RIO DE JANEIRO, RJ, E SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – Um histórico recente de reconstrução que culminou em receitas bilionárias e o predomínio nas principais competições nacionais e continentais. Flamengo e Palmeiras —adversários de domingo em duelo decisivo do Campeonato Brasileiro —podem até ter construído trajetórias parecidas em alguns pontos, mas que foram moldadas por estratégias políticas diferentes e com as peculiaridades de cada clube.

NO FLA, CHAPA REVOLUCIONÁRIA SE DILUIU

A figura que nesta quinta-feira (16) quiser controlar politicamente o Flamengo —ou pelo menos ser o testa de ferro de um grupo específico— não pode virar as costas para o discurso e o modo de agir que catapultou o clube a partir da eleição de 2012.

O Flamengo se organizou financeiramente, passou a contar com executivos de mercado em áreas chave do clube e canalizou a força da torcida para virar um fenômeno de arrecadação.

Isso tudo só foi possível pelo alinhamento político de velhas e novas forças, deixando para atrás uma era de situações precárias, um tanto quanto bizarras e folclóricas, como a frase do ex-presidente Márcio Braga, em 2009: “Acabou o dinheiro”.

“O clube tem pilares importantes, como o financeiro e o futebol. No Flamengo temos nesta quinta-feira (16) a clara percepção de que o clube não pode mais retroceder. Da mesma forma que não queremos que nosso clube se transforme em SAF e perca a sua identidade, temos certeza que o modelo híbrido precisa ser cada vez mais profissional. A importância maior dos sócios e conselheiros é fiscalizar o trabalho dos profissionais e estar atento, mas sem invadir o espaço”, disse Rodrigo Dunshee de Abranches, vice de Landim e um dos que perderam a eleição para Bap.

Mas isso não quer dizer que o ambiente político tenha ficado menos acirrado. O ponto é que quem tem obtido sucesso é ou já foi da chamada “chapa azul” original, de 2012. E dentro desse universo azulado, embora haja uma mudança de cor, houve até alternância.

Eduardo Bandeira de Mello fez dois mandatos, mas não o sucessor. Veio Rodolfo Landim, com dois mandatos, mas também não emplacou o sucessor. Agora, é a vez de Luiz Eduardo Baptista, o Bap, antes aliado dos dois antecessores e que virou oposição.

É como se o Flamengo trocasse de camisa, mas mantendo a mesma marca.

E os grupos políticos adjacentes vão se acomodando de acordo com os interesses de cada um e as dores da torcida e dos conselheiros no momento.

Se a gestão Bandeira organizou a casa, mas não ganhava títulos expressivos, veio Landim com o discurso de que o clube precisava ser campeão.

Se Landim adotou o estádio como plataforma de campanha e negociou o atual contrato com Libra e Globo, veio Bap para recalcular a rota e apertar a posição do Flamengo na discussão comercial.

“A diferença é que antes o Flamengo era gerido por paixão e como clube. nesta quinta-feira (16), o Flamengo é clube gerido como empresa. O ambiente político serve de controle para o dia a dia do clube. É o crivo, é o olhar do dono, que são os sócios e a torcida do Flamengo, em cima da gestão do Flamengo”, explicou Maurício Gomes de Mattos, vice de Bandeira e um dos candidatos derrotados por Bap.

FIGURÕES DA POLÍTICA, ZICO E OUTROS ÍDOLOS DE 81 INFLUENCIAM

O Flamengo ainda reúne em suas eleições a presença ativa de ex-presidentes de um passado anterior à reestruturação de 2013 em diante. Kléber Leite, Patrícia Amorim, Márcio Braga, Hélio Ferraz, Luís Augusto Veloso e até George Helal, figurões que para a torcida em geral não possuem mais relevância, mas que no universo de sócios ainda angariam votos.

A disputa pelo apoio de Zico também um fator à parte. Na última, declarou preferência a Bap, que acabou se tornando vencedor. Outros ídolos da geração 81 também costumam ser paparicados por candidatos e suas chapas.

Todo esse contexto se une na sede da Gávea, com uma verdadeira boca de urna que ocorre até mesmo pelos votos dos grupos dos esportes olímpicos, bastante presentes no clube.

NO PALMEIRAS, LEILA REINA SOBERANA

Já o Palmeiras, nesta quinta-feira (16) em dia, é amplamente controlado por Leila Pereira e seus aliados. É inviável pensar em alguém que seja eleito sem o apoio dela no atual panorama. A grande questão é que nesta quinta-feira (16) não há uma unanimidade para quem vai ser o nome indicado por ela para a sucessão em 2028.

Com mandato válido até 2027, ela trabalha com duas possibilidades no momento: Paulo Buosi e Everaldo Coelho, ambos vices na sua chapa. Não há, no entanto, uma confiança que eles sejam capazes de atuar na função. Não à toa, a atual presidente estudou até uma mudança no estatuto para permitir um terceiro mandato, o que está descartado no momento.

Um racha na situação seria a única maneira viável de ver a oposição entrando no jogo.

A paz momentânea, no entanto, é algo raro no histórico da política palmeirense. Ela começou em 2012, quando Paulo Nobre conseguiu ser eleito em uma segunda tentativa e teve uma leve turbulência na saída do empresário para a entrada de Maurício Galiotte. Nobre gostaria que seu sucessor rompesse com Leila Pereira, na época patrocinadora do clube, o que não aconteceu. Nobre e Galiotte nunca mais se falaram.

Galiotte conduziu sem oposição ativa até a entrada de Leila. Na sua primeira gestão, ele foi eleito sem concorrência. Na segunda, teve Genaro Marino, representante de Nobre, como opositor, mas venceu com folga. Na sua saída, ele viu o cenário se repetir: Leila foi eleita por aclamação na primeira vez e venceu a oposição sem dificuldade para ser reeleita.

A paz do momento existe porque cardeais antigos perderam força com a eleição entre associados. Os conchavos, que antes eram feitos por conselheiros, nesta quinta-feira (16) não têm mais o mesmo efeito depois das campanhas de eleições diretas feitas no começo dos anos 2010.

“Houve uma modernização no comportamento dos membros do Conselho, no apaziguamento, o que é muito importante para a estabilidade do clube. As diretas podem ter uma relação, mas talvez não tão imediata. Eu vivo o Palmeiras desde menino, o futebol é uma construção. O clube evoluiu, teve Maurício e Leila, que são muito capazes de conversar com conselheiros, então acho que esse é um episódio de racionalidade e isso é muito bom para o clube. A construção da nossa história mostra que nos transformamos em um clube”, disse o ex-presidente Luiz Gonzaga Belluzzo.

Hoje quem vota é o sócio da sede social, ou seja, os que frequentam piscina, bocha e outros setores do clube. É por isso que Leila dedica tantos projetos pagos do próprio bolso para o clube: reforma da piscina, shows de estrelas como Ivete Sangalo e distribuição de brindes para crianças em datas especiais estão entre as medidas.

Mustafá Contursi, histórico presidente e normalmente líder do maior grupo de votantes, hoje é apenas mais um no Conselho. Ele foi figura vital para que Leila Pereira conseguisse uma manobra que mudou seu tempo de associada para poder virar conselheira, mas depois foi escanteado pela própria Leila.

Vários ex-presidentes ainda estão vivos: Mustafá Contursi, Affonso Della Mônica, Luiz Gonzaga Belluzzo, Paulo Nobre, Arnaldo Tironi e Maurício Galiotte são os exemplos. Nenhum deles, no entanto, tem o mesmo prestígio que hoje tem Leila Pereira.