(FOLHAPRESS) – “O Lendário Martin Scorsese”, minissérie em cinco capítulos de Rebecca Miller, um filme-retrato, como define a realizadora, é exatamente o que se esperava dele. Uma obra a que assistimos com facilidade e prazer, mas sem um envolvimento intelectual maior e raras empolgações que venham por opções atuais, não por trechos dos filmes antigos.

Parte de uma entrevista atual com Scorsese, um dos grandes cineastas do cinema americano moderno. Segue uma cronologia linear dos eventos, intercalando detalhes sobre sua vida e imagens que fornecem uma espécie de making of.

O acesso aparentemente irrestrito às imagens de arquivo dá um ar oficioso à minissérie. Vemos muito de Scorsese, de seus filmes, seus atores e atrizes e dos amigos que o acompanham há muito tempo.

Acompanhamos os principais momentos de sua vida e carreira. A dureza do entorno em que cresceu, a relação com os pais e o irmão, o fracasso de “New York, New York”, a temporada de drogas com Robbie Robertson, “a morte e a ressurreição”, a competitividade com Brian De Palma, que se impressionou com mais uma obra-prima de Scorsese, “Touro Indomável”, depois de “Taxi Driver”.

Ainda vemos a maré baixa da primeira metade dos anos 1980, a chegada de um novo agente que mudou sua carreira, uma nova crise no final dos anos 1990, os diferentes casamentos -Laraine Brennan, Julia Cameron, Isabella Rossellini, Barbara De Fina, Helen Morris- e as filhas com três das esposas, entre muitos outros eventos.

Tirando uma ou outra jogada com o tempo, como nas derrotas do Oscar, o filme segue bem de perto, e de modo didático, uma linha do tempo que permite entendermos bem o percurso do diretor.

Nesse aspecto, “O Lendário Martin Scorsese” tem coisas, digamos, estranhas. No final do primeiro episódio, ficamos sabendo que alguém tramou de apresentá-lo a Robert De Niro, dando a entender que Scorsese não sabia de quem se tratava. Como, se De Niro já tinha feito três longas com o grande amigo Brian De Palma, dois deles em papéis de destaque?

O próprio ator só se lembra de dois, mas essa é uma falha compreensível, de memória, como outras espalhadas pelo retrato. No primeiro desses filmes, “Festa de Casamento”, mal reconhecemos o De Niro de “Taxi Driver”. Parecia outra pessoa, bem diferente da que aparece nos filmes de Scorsese.

Já Rebecca Miller poderia pensar em alguma maneira de informar melhor o público. Num tipo de documentário como esse, um certo didatismo não é essencial, mas é enriquecedor. Ainda mais porque o espectador vai notar a semelhança com “Viagem Pessoal pelo Cinema Americano”, o documentário clássico de Scorsese, e este tem no didatismo o seu ponto forte.

Há momentos curiosos, como Jean-Luc Godard elogiando bastante “Alice Não Mora Mais Aqui”, o filme menos godardiano que Scorsese havia realizado até então. Ou os depoimentos de Spike Lee e Steven Spielberg, ambos abismados com o talento do amigo.

É curioso também como é montada a sequência, do quinto episódio, dos Oscar de melhor direção perdidos para diretores como Barry Levinson, de “Rain Man”, Kevin Costner, de “Dança com Lobos”, e Clint Eastwood, de “Menina de Ouro”.

Este último venceu enquanto Scorsese concorria por “O Aviador”. Pois é justamente nesse momento que ouvimos personagens dizendo que as características dos filmes de Scorsese inibiam os votantes por seu caráter artístico, ambíguo, que não entrega as coisas que o espectador quer ver.

Bom, desta vez Scorsese concorria por um filme menor do que das outras vezes. “A Última Tentação de Cristo” e “Os Bons Companheiros” mereciam muito mais um Oscar de melhor direção do que “O Aviador”. Além disso, “Menina de Ouro” é sublime, merecendo ainda mais as palavras que reservaram ao filme de Scorsese. Talvez tenha sido a última vitória justa da história do Oscar.

Depois de muito trânsito, ida e volta, entre vida particular e trabalho, a minissérie reserva, nos últimos 20 minutos do quinto episódio, momentos muito tristes com a atual esposa do autor. Tem coerência com tudo que foi mostrado e é mais um traço do retrato feito com carinho por Rebecca Miller.

O LENDÁRIO MARTIN SCORSESE

Avaliação Bom

Quando Estreia nesta sexta

Onde Apple TV+

Produção EUA, 2025

Direção Rebecca Miller