Da Redação
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deu um passo histórico ao autorizar, nesta segunda-feira (20), o uso do medicamento Mounjaro (tirzepatida) para tratar casos moderados e graves de apneia obstrutiva do sono (AOS) em pessoas com obesidade. É a primeira vez que a agência aprova uma opção farmacológica para essa condição crônica, que afeta cerca de 50 milhões de brasileiros, segundo estimativas da revista The Lancet Respiratory Medicine.
Antes dessa nova indicação, o Mounjaro já era utilizado no controle do diabetes tipo 2 e da obesidade. Agora, os estudos apontam que o medicamento também pode reduzir de forma expressiva as pausas respiratórias durante o sono, além de contribuir para a perda de peso — um fator-chave no combate à apneia.
O que é a apneia obstrutiva do sono?
A AOS ocorre quando há uma interrupção do fluxo de ar durante o sono, geralmente provocada pelo estreitamento da faringe. Isso faz com que a respiração pare por alguns segundos, reduzindo a oxigenação do corpo e comprometendo funções cerebrais e hormonais.
Segundo o médico Edilson Zancanella, da Academia Brasileira do Sono, o organismo reage a essas pausas como se estivesse em alerta máximo. “Cada vez que o corpo deixa de respirar, o cérebro dispara sinais para retomar o fluxo de ar. Isso fragmenta o sono e afeta a memória, a concentração e o equilíbrio hormonal”, explica.
Além de prejudicar o descanso, a apneia está ligada a problemas cardiovasculares, como hipertensão, infarto e AVC.
Quem é mais afetado?
De acordo com a pneumologista Erika Treptow, do Instituto do Sono, o distúrbio é mais comum em homens acima dos 40 anos, especialmente com sobrepeso ou obesidade. “O acúmulo de gordura no pescoço e na região abdominal compromete a respiração noturna. A obesidade também interfere na regulação da ventilação durante o sono”, explica.
Estudo que mudou o cenário
A decisão da Anvisa foi baseada nos resultados do estudo clínico de fase 3 SURMOUNT-OSA, que acompanhou 469 participantes de países como Brasil, EUA, China, Alemanha e México. O ensaio comparou os efeitos da tirzepatida em pacientes que usavam ou não o aparelho CPAP — tratamento tradicional que mantém as vias respiratórias abertas por pressão positiva.
Os resultados surpreenderam:
- Pacientes que usaram Mounjaro apresentaram redução de até 25 interrupções respiratórias por hora.
- Quando combinado ao CPAP, o número chegou a 29 interrupções a menos em média.
- Em um ano, quase metade dos participantes tratados com o medicamento apresentou remissão total ou parcial da apneia.
- Além disso, os voluntários perderam até 20% do peso corporal.
Um avanço na medicina do sono
Para Erika Treptow, a aprovação do Mounjaro marca “um divisor de águas” no tratamento da apneia. “Até hoje, os pacientes dependiam quase exclusivamente de terapias mecânicas. Ter uma opção medicamentosa comprovadamente eficaz abre uma nova perspectiva”, destacou a especialista.
O estudo foi publicado no The New England Journal of Medicine, um dos periódicos científicos mais respeitados do mundo, reforçando a robustez dos resultados.
Com a nova autorização da Anvisa, o Brasil se junta a outros países que já utilizam o Mounjaro como alternativa terapêutica moderna para uma doença que, até então, tinha opções de tratamento limitadas.