SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A SDC (Seção Especializada em Dissídios Coletivos) do TST (Tribunal Superior do Trabalho) manteve a validade de uma cláusula de convenção coletiva que prevê indenização para empregados dispensados quando condomínios substituem portarias presenciais por virtuais, com sistemas de monitoramento remoto.

A norma voltou a ser discutida após sindicatos patronais do setor de segurança ingressarem na Justiça para tentar anulá-la. Segundo as entidades, a regra representaria um retrocesso diante do desenvolvimento tecnológico. A maioria dos ministros do TST, porém, entendeu que a cláusula compatibiliza o avanço tecnológico com a valorização social do trabalho.

A convenção coletiva que estabelece a norma foi firmada entre o Sindcond (Sindicato dos Condomínios de Prédios e Edifícios Comerciais, Industriais, Residenciais e Mistos Intermunicipal do Estado de São Paulo) e o Sindifícios (Sindicato dos Empregados em Edifícios de São Paulo, Zeladores, Porteiros, Cabineiros, Vigias, Faxineiros e Serviços).

O objetivo da cláusula é proteger o emprego e o mercado de trabalho diante dos impactos da automação sobre os trabalhadores. Ela determina que o empregador que optar pela substituição de portarias presenciais por atendimento virtual deve pagar uma indenização equivalente a dez pisos salariais da categoria para cada empregado dispensado nessas condições.

Na ação trabalhista, o Siese-SP (Sindicato das Empresas de Sistemas Eletrônicos de Segurança do Estado de São Paulo) e o Sintrasep (Sindicato dos Trabalhadores em Sistemas Eletrônicos de Segurança Privada do Estado de São Paulo), que não assinaram a convenção coletiva, pediram a anulação da cláusula.

Segundo as entidades patronais, a regra criaria barreiras à livre concorrência e dificultaria a adoção de portarias virtuais em condomínios, prejudicando empresas e trabalhadores do setor de segurança eletrônica. A ação anulatória foi julgada improcedente pelo TRT-2 (Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região), levando os sindicatos a recorrerem ao TST.

No tribunal, prevaleceu o voto da ministra Kátia Arruda, que considerou que a norma não impede a automação nem a terceirização, mas cria mecanismos de compensação social para amenizar o impacto das mudanças tecnológicas sobre os trabalhadores.

A ministra também destacou que a cláusula não visa regular a atividade das empresas de sistemas de segurança eletrônica nem restringir sua atuação no mercado. “Suas disposições estão centradas na relação entre empregador e empregado no contexto específico da substituição de postos de trabalho por sistemas automatizados”, afirmou.

Nathalia Sequeira Coelho, advogada trabalhista do Ferraz dos Passos Advocacia e Consultoria, afirma que a decisão do TST vale apenas para as categorias representadas pelos sindicatos que seguem as normas da cláusula da convenção coletiva. No entanto, ela pode servir como precedente para validar cláusulas semelhantes de outros sindicatos em diferentes estados.

Apesar da decisão, a advogada diz que o trabalhador demitido há mais tempo e que não recebeu a indenização não poderá mais reivindicá-la. “Apenas os empregados demitidos na vigência da convenção coletiva possuem direito ao recebimento da indenização. Importante salientar que a indenização apenas vale para dispensa de empregado substituído por serviço terceirizado e automatizado”, diz.

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QUE PROVAS O TRABALHADOR DEVE JUNTAR NESSE TIPO DE CASO?

Bruna Ferreira, advogada trabalhista e sócia da Nicoli Sociedade de Advogados, diz que é recomendável que o trabalhador guarde:

– Emails ou mensagens do empregador sobre a mudança;

– Comunicados internos ou atas de reuniões;

– Convenções ou acordos coletivos aplicáveis;

– Documentos da rescisão contratual.

Segundo a especialista, esses registros ajudam a comprovar que a dispensa ocorreu em razão da substituição tecnológica, ainda que não exista um documento formal afirmando isso.

COMO POSSO MONITORAR ESSAS MUDANÇAS PARA EVITAR SURPRESAS NEGATIVAS?

Ferreira diz que o ideal é que o trabalhador acompanhe as negociações coletivas de sua categoria, leia atentamente qualquer alteração ou aditivo contratual, guarde comunicações do empregador sobre mudanças e busque orientação jurídica antes de assinar qualquer documento que possa afetar seus direitos.

O TRABALHADOR PRECISA ENTRAR NA JUSTIÇA OU PODE RESOLVER COM O EMPREGADOR?

Segundo a especialista, se houver boa-fé e acordo entre as partes, o pagamento pode ser feito diretamente. “No entanto, se o empregador se recusar a pagar, o trabalhador deve recorrer à Justiça do Trabalho para garantir seus direitos. Ter a documentação da dispensa e da norma coletiva é essencial”, diz.

QUAIS SÃO OS DIREITOS GARANTIDOS AO TRABALHADOR DEMITIDO SEM JUSTA CAUSA?

O trabalhador dispensado sem justa causa tem direito a:

– Aviso-prévio (trabalhado ou indenizado);

– Saldo de salário;

– Férias proporcionais acrescidas de um terço;

– 13º salário proporcional;

– Saque do FGTS e multa de 40%;

– Seguro-desemprego, se preencher os requisitos;

– Indenizações previstas em convenções ou acordos coletivos, como a dos casos de portaria virtual.

ESSE TIPO DE PROTEÇÃO PODE VALER PARA OUTRAS PROFISSÕES?

Sim. Segundo Nathalia Coelho, após o julgamento do tema 1.046 de repercussão geral pelo STF (Supremo Tribunal Federal), houve uma valorização da negociação coletiva. Assim, as entidades sindicais podem se reunir e estabelecer cláusulas semelhantes à do caso em questão, desde que não violem normas constitucionais, normas de tratados e convenções internacionais incorporadas ao direito brasileiro e normas infraconstitucionais que asseguram garantias mínimas de cidadania aos trabalhadores.

O QUE OS CONDOMÍNIOS PRECISAM SABER ANTES DE TROCAR PORTEIROS POR PORTARIAS VIRTUAIS?

Segundo Coelho, primeiro, é importante que cada condomínio ou empresa verifique a convenção coletiva de trabalho para analisar se há cláusula de proteção ao trabalhador nesse sentido.

Além disso, ela afirma que deve ser analisada a legislação local. No Distrito Federal, por exemplo, a implementação de portaria virtual em condomínio habitacional com mais de 45 unidades possui restrições. Em São Paulo, há também um projeto de lei que pretende restringir a implantação de sistemas de portaria virtual em condomínios.

“Também devem ser avaliados os custos da implantação, a segurança do sistema e a adaptação dos moradores e colaboradores”, diz a especialista.