SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Vivemos uma bolha? Explico como uma palavra tão curta pode causar terror no mercado financeiro.

Também aqui: a cerveja da Ambev e outros destaques do mercado nesta quinta-feira (16).

**PALAVRA DO MÊS: “BOLHA”**

A reação imediata de um investidor ao ouvir a palavra bolha é sempre negativa. Pode haver tensão em um momento aparentemente positivo para o mercado de capitais?

Antes… uma definição. Na economia, chamamos de bolha uma situação em que há euforia ou especulação excessiva em torno de determinados ativos, o que faz com que seus preços subam muito acima do valor real.

Quando os investidores os vendem, há uma saída em massa e os preços desabam rapidamente — movimento conhecido como crash.

Nem todo crash é originado por uma bolha, mas toda bolha acaba no estouro.

CORRIDA PELO OURO

A procura por ações está muito alta, o que fez os alarmes soarem em Wall Street. Vamos dividir os movimentos em duas alas principais:

[1] Os bancões

Goldman Sachs, JPMorgan Chase e Citigroup registraram lucros robustos em suas divisões de Wall Street. Os três divulgaram resultados trimestrais na terça-feira (14), superando com folga as estimativas de analistas.

As receitas de investimento e de trading cresceram ao menos 12% nos três bancos.

Quando Donald Trump foi eleito presidente dos EUA, havia uma expectativa de que o mercado de capitais prosperasse no mandato do republicano, que prometeu a queda dos juros e estímulos.

A onda, no entanto, demorou a aparecer nos primeiros meses do ano, enquanto as empresas tentavam avaliar o impacto da guerra comercial instaurada pela Casa Branca.

Agora, os bancos esperam que os ganhos com ações continuem até o fim deste ano e ao longo de 2026 —é possível que os investidores estejam forçando a expectativa a se transformar em realidade.

“Muitos de nossos clientes conseguiram se adaptar ao cenário atual”, disse David Solomon, presidente-executivo do Goldman.

“A economia global se mostrou mais resiliente do que o esperado”, disse Jane Fraser, presidente do Citi.

O mesmo não pode ser dito sobre empreendedores americanos de pequeno porte, muito afetados pelo tarifaço. Também há sinais de estresse no mercado de crédito americano.

Executivos das três instituições alertaram para o excesso de otimismo dos investidores que, segundo eles, pode estar empurrando o bom momento dos mercados para um território de bolha.

“Espero que a disciplina prevaleça”, disse Fraser.

[2] As big techs

No Vale do Silício, região dos EUA onde estão concentradas as principais empresas de tecnologia, o debate sobre uma possível supervalorização das empresas de inteligência artificial esquenta.

Alguns questionam se a disparada no valor de mercado dessas empresas pode ser, ao menos em parte, resultado de uma crença de que as atividades que elas executam estão valendo mais do que deveriam.

Empresas ligadas à IA responderam por 80% dos ganhos da Bolsa americana neste ano. O valor do conjunto de papéis negociados na Nasdaq subiu 18%.

A Gartner, empresa americana de pesquisa, estima que os gastos globais com IA devam chegar a US$ 1,5 trilhão (cerca de R$ 8,4 trilhões) antes do fim de 2025 —a título de comparação, o PIB no Brasil em 2024 foi de R$ 11,7 trilhões.

As somas exorbitantes em jogo aumentam a tensão. Uma derrocada nos preços desses ativos pode arrastar todo o mercado.

A boa e a má notícia. Qual você quer ler primeiro?

– A boa é que uma forte valorização de ações não necessariamente representa uma bolha.

– A má é que só dá para determinar o que é bolha e o que não é depois que ela estourou, segundo a professora Anat Admati, da Stanford School of Business.

**CERVEJA QUENTE**

Se os destilados sumiram dos balcões dos bares com a crise de intoxicação por metanol em bebidas adulteradas, a expectativa da maioria era que o consumo de cerveja aumentasse —o que faria bem para as ações de empresas como a Ambev, né? Parece que não.

SEM COOLER

As ações da gigante caíram na última quinzena e ela perdeu cerca de R$ 11,6 bilhões em valor de mercado desde o dia 29 de setembro, primeiro pregão depois do início dos casos de contaminação, até a última quinta-feira (9).

O desempenho fraco precede a crise: os papéis da dona da Skol e da Brahma caíram 12% nos últimos seis meses e mal se mexeram no acumulado do ano, com alta de 2%.

O QUE ROLOU?

São três os principais motivos para o desânimo com a companhia.

[1] Friaca

Em temperaturas mais baixas, o apetite por cerveja cai.

Nos primeiros meses do ano, em um verão quente, as vendas da Ambev subiram 0,7%;

No inverno mais frio que o comum, o consumo caiu 9%.

A melhora nos números só deve vir no segundo trimestre de 2026, quando acontecerá a Copa do Mundo.

[2] “Lifestyle”

Você deve ter percebido o “boom” do estilo de vida saudável por aí. Calha que o álcool prejudica o organismo e a cerveja é uma bomba de calorias. Isso resulta em uma geração que bebe menos do que as outras.

Em média, cada brasileiro consome 74 litros de cerveja anualmente, conforme o relatório da XP.

2024 foi o primeiro em sete anos a registrar um consumo abaixo da régua (cerca de 73 litros), e 2025 deve terminar em 69 litros per capita.

A percepção de Rodrigo Alvarenga, sócio da One Investimentos, é de que a mudança não é sazonal, mas estrutural.

Sobram poucas alternativas de estratégias que aumentem as vendas da Ambev. Ela detém 60% do mercado cervejeiro do país, o que dificulta o aumento dos números via aquisição de novos rótulos.

“Ganhar de forma orgânica também é difícil: é preciso que a indústria cresça como um todo, e estamos vendo o movimento oposto”, analisa Alvarenga.

[3] Heineken

A principal concorrente da companhia inaugurou, no último mês de agosto, a expansão de sua cervejaria em Igarassu, Pernambuco, triplicando a capacidade produtiva da unidade.

Isso mostra uma abordagem voltada à quantidade, o que provavelmente vai criar ventos contrários tanto para o volume quanto para a capacidade de precificação da Ambev, segundo a XP.

**FAZENDO AS MALAS**

No Brasil, não há investidor para a Gol. Ou melhor, para o Grupo Abra, que reúne a companhia aérea brasileira e a colombiana Avianca.

Na edição desta quarta-feira (15) da newsletter, tratamos da ausência de novas ofertas de ações na Bolsa brasileira e do movimento de companhias nacionais que têm preferido abrir capital nos Estados Unidos. Hoje, detalharemos a trajetória de uma companhia que exemplifica o cenário.

🇧🇷 Tchau, Brasil!

A Gol anunciou na segunda-feira (13) que vai propor aos acionistas uma reorganização societária que pode culminar com o fechamento do capital na praça brasileira. A ideia é que a empresa operacional Gol Linhas Aéreas Inteligentes e a Gol Investment Brasil sejam incorporadas pela empresa fechada Gol Linhas Aéreas SA.

A Abra planeja pagar R$ 5,82 para cada título da nova empresa fechada que vai incorporar a companhia aérea. É o preço atual da emissão de um papel da empresa.

A decisão é consequência de um aumento de capital feito pela holding Abra em maio. Depois disso, apenas 0,78% das ações da empresa ficaram em circulação no mercado, custando menos de R$ 1 —o que infringe duas regras da Bolsa brasileira.

Com a B3 no pé da Abra para resolver a situação, a solução mais simples encontrada foi a incorporação.

Vale lembrar: o comunicado vem na sequência de uma tentativa frustrada de fusão com a Azul, enterrada oficialmente no último dia 25 após meses de negociação travada.

“Hello, USA”! O Abra anunciou ontem que pretende fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) nos Estados Unidos.

A empresa afirmou que pretende enviar à SEC (Comissão de Valores Mobiliários dos EUA) um pedido confidencial prévio para um possível IPO.

A mudança de endereço busca uma injeção de moeda forte na companhia (quem não quer US dollars?) e uma maior exposição mundial—as bolsas americanas abrigam 50% do valor de mercado global, contra menos de 1% da B3.

**O QUE MAIS VOCÊ PRECISA SABER**

Apagaram as luzes… no INSS, dessa vez. O órgão sofre um “apagão” orçamentário e suspendeu um programa que tinha o objetivo de reduzir a fila da aposentadoria.

“Made in Argentina”, não mais. Fábricas de produtos argentinos estão fechando, o que cria um novo desafio para o governo de Javier Milei —já em maus lençóis.

Forçando o foco. A oposição ao governo Lula está preparando um destaque na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) para obrigar o governo a mirar centro da meta fiscal. Ao mesmo tempo, economistas reduzem projeções para déficit primário e dívida bruta em 2025 e 2026.

Kardian, Logan, Tiggo… a Uber deixará de aceitar alguns modelos de carros para as categorias Comfort e Black a partir de 2026.

Baratinho. Um consórcio de fundos e big techs —que inclui BlackRock, Nvidia, Microsoft, xAI e fundos do Oriente Médio— comprou uma operadora de data center pela bagatela de US$ 40 bilhões (R$ 218 bilhões).