SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um estudo inédito do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), com apoio da Hay (Hutukara Associação Yanomami), revela que 3 em cada 4 yanomamis são crianças, adolescentes ou jovens, o que corresponde a 75% da população, formada por cerca de 31 mil pessoas.
Os yanomamis vivem em 376 comunidades nos estados de Roraima e Amazonas, na terra demarcada em 1992, sendo o maior território indígena do país, com 9,6 milhões de hectares.
O levantamento, elaborado com base em documentos, coleta de dados, estudos antropológicos, depoimentos de lideranças e experiências de vida, sistematiza a forma como os yanomamis compreendem a infância, os desafios colocados para crianças e jovens nas áreas de saúde, educação, proteção, nutrição e como as políticas públicas podem garantir o desenvolvimento dessa e das próximas gerações.
O estudo aborda ainda como crianças e jovens se relacionam com o mundo não indígena, além de mostrar o histórico do atendimento de saúde e educação para essas populações.
Para o povo yanomami, ser criança é crescer em liberdade: meninos e meninas participam desde cedo das atividades cotidianas da aldeia, acompanham suas mães na colheita e seus pais na caça, brincam na floresta, observam os rituais coletivos e aprendem a viver em comunhão com a natureza.
Esse modo de vida, conectado à floresta, tem sido ameaçado pela crise causada pela explosão de invasões de garimpeiros ilegais no território, o que motivou o governo Lula (PT) a declarar emergência em saúde pública no território em janeiro de 2023.
As consequências do avanço do garampo foram a forte elevação nos casos de malária e outras doenças, a desestruturação dos processos de caça, coleta e manutenção de roças, além de contaminação por mercúrio -o que, aliado há época à desestruturação do sistema de saúde, elevou os casos (e óbitos) por desnutrição no território, principalmente de crianças na primeira infância.
Ana Maria Machado, antropóloga e consultora do estudo, destaca que as crianças, em especial com idade de zero a 5 anos, são sempre as mais impactadas nesses momentos de grande crise sanitária ou de grande desestruturação do serviço de saúde, como foi no período da última grande invasão garimpeira, em 2023. “As doenças que mais acometem as crianças são as respiratórias, malária, desnutrição e verminoses.”
Ela lembra que, no começo dos anos 2000, o atendimento à saúde que conseguiu erradicar a malária no território yanomami foi o pautado na atenção primária de base nas comunidades e destaca a importância desse tipo de política ser retomada. “Se começava uma tosse ou se diagnosticava a malária [as crianças] eram tratadas rapidamente, esse quadro não se agravava, não era preciso fazer um deslocamento e evitavam-se todos outros desdobramentos.”
Para Gregory Bulit, chefe de emergência do Unicef no Brasil, o estudo não é apenas um diagnóstico, mas um chamado para que todos façam parte da construção de políticas públicas que respeitem a diversidade, a dignidade e os direitos das crianças e jovens de todos os povos indígenas e tradicionais.
Recomendações do estudo para proteger a infância e juventude yanomami
fortalecer políticas públicas específicas e diferenciadas para os povos Yanomami combater o garimpo ilegal e garantir a proteção territorial como condição básica para a sobrevivência, garantindo a preservação de sua cultura e modos de vida reconhecer e apoiar as organizações Yanomami, que representam grupos de diferentes regiões da floresta, e que têm papel central na defesa dos direitos e na mobilização comunitária qualquer ação a ser realizada na Terra Indígena Yanomami deve ocorrer em diálogo com as associações que pactuaram e produziram juntos o Plano de Gestão Territorial e Ambiental da Terra Indígena Yanomami escutar as crianças e os jovens yanomamis: a grande demanda desses jovens por acesso a novos conhecimentos, incluindo o uso de novas tecnologias, deve ser levada a sério, sobretudo como ferramentas na luta por respeito à sua dignidade.