SAN FRANCISCO, EUA (FOLHAPRESS) – Marc Benioff, CEO da Salesforce e dono da revista Time, protagonizou uma virada política na última semana que roubou a atenção do principal evento da empresa de software corporativo em meio à aproximação entre o Vale do Silício e o governo Trump.

Conhecido por projetos de filantropia em San Francisco e pela defesa de causas progressistas, o bilionário disse ao New York Times a poucos dias do início do chamado Dreamforce que apoia o presidente Donald Trump e defende o envio de tropas da Guarda Nacional para a cidade.

Após uma semana de repercussão e críticas que levaram à renúncia de um membro do conselho do braço filantrópico da Salesforce, Benioff se retratou em publicação no X (ex-Twitter) nesta sexta-feira (17), dia seguinte ao encerramento do congresso.

O CEO da Salesforce, Marc Benioff, durante abertura do Dreamforce 2025 Maurice Ramirez Divulgação Salesforce Homem de terno preto fala em palco diante de público atento em auditório grande com iluminação azul ao fundo. **** Visto como politicamente moderado e bem relacionado nos círculos do setor de tecnologia, o bilionário já doou para campanhas do Partido Democrata e defendeu um aumento de impostos em San Francisco para financiar iniciativas de combate à população em situação de rua.

Na entrevista ao New York Times, Benioff afirmou que apoia totalmente o governo Trump e que não há policiais suficientes na cidade, sede da Salesforce e de startups como OpenAI e Anthropic. San Francisco tem apresentado queda nas taxas de criminalidade nos últimos anos, mas ainda sofre com delitos menores e consumo de drogas a céu aberto.

O alinhamento com Trump não foi de todo inesperado. Benioff participou de um jantar de Estado no Castelo de Windsor, no Reino Unido, durante o qual ficou sentado em frente ao presidente, a quem disse ser “incrivelmente grato por tudo o que está fazendo”, segundo o próprio executivo.

Em entrevista a jornalistas na terça-feira (14), durante o primeiro dia do Dreamforce, o CEO desconversou quando foi perguntado sobre o impacto das mudanças do visto H-1B, voltado para estrangeiros qualificados, e disse que o pedido de envio das tropas estava relacionado à segurança do evento.

“Este é a maior convenção de San Francisco, mais de duas vezes maior do que as outras. E provamos ano após ano como torná-la segura. Essa é primeira coisa que me vem à cabeça”, disse Benioff.

Após os comentários, Ron Conway, capitalista de risco e amigo de longa data de Benioff, renunciou na quinta-feira (16) ao conselho da fundação filantrópica da Salesforce.

“Me entristece imensamente dizer que, com seus comentários recentes e a falha em compreender o impacto deles, agora mal reconheço a pessoa que por tanto tempo admirei”, escreveu Conway, doador do Partido Democrata, a Benioff.

O prefeito de San Francisco, Daniel Lurie, e a deputada democrata Nancy Pelosi também se juntaram às críticas. A bilionária Laurene Powell Jobs, viúva de Steve Jobs, afirmou em artigo no Wall Street Journal que doações em troca de controle sobre políticas públicas são “tudo menos generosidade”.

A movimentação também reflete a guinada como um todo do Vale do Silício em direção ao governo do republicano –em busca, por exemplo, de contratos públicos, isenções tarifárias ou retomada do relacionamento.

Em setembro, executivos como Mark Zuckerberg (Meta), Tim Cook (Apple), Sam Altman (OpenAI), Sundar Pichai e Sergey Brin (Alphabet, Google), Satya Nadella e Bill Gates (Microsoft), além de Lisa Su (AMD) e Safra Catz (Oracle) participaram de um jantar com Trump na Casa Branca que ficou marcado pelos elogios e promessas de investimento em IA.

A polêmica das declarações se somou à revelação de que a Salesforce ofereceu seus serviços de inteligência artificial ao ICE, o órgão de imigração que tem deportado pessoas dos EUA, para ajudar a recrutar e contratar 10 mil novos agentes, segundo reportagem do New York Times. Na quarta-feira (15), ativistas distribuíram panfletos na região estampados com rostos de imigrantes detidos pelo governo.

A entrevista ao New York Times ocorreu a poucos dias do congresso anual da empresa em San Francisco, que neste ano reuniu cerca de 50 mil participantes de 150 países. Pressionada por uma queda de 27% nas ações desde janeiro e pela ascensão de ferramentas de inteligência artificial, a empresa aposta na integração de seus sistemas de gerenciamento com agentes de IA, capazes de realizar tarefas sozinhos.

Como parte dos anúncios, Benioff também aproveitou para reforçar sua imagem de filantropo. Ele e sua esposa, Lynne Benioff, anunciaram uma nova doação pessoal de US$ 100 milhões para o UCSF Benioff Children’s Hospitals, além de um compromisso de US$ 39 milhões da Salesforce para escolas públicas e causas infantis. As doações para a região somam mais de US$ 1 bilhão ao longo de 26 anos.

Benioff também anunciou um investimento de US$ 15 bilhões em San Francisco ao longo de cinco anos, focado em um hub de incubação de empresas de IA. Segundo a empresa, o evento deve ter gerado mais de US$ 130 milhões em receita e 35 mil empregos locais.

“Meu comentário anterior foi motivado por uma grande cautela em relação ao evento, e peço sinceras desculpas pela preocupação que causou. Acredito firmemente que nossa cidade progride mais quando todos trabalhamos juntos em um espírito de parceria”, escreveu Benioff no X.

O Dreamforce também serviu de palco para o carisma do executivo e seu trânsito entre líderes do setor. Em painéis disputados, o executivo entrevistou David Sacks, conhecido como o “czar da IA” da Casa Branca, Sundar Pichai (Google), Dario Amodei (Anthropic), Brett Adcock (Figure AI) e Abdullah Alswaha, ministro das Comunicações da Arábia Saudita.