fontes, das gravuras de Debret à Globeleza, entremeadas de autorretratos da artista, inclusive nus.
A intenção, segundo ela, não é fazer uma denúncia óbvia, e sim despertar um olhar novo. “A gente olha as imagens de uma maneira muito rasa, num viés de uma história onde só existe uma via. Existe alguém que violentou essas imagens, mas a imagem é múltipla”, explica.
A prestigiada revista TimeOut Paris incluiu a exposição de Val, com curadoria de Thyago Nogueira, do Instituto Moreira Salles, entre as principais de fotografia na capital francesa neste semestre.
RETRATOS RELATOS: REVISITANDO A HISTÓRIA
Quando Ter. a sex., das 11h às 23h; sáb.,das 14h às 18h; dom., das 10h às 18h. Até 31 de outubro
Onde Les Jardiniers – 9/11 rue Paul Bert, Montrouge, França
Preço Grátis