BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) condenou, por maioria, nesta terça-feira (21) todos os réus do núcleo da desinformação da trama golpista.

Apenas Carlos Cesar Rocha, do Instituto Voto Legal, foi condenado por dois dos cinco crimes apontados: tentativa de abolição do Estado de Direito e organização criminosa.

O grupo foi acusado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) de difundir informações falsas sobre as urnas eletrônicas e promover ataques contra os chefes das Forças Armadas contrários ao golpe de Estado.

A condenação foi formada com os votos do relator, Alexandre de Moraes, e dos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Flávio Dino (presidente do colegiado). Luiz Fux abriu divergência e defendeu a absolvição de todos os réus, por todos os crimes apontados contra eles.

Os réus do núcleo da trama golpista são Ailton Barros (major expulso do Exército), Ângelo Denicoli (major da reserva do Exército), Giancarlo Gomes Rodrigues (sargento do Exército), Guilherme Marques de Almeida (tenente-coronel do Exército), Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército), Marcelo Bormevet (policial federal) e Carlos Cesar Rocha (presidente do Instituto Voto Legal).

Os ministros defendem que seis réus sejam condenados pelos crimes de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, organização criminosa, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado.

VOTO DE MORAES

O voto de Moraes, o relator, durou quase três horas. O ministro justificou a leitura de um resumo pelo fato de que a materialidade dos crimes já estava comprovada com a condenação do núcleo central da trama golpista, sendo necessário somente analisar a autoria dos réus.

Segundo ele, os acusados do núcleo da desinformação atuaram em cinco dos 13 atos executórios da trama golpista —com foco na propagação de informações falsas sobre o processo eleitoral antes e depois das eleições.

“Várias condutas executórias comprovaram a atuação dessa organização criminosa. Isso é importante porque as condutas imputadas aos corréus entram exatamente em alguns desses 13 momentos executórios da organização criminosa”, disse.

Moraes afirmou que a tática para a divulgação em massa de informações falsas dos réus é comparada com o “novo populismo digital extremista”. O ministro disse que a propagação da desinformação e dos ataques às autoridades dava início e se encerrava “a comando específico da organização criminosa”.

O ministro argumenta que o uso das redes sociais para a desinformação da organização criminosa não pode se confundir com a liberdade de expressão.

“É uma falácia, uma mentira absurda criminosa e antidemocrática dizer que essa utilização de ataque à Justiça Eleitoral, de ataque ao Poder Judiciário, de ataque à democracia, de discurso de ódio, que isso é liberdade de expressão. Isso é crime tipificado no Código Penal, é um instrumento de agressão de propagação de discurso de ódio ao Estado Democrático de Direito”, completou.

Ao votar, Cármen Lúcia afirmou que o grupo criou um grupo de violência contra autoridades públicas e insuflou “turbas raivosas”.

“Essa organização criminosa, valendo-se de cargos públicos, dos gabinetes por eles ocupados, criaram um clima de desvario para se chegar, como se chegou, ao 8 de janeiro de 2022”, disse.

Segundo ela, o objetivo do grupo se mostrou um conjunto delituoso, coordenador e estratégico para insuflar o clima político para um um ciente de instalação de um governo ilegítimo.

“Tenho para mim, e ficou provado, que o núcleo promoveu um conjunto de práticas delituosas que levou a intimidação sutil e eficiente produzida por mídias sociais pelas quais, com as mensagens falsas, assolou-se a irritabilidade política”, afirmou.

Cármen também rebateu os argumentos levantados pelas defesas dos réus de que os réus não se conhecem e, por isso, a caracterização do crime de organização criminosa é falha.

“Não é preciso que se conheça. Em organizações especialmente maiores, hoje se tem que alguns não querem que sejam conhecidos. Quanto menos se souber, menos se pode falar em caso de uma delação. Não foi incomum nesse processo encontrarmos declarações de ‘não conheço fulano’, ‘não falou na palavra fraude’, mas todo o conjunto denotada a fraude nas urnas”, disse.

ACUSAÇÕES

O núcleo é formado por ex-integrantes do governo Bolsonaro de escalões inferiores, militares do Exército e acusados de disseminar desinformação sobre as eleições.

Segundo a denúncia, os ex-integrantes da Abin Giancarlo Rodrigues e Marcelo Bormevet integraram uma estrutura paralela da agência para a produção e disseminação de notícias falsas e ataques contra opositores políticos de Bolsonaro.

Gonet diz que o major e ex-assessor do Ministério da Saúde Ângelo Denicoli atuou com o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem nos “ataques sistemáticos de Jair Bolsonaro ao processo eleitoral”.

Já o tenente-coronel Guilherme Marques Almeida é acusado de difundir o material falso sobre fraude nas eleições presidenciais, e o coronel Reginaldo Vieira de Abreu teria tentado interferir no relatório das Forças Armadas sobre o sistema eletrônico de votação.

Carlos César Moretzsohn Rocha teria sido o responsável por produzir um “relatório técnico maliciosamente manipulado” pelo Instituto Voto Legal para o Partido Liberal.

Segundo Moraes, Rocha fraudou o documento técnico para viabilizar uma representação eleitoral do PL para pedir a anulação de votos e declarar a vitória de Bolsonaro na disputa eleitoral de 2022. “Uma das coisas mais bizarras que a Justiça Eleitoral já recebeu”, disse.

Moraes disse que a acusação demonstrou a participação de Rocha nos ataques à Justiça Eleitoral, configurando os crimes de abolição do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. O ministro, porém, votou pela absolvição do réu pelos crimes de golpe de Estado, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração do patrimônio tombado.

O major da reserva Ailton Barros, por fim, é acusado de promover ataques virtuais contra os chefes das Forças Armadas que foram contrários à tentativa de golpe. Os alvos teriam sido determinados pelo ex-ministro Braga Netto, como mostram mensagens obtidas pela investigação.

“São milicianos covardes que não atacam somente os inimigos, mas também os familiares dos inimigos”, disse Moraes.

As defesas dos réus alegam que eles sequer se conheciam. Nas sustentações orais na última semana, os advogados negaram qualquer conexão de seus representados com os atos de 8 de janeiro de 2023 e disseram não haver prova sobre esse vínculo.

Argumentaram ainda que a disseminação de desinformação ou os ataques a autoridades não ficaram comprovados e que eventual envio de link em conversas privadas não poderia ser enquadrado nos crimes da denúncia.