BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Preso em flagrante pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do INSS, o presidente da Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), Carlos Roberto Ferreira Lopes, acusa o colegiado de ser seletivo por não convocar “instituições de fachada” para depor.
Ele afirma que há entidades que não existiram, subtraíram o erário por 30 meses, e não foram chamadas. “Já escutei dentro de conversas de advogados e familiares que sou boi de piranha, cortina de fumaça. Que estão batendo naqueles que são grandes para esconder os que não existem”, disse, em entrevista exclusiva à Folha.
O dirigente aponta que há “uma agenda política para destruir e privatizar a previdência”, mas admite que há problemas e devolveu grandes quantias por reclamações de inativos, mas não fraude. A entidade, investigada pela Polícia Federal, foi a segunda que recebeu mais descontos em aposentadorias no INSS, cerca de R$ 484 milhões entre 2019 e 2024, segundo levantamento da CGU (Controladoria-Geral da União).
O presidente da comissão, Carlos Viana (Podemos-MG), foi procurado pela reportagem, por meio de sua assessoria, para comentar as falas de Lopes, mas não respondeu.
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PERGUNTA – Como o senhor avalia os trabalhos da CPI?
CARLOS LOPES – Acho positivo um ambiente de inquérito, não há como negar o ocorrido dentro do INSS. Mas também não posso dizer que a agenda de investigação tenha sido a mais correta. Há entidades que não existiram, que subtraíram o erário por 30 meses, sem sede, e não foram chamadas. Deveriam ter sido as primeiras a serem investigadas. No ambiente de CPI, você não está investigado, já está sentenciado e execrado. Nós funcionamos, prestamos diversos serviços, fazendo desenvolvimento, ação social, princípios básicos do estatuto. Essas investigações vão acabar em outubro, depois da eleições.
P – Quais seriam essas instituições de fachada?
CL – Tem um coletivo de CNPJs que constataram como não existentes. Já escutei de advogados e familiares que sou boi de piranha, cortina de fumaça, que estão batendo naqueles que são grandes para esconder os que não existem. Agora estou acautelado pela Justiça, com funcionários para pagar. Parece que há uma agenda para destruir e privatizar a previdência. Do nada, viramos bandido. Por que com os consignados não houve o mesmo tratamento [na CPI]? Não dizem que os bancos roubam 30 vezes mais que associações? Não tiveram quebras de sigilo, bloqueios.
P – Qual interesse de extinguir as associações?
CL – Há um interesse de desqualificar as instituições que defendem a aposentadoria no Brasil social para privatizar o INSS porque leva 17% do PIB. Quem vai falar sobre isso? Só o Carlos. As instituições que defendem a aposentadoria nesse país, não foi o parlamento, foram os sindicatos e associações. Com certeza é uma agenda. Estão querendo uma previdência privada, uma previdência que pague quem já recebeu e quem vai se aposentar. Tem algumas pistas aí. A quem interessa o afrouxamento fiscal do Brasil? O mercado, né? Ele que leva 72% do nosso ativo fiscal? Eles estão ficando com 28% para agenda estatal e investimento público.
P – A CGU identificou cerca 329 mil reclamações sobre descontos não autorizados pela Conafer. A que atribui isso?
CL – Isso também foi seletivo. Nós tivemos mais de 200 mil reclamações duplicadas no sistema do INSS e há provas. O termo de adesão é assinado no primeiro grau, onde a pessoa vive. É como se eu fosse prender o presidente Lula por causa da fraude do INSS. Temos problemas, sim, e saneamos. Em cinco anos, nós devolvemos mais de R$ 170 milhões em danos de reclamações de inativos que não queriam mais a sociabilidade, ou que não tinham assinado. Tem gente que já tinha reclamado para a gente, foi no INSS, e a Conafer pagou dobrado. Todas as autarquias recebem reclamações, mas não há fraude.
P – A PF apontou que Cícero Marcelino, alvo da operação Sem Desconto, teria recebido cerca de R$ 800 mil do senhor. Qual a sua relação com ele?
CL – O que houve foi um pagamento da entidade que faço parte por seis anos de serviços prestados para a empresa que ele faz parte. Prefiro fazer negócio com as pessoas que favorecem o meu serviço, me atendem toda hora, onde preciso, leva, faz o que ninguém faz. Ele não é o meu assessor, como falaram, o que temos é uma relação comercial.
P – E com Vinicius Cruz, presidente do Instituto Terra e Trabalho, que recebeu R$ 14,5 milhões em emendas parlamentares e subcontratava a Conafer com essa verba?
CL – Vinícius Ramos é meu cunhado e diretor presidente de uma instituição que trabalha em Brasília há 14 anos. Agora tem problema de família trabalhar junto? Duvido que outras empresas não se relacionam com algum grau de afinidade. Não sou entidade pública para ter nepotismo. Também falaram que eu recebi R$ 1 milhão da Conafer, mas esqueceram de dizer que era por cinco anos do meu trabalho.
P – A CPI também levantou a venda de um avião do deputado Euclydes Petterson (Republicanos-MG) para esse instituto. Como vê isso?
CL – Isso não tem nada a ver com a Conafer. Só porque há uma relação institucional entre o mandato do deputado Euclydes e a Conafer? Tem alguma coisa na disputa eleitoral de Minas Gerais para trazer esse tipo de relação de ONG com deputado para a CPI? Não tenho esse avião, não estava nele, nem o conheço. Já tivemos várias crises do PowerPoint no Brasil, há várias vítimas.
P – Qual a sua relação com os parlamentares da Frente Parlamentar em Defesa do Empreendedorismo Rural? A sede fica em uma casa paga pela Conafer?
CL – Tenho relação com os 212 parlamentares que assinaram à frente, estamos juntos na defesa do empreendedorismo rural. A sede não fica nessa casa. A Conafer tinha essa casa como instituto de estudos parlamentares e para fazer reuniões, mas nunca foi da frente. A frente está situada dentro do Congresso, nos gabinetes dos parlamentares. Ela foi criada por interesse comum de vários prefeitos, associações e sindicatos que foram fazendo essa coalizão que vem de base, muito apoiada por parlamentares.
P – Quais a sua relação com servidores do INSS?
CL – A única relação que tenho com a autarquia é institucional, não tenho vida privada com eles. Nunca paguei nada a nenhum servidor a eles e nem nunca me propuseram isso. Também nunca me viram com uma Ferrari, ou ostentando em festas.
P – A CPI pediu sua prisão preventiva ao STF alegando também risco de fuga. Como vê isso?
CL – Se fui lá sem habeas corpus, pedi para depor, como você julgaria que esse cara quer fugir? Um cara que funciona de segunda a sexta? Não tem motivos para eu fugir. Se o STF julgar procedente o cerceamento da minha liberdade, eu me apresento. Minha entidade funciona e não oferece nenhum risco para a sociedade.
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RAIO-X | CARLOS ROBERTO FERREIRA LOPES, 46
Formado em direito e ciência política, com atuação no setor de agricultura familiar. É presidente da Conafer desde 2011.