RIUO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Petrobras afirmou nesta segunda-feira (20) que obteve do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) licença para a perfuração do primeiro poço em águas profundas na bacia da Foz do Amazonas, a 175 km da costa do Amapá.

A estatal falou que a perfuração “está prevista para ser iniciada imediatamente” e deve durar cinco meses. Ou seja, estará em curso enquanto o planeta debate medidas para combater a mudança climática na COP30, em Belém —também a base das operações de perfuração.

A conferência do clima da ONU na capital do Pará será realizada de 10 a 21 de novembro.

“Por meio desta pesquisa exploratória, a companhia busca obter mais informações geológicas e avaliar se há petróleo e gás na área em escala econômica. Não há produção de petróleo nessa fase”, afirmou a Petrobras, em nota.

O Ibama, também em nota, disse que a licença foi emitida “após rigoroso processo de licenciamento ambiental”, que contou com três audiências públicas, 65 reuniões técnicas setoriais em mais de 20 municípios e um simulado da operação de perfuração.

O processo de licenciamento desse poço levou quase cinco anos, com diversos embates dentro do próprio governo. O bloco exploratório 59 da bacia Foz do Amazonas, onde o poço será perfurado, foi leiloado pelo governo em 2013.

O pedido de licença para pesquisar petróleo no local quase foi arquivado algumas vezes. Em abril de 2023, a área técnica do Ibama pediu arquivamento do processo, mas não foi respaldada pelo presidente Rodrigo Agostinho. Depois disso, diz o órgão ambiental, conversas com a Petrobras levaram a diversas melhorias no projeto.

Entre elas, continua, estão o centro de despetrolização de animais em Oiapoque (AP) e a mobilização de sete novas embarcações para resgate de fauna.

“As exigências adicionais para a estrutura de resposta foram fundamentais para a viabilização ambiental do empreendimento, considerando as características ambientais excepcionais da região da bacia da Foz do Amazonas”, disse o Ibama.

Ambientalistas reagiram com fortes críticas à decisão do Ibama. A avaliação é que a autorização pode manchar a reputação ambiental do Brasil, ao buscar a expansão da exploração petrolífera enquanto fala de transição energética.

“É uma sabotagem à agenda climática, uma vez que essa licença está sendo compreendida pela Petrobras como a pioneira de um conjunto de outras licenças na Foz e em toda a margem equatorial. E é uma sabotagem à liderança do Brasil na COP30”, disse Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.

Na avaliação de Araújo, que já foi presidente do Ibama, a decisão deve ser alvo de questionamentos na Justiça Federal. Organizações da sociedade civil preparam uma ação civil pública que alegará inconsistências no processo de licenciamento.

A coordenadora da frente de Oceanos do Greenpeace Brasil, Mariana Andrade, disse que, “às vésperas da COP30, o Brasil se veste de verde no palco internacional, mas se mancha de óleo na própria casa”.

Por outro lado, políticos alinhados à gestão Lula comemoraram a decisão do Ibama. O líder do governo no Congresso Nacional, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), chamou esta segunda-feira de um “dia histórico”.

Para ele, a medida vai viabilizar “as pesquisas para a descoberta de riquezas como do petróleo, que poderão e serão decisivas para nosso presente e para nosso futuro”.

Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia e outro grande defensor do empreendimento, também comemorou. “O Brasil não pode abrir mão de conhecer seu potencial. Fizemos uma defesa firme e técnica para garantir que a exploração seja feita com total responsabilidade ambiental, dentro dos mais altos padrões internacionais, e com benefícios concretos para brasileiras e brasileiros”, afirmou.

Desde que assumiu o ministério, em 2023, em diversas ocasiões ele criticou publicamente o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, pela demora em autorizar a perfuração.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que também é do Amapá, agradeceu ao governo Lula e às lideranças políticas estaduais por terem ajudado a viabilizar o empreendimento.

Nos últimos meses, além da pressão da Petrobras e de políticos da região Norte, o pedido da Petrobras passou a receber forte apoio público do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sob o argumento de que o país não pode abrir mão da receita do petróleo.

“A conclusão desse processo, com a efetiva emissão da licença, é uma conquista da sociedade brasileira e revela o compromisso das instituições nacionais com o diálogo e com a viabilização de projetos que possam representar o desenvolvimento do país”, disse a presidente da estatal, Magda Chambriard.

O poço batizado de Morpho é a primeira tentativa para confirmar se há no Brasil reservatórios de petróleo semelhantes aos descobertos pela americana ExxonMobil na Guiana —um dos países hoje com maior taxa de crescimento na produção.

Para o governo e a indústria do petróleo, a possibilidade de abertura de nova fronteira exploratória na região Norte é a principal aposta para manter o ritmo de produção nacional após o declínio das reservas do pré-sal, que deve começar a ocorrer no início da próxima década.