SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou nesta terça-feira (21) ver o Congresso Nacional trabalhando em função das eleições presidenciais de 2026, e não da justiça econômica.

“O Congresso tem todo direito de rejeitar o que é injusto, mas não é essa a conversa lá. O que se conversa lá é 2026 e que fulano de tal não vai ser candidato se a MP [medida provisória] passar. Imagina uma coisa que é boa para o país ficar ao sabor das intenções presidenciais de uma pessoa”, afirmou ele em entrevista à Globonews.

O ministro não disse quem seria o “fulano de tal”, se limitou a dizer que “lê o jornal” e que “tem as mesmas fontes no Congresso que a imprensa”.

O comentário segue a esteira da derrota do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no início do mês, quando o Congresso retirou da pauta a MP (medida provisória) dos Impostos. A medida visava sustentar a arrecadação federal e reduzir despesas obrigatórias no próximo ano.

Para a base governista no Legislativo, o desfecho foi atribuído a articulações do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tido como o nome favorito da oposição para enfrentar Lula na corrida presidencial.

À época, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator da MP, disse que o Congresso já estava “no modo disputa eleitoral”.

“O Tarcísio, em vez de governar São Paulo, fica telefonando para deputado para pressionar, para não aprovar. É evidente que tem uma campanha eleitoral em andamento e o objetivo é prejudicar o governo. Dane-se o país”, disse o petista.

Segundo Haddad, o governo tem uma série de mecanismos legais para reorganizar as contas.

Um deles será o envio de dois projetos para apreciação dos parlamentares ainda nesta terça, como antecipado pela Folha de S.Paulo. Outro seria a reedição de uma MP ao término do ano legislativo, aventada pelo ministro como uma hipótese diante dos embates com o Legislativo em torno da pauta econômica.

Diferentemente de um projeto de lei, que precisa passar pelo Congresso para entrar em vigor, uma MP começa a valer no instante em que é assinada pelo presidente. Para não perder o efeito, ela precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado em até 120 dias -passado o prazo, caduca. Foi o que aconteceu com a MP dos Impostos, posta para votação no último dia de vigência e depois retirada de pauta pelos parlamentares.

Haddad afirma que prevê a entrada em vigor de uma MP ao término do ano legislativo, por volta do dia 20 de dezembro. “Como tem o período de recesso e férias parlamentares, essa medida vai funcionar por quase meio ano em 2026. Mas a pergunta que eu deixo é: para que isso?”, disse ele.

“Nós viemos até aqui colhendo frutos de um trabalho conjunto. Para que tirar o país da rota que está dando certo, do ponto de vista de crescimento, inflação, desemprego, resultado primário? Estamos com bons indicadores à luz do passado recente. Por que vamos abrir mão disso? Para antecipar 2026?”

Os comentários de Haddad sobre o Congresso foram uma espécie de morde-e-assopra. Por um lado, apontou o possível movimento da oposição de se mover “ao sabor” da disputa eleitoral. Por outro, atribuiu corresponsabilidade aos parlamentares pelo melhor resultado fiscal do país em quatro anos desde 2015.

“O Congresso teve a sensibilidade de aprovar uma série de projetos que retiravam privilégios do ‘andar de cima’, e sabemos que não é fácil tirar privilégios no Brasil de maneira geral. Aqui, os privilégios são tidos como direitos adquiridos, e não é assim que vai funcionar.”

Por outro lado, cutucou os parlamentares ao citar leniência na análise de medidas fiscais para fortalecer o arcabouço -o conjunto de regras que visa equilibrar as contas do país.

“Comentam por aí que, com as regras condicionais, o arcabouço fiscal não é sustentável no médio-longo prazo. Tem vários argumentos a favor dessa tese. Vamos ter que revisitar temas que o Congresso rejeitou tratar, como supersalários, aposentadorias de militares, fundos constitucionais. Não é que o governo não mandou. O Congresso é que não apreciou ou rejeitou.”

Ainda na entrevista, Haddad deu mais detalhes sobre como o governo pretende compensar a perda de arrecadação vinda da derrubada da MP dos Impostos. A medida será fatiada em dois projetos de lei. O primeiro deve versar sobre medidas de contenção de despesas: Haddad citou mudanças como no seguro defeso (pago a pescadores artesanais no período em que a atividade é proibida), no Atestmed (sistema online para concessão de auxílio-doença sem perícia presencial) e a inclusão do Pé-de-Meia no piso da educação.

Outro projeto deve ficar com o aumento da taxação das apostas esportivas (bets) e a tributação de títulos hoje isentos, como aqueles do agronegócio e do setor imobiliário. Juntas, essas mudanças poderiam incrementar as receitas em R$ 4,3 bilhões em 2026, segundo os cálculos iniciais do Executivo.