SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Começamos a semana com o tanque cheio. O assunto do dia é petróleo: nos EUA, na Venezuela e no Brasil.
Também aqui: o sonho das stablecoins e porque ele pode acabar e outros destaques do mercado nesta segunda-feira (20).
**NO MEIO DA DISPUTA**
O filme Quando um Estranho Chama (1979) popularizou a frase the call is coming from inside the house (a ligação está vindo de dentro da casa).
No filme, ela mostrava que o inimigo, de quem os protagonistas pensavam estar se escondendo, estava dentro do mesmo ambiente que eles. Fora dele, a fala é usada para apontar que o problema é interno, não externo.
Algo parecido acontece na Venezuela. As tensões entre Estados Unidos e o país vizinho do Brasil esquentaram desde que Donald Trump tomou posse da presidência americana e o embate pode trazer (mais) consequências econômicas para os venezuelanos.
O QUE ESTÁ ACONTECENDO?
Os EUA aumentaram consideravelmente a presença militar no Caribe, onde fica boa parte do litoral da Venezuela, desde o início do ano.
O objetivo é derrubar o regime autoritário de Nicolás Maduro, e Trump não parece medir esforços para tal na quarta-feira, deu carta branca para a CIA, agência de espionagem americana, agir como bem entender para viabilizar a queda do governo em Caracas.
CASA DE FERREIRO, ESPETO DE PAU
A Chevron, uma das maiores petroleiras dos EUA, é muito importante para a economia venezuelana o que pode ser interpretado como uma armadilha para os dois lados.
Se por um lado a companhia é um canal robusto de moeda forte (dólar) para uma economia frágil, por outro, ela dá poder para os americanos sobre uma fonte de renda importante para a Venezuela.
Uma mão as operações da Chevron constituem quase um quarto da produção de petróleo da Venezuela. Nos últimos dois anos, a empresa foi responsável por até 80% do crescimento da produção de petróleo do país, segundo Francisco J. Monaldi, um especialista da Universidade Rice.
A nação depende bastante da receita da atividade petroleira. Por isso, as operações da Chevron podem estar apoiando pelo menos parte dos gastos públicos em necessidades básicas, como comida e remédios.
As receitas do petróleo alimentam a Venezuela, afirma Monaldi.
💧 lava a outra. A Chevron esteve historicamente disposta a aceitar reveses periódicos e críticas à reputação para seguir explorando o imenso potencial dos campos de petróleo dos venezuelanos.
Mas se o governo Maduro cair, a posição da Chevron na Venezuela pode dar-lhe uma vantagem competitiva no que seria provavelmente um boom de investimento em petróleo.
Ou seja a empresa está na posição curiosa de agradar americanos, venezuelanos e ela própria ao mesmo tempo que incomoda todos na mesma proporção.
ESPETANDO O BONECO
Trump usou a Chevron como forma de pressionar Maduro. Em abril, o presidente americano forçou a interrupção das operações da petroleira na Venezuela. Em julho, ela foi autorizada novamente, mas com várias limitações.
Uma terceira opção assusta os americanos. Aliados de Trump temem que, caso a pressão sobre as atividades de petroleiras americanas na Venezuela se exacerbe, a China passe a lucrar mais com as reservas do nosso vizinho.
**FALANDO EM PETRÓLEO**
A commodity deve ser assunto na pauta brasileira nos próximos dias. O governo Lula e a diretoria da Petrobras entraram em um impasse sobre a definição do próximo plano de investimentos da petroleira, que incluirá o ano eleitoral de 2026.
Enquanto os executivos defendem que o programa seja revisto diante da queda do preço do petróleo, a gestão petista resiste a cortes nos números.
Pausa para explicar o que aconteceu no mercado.
O barril do Brent perdeu 18,44% do valor nos contratos futuros desde o início do ano.
A queda foi de 8,41% no último mês.
O movimento está relacionado com o aumento da oferta global e com questões geopolíticas. Apesar de sofrerem sanções, países como Venezuela e Irã viram um repique nas exportações. Ao mesmo tempo, a Opep+, cartel que reúne produtores importantes da commodity, pressionou seus membros a aumentar a oferta.
O acordo entre Israel e Hamas reduziu tensões no Oriente Médio e deu gás à queda no mercado internacional. Ainda, a escalada na briga entre China e EUA aumenta os temores de uma recessão global, o que diminui a demanda por energia e combustíveis.
POR QUE IMPORTA PARA O GOVERNO?
Por que importa para o governo? Se o barril de petróleo está mais barato do que no momento em que o plano de investimentos da Petrobras deste ano foi elaborado, pode ser que a companhia tenha uma receita menor do que a prevista.
Vale lembrar: o governo é o principal acionista da companhia, o que significa que ele recebe a maior parte dos dividendos e royalties gerados por ela.
O cenário pode deixar o Orçamento do ano eleitoral mais apertado do que a gestão Lula esperava tudo o que o Planalto não queria neste momento.
NA PONTA DA LÍNGUA
O tema deve se tornar a principal discussão na reta final do ano no conselho da Petrobras que reúne tanto indicados pelo governo como representantes dos minoritários.
Manter os investimentos mesmo com menores receitas pode gerar mais dívidas e menos pagamento de dividendos aos acionistas (entre eles, a própria União). Entretanto, diminuir investimentos também significa ter menos projetos da empresa para divulgar na corrida eleitoral.
O plano da Petrobras aprovado no fim do ano passado prevê US$ 111 bilhões de investimentos para o horizonte de 2025 a 2029.
O valor é 4,7% maior, em termos reais, do que o plano anterior (que ia de 2024 a 2028).
Lula disse neste mês estar “convencido de que a Petrobras ainda não deu tudo o que ela tem que dar ao povo brasileiro”.
A diretoria da empresa havia afirmado dois meses antes que o programa de investimentos seria revisto diante da queda do petróleo. A CEO, Magda Chambriard, afirmou a investidores que projetos quase prontos e maduros para execução haviam entrado em reavaliação.
**PARECE DÓLAR, MAS NÃO É**
Você sabe o que são stablecoins? Criptomoedas para quem tem medo de criptomoedas. Em geral, o valor é lastreado a uma moeda fiduciária, como o dólar ou o real, títulos ou outros ativos líquidos que existem no sistema financeiro tradicional.
Em resumo, elas representam uma tentativa de dar um pouco de chão firme ao terreno volátil do mercado cripto.
EFEITO BORBOLETA
A recente alta do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para operações de câmbio tem impulsionado as transações feitas por brasileiros com stablecoins sobretudo aquelas que têm o dólar como ativo de referência, como a Tether (USDT).
O IOF para transações entre moedas saiu de 1,1% para 3,5% para compras internacionais no cartão e de moeda em espécie e para remessas ao exterior. Criptoativos, como as stablecoins, não estão sujeitos à cobrança.
Por mais que seja uma compra indireta de dólar, a atual legislação não classifica transações com stablecoins como operações cambiais, por isso a isenção do IOF.
De acordo com a plataforma Biscoint, a média de negociação em reais da Tether subiu 78% de 2024 para 2025.
O total movimentado foi de R$ 53 bilhões em 2024 para R$ 74 bilhões este ano.
Houve aumento de 36% no volume transacionado de stablecoins atreladas ao dólar americano no Brasil entre junho e julho, segundo o Bitybank.
MAIS MUDANÇAS
O presidente dos EUA, Donald Trump, aprovou a regulação de stablecoins lastreadas em dólar americano, com a exigência de que as casas que as negociam mantenham reservas para garantir que uma moeda equivalha a um dólar.
Para alguns investidores, essa sinalização atribuiu mais credibilidade a esse tipo de ativo.
MUITA CLAMA NESSA HORA
Não é como se as stablecoins fossem totalmente isentas da incidência de impostos. A Receita Federal prevê que a posse dessas moedas deve ser declarada se ultrapassar os R$ 5.000 por ativo, assim como operações com criptomoedas que excedam R$ 30 mil.
Além disso, existe um movimento no Brasil para regulamentar e taxar esses investimentos em um futuro próximo.
PASSADO X PRESENTE
Para Ana Cláudia Utumi, sócia-fundadora da Utumi Advogados, as remessas para o exterior via stablecoins podem virar uma dor de cabeça por se assemelharem às operações conhecidas como blue chip swaps, uma forma de transferir recursos ao exterior por meio da compra e venda de ativos.
Nos anos 1990 e início de 2000, esse tipo de operação era feita por grandes empresas e bancos sem declaração ao BC para evitar o IOF.
“Não era ilícito, mas o BC mandou que eles parassem. Depois, o Carf julgou que era uma operação ilegal de câmbio”, lembra a advogada.
Segundo Ana Cláudia, há um mesmo limbo jurídico em torno de stablecoins. Para ela, quem envia remessas para o exterior dessa forma precisa se atentar ao precedente jurídico contrário à prática.
Caso o Fisco julgue as operações como irregulares, pode haver cobrança de 25% de IOF, além de multa de 100% por evasão fiscal.
**O QUE MAIS VOCÊ PRECISA SABER**
Sem cana. As vendas em bares e restaurantes recuaram 4,9% em setembro, mas os casos de intoxicação por metanol em bebidas adulteradas não são os únicos culpados.
Cresceu, mas decepcionou. A economia da China desacelerou e cresceu apenas 4,8% no terceiro trimestre do ano.
Por que a Gucci vale muito? A Kering, dona de grife, vendeu sua divisão de perfumes para a francesa LOreal por R$ 25 bilhões.
Paraíso fiscal? A ilha caribenha de Anguilla está ganhando milhões por causa da IA. O motivo inusitado você descobre aqui.
Liberou. O governo Lula deu sinal verde para que o Ministério dos Transportes retomar área de R$ 40 bilhões cedida ao Exército em Brasília.