SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Ambipar transformou sua discussão financeira também em uma investigação criminal. A empresa apresentou queixa e conseguiu a instauração de inquérito policial contra três ex-executivos para apurar suspeitas de crimes de falsidade ideológica, fraudes, abusos na administração e estelionato.
O inquérito corre na Polícia Civil em São Paulo, e a reportagem teve acesso aos documentos. A companhia pediu investigação sobre a conduta do ex-CFO João Daniel Piran de Arruda, do ex-diretor executivo financeiro Carlos Daniel Braga Coradi e do ex-diretor de relações com investidores Pedro Borges Petersen. Segundo a companhia, sem consulta ao conselho de administração, eles viabilizaram alterações contratuais que deflagraram perdas à empresa.
Procurada, a assessoria de imprensa da Ambipar disse que a empresa não comentaria. A defesa do ex-CFO afirmou em nota que “fica claro estarmos diante de uma provável situação típica de denunciação caluniosa”. “Narrativas falaciosas não resistirão às evidências”, completou. A reportagem não conseguiu localizar os outros dois executivos.
No centro da investigação criminal estão os mesmos procedimentos que levaram a companhia a uma discussão judicial que corre na 3ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Três dias antes de a Ambipar recorrer à Justiça, Arruda deixou a companhia. No dia 6 de outubro, ele e seus advogados tiveram audiência na SRE da CVM (Superintendência de Registro de Valores Mobiliários da Comissão de Valores Mobiliários).
O inquérito relata que, em janeiro do ano passado, a Ambipar Lux, uma subsidiária em Luxemburgo, fez a sua primeira emissão de green bonds (títulos verdes), no valor de US$ 750 milhões (R$ 4 bilhões), com vencimento em 2031. Nos autos, a companhia conta que, para se proteger da variação da moeda estrangeira, firmou, com o Bank of America, o instrumento do swap cambial.
No mundo das finanças, o swap viabiliza a troca de fluxos de pagamento para evitar perdas e pertence à família dos derivativos, tipos de contratos financeiros que têm esse nome porque derivam de algum ativo, como moedas, índices ou ações.
Segundo a Ambipar, o trio, sob a liderança de Arruda, transferiu os contratos do Bank of America para o Deutsche Bank, num procedimento que comprometeu a política conservadora de proteção cambial.
Ao fazer a mudança, teriam autorizado aditivos que permitiram ao Deutsche atrelar a operação dos swaps à precificação dos green bonds. Em caso de queda, seria exigido um depósito de valor colateral imediato. No entendimento da Ambipar, isso fez com que um instrumento de proteção virasse um mecanismo especulativo.
A companhia afirma que, após a mudança, o valor do bonds começou a cair, e o Deutsche passou a exigir o aporte de garantias em valores muito elevados. Foram mais de R$ 200 milhões em um curtíssimo espaço de tempo.
Diz ainda que aditivos também ampliaram o risco de vencimento antecipado de débitos, prevendo inclusive vencimento cruzado. Como praticamente todos os contratos financeiros do grupo Ambipar contêm cláusulas de vencimento cruzado, havia a ameaça de um efeito dominó que levaria a um rombo de R$ 10 bilhões em dívidas financeiras.
Com o mesmo argumento, a companhia conseguiu uma liminar na Justiça do Rio que impede a cobrança antecipada de dívidas, numa discussão com bancos que inclui, além do Deutsche, grandes instituições como Santander, Itaú e Bradesco.
Os bancos tentam derrubar a liminar na Justiça do Rio, argumentando que não há fundamento nos argumentos da Ambipar e que a discussão corre na jurisdição errada. São Paulo, onde está a sede da companhia, seria o local adequado.