BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Mais de 45 milhões de mortes, cerca de metade de todos os óbitos que ocorrem no mundo anualmente, não são notificados, o que limita a capacidade de os governos priorizar as necessidades de saúde e alocar os recursos de forma eficaz.

Uma nova campanha lançada na Cúpula Mundial da Saúde, que aconteceu em Berlim, busca promover o investimento em sistemas de Registro Civil e Estatísticas Vitais (CRVS) e reforçar a importância do uso de dados precisos para melhorar a saúde pública e salvar vidas.

A iniciativa, criada em 2015 e financiada pela Bloomberg Philanthropies e pela Fundação Gates, estabelece parcerias com países de baixa e média renda para aprimorar os dados de saúde pública e o uso de dados para a formulação de políticas.

Ela se concentra em quatro áreas principais: registro civil e estatísticas vitais, uso de dados para a formulação de políticas, registros de câncer de base populacional e pesquisas sobre fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis.

A Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) é uma das parceiras da iniciativa nas Américas. Segundo a organização, em muitos países os dados sobre óbitos permanecem incompletos ou imprecisos.

Em vários deles, por exemplo, menos da metade das certidões de óbito incluem a causa da morte documentada. A subnotificação também é comum, com mais de 20% das mortes não sendo registradas em algumas áreas.

Em um painel ocorrido durante o evento, especialistas afirmaram que, sem dados de mortalidade de alta qualidade, os formuladores de políticas têm dificuldade em compreender as tendências demográficas e as causas de morte e doenças, dificultando a alocação eficaz dos escassos recursos.

Em muitos casos, mesmo quando as mortes são registradas, muitas têm causas vagas, como parada respiratória ou insuficiência cardíaca, ou nenhuma causa.

Além disso, mesmo quando os dados de saúde estão disponíveis, eles frequentemente permanecem subutilizados, perdendo seu potencial para orientar decisões políticas e de investimento.

Um exemplo: estima-se que mais de 70% das mortes sejam causadas por DCNTs (doenças crônicas não transmissíveis) e que apenas 30% do financiamento público para a saúde em países de baixa e média renda estejam destinados a elas.

Segundo especialistas, mais de cem países de baixa e média renda não possuem sistemas de CRVS em pleno funcionamento e 40% das mortes em todo o mundo não são registradas.

Alain Labrique, diretor do Departamento de Dados, Saúde Digital, Análise e IA da OMS (Organização Mundial da Saúde), disse que o CRVS é o aspecto fundamental dos sistemas de saúde e que é importante investir nele.

“A vigilância da mortalidade frequentemente não é priorizada nos sistemas nacionais de informação em saúde. Durante a pandemia de Covid-19, apenas 73 dos 194 estados-membros da OMS conseguiram produzir contagens semanais de mortes, expondo lacunas críticas no registro civil e nas estatísticas vitais, certificações incompletas das causas de morte, sistemas de dados fragmentados e capacidade analítica limitada”, disse.

Para Betsy Fuller, pesquisadora da Bloomberg Philantropies, mesmo investimentos modestos em sistemas de dados podem levar a mudanças poderosas e duradouras na vida das pessoas.

“Para cada US$ 1 investido no fortalecimento de sistemas de dados, os países obtêm US$ 32 em benefícios líquidos por meio de políticas mais bem direcionadas e sistemas de saúde mais fortes”, disse Fuller.

O acesso à internet continua sendo um desafio em muitas áreas, mas os especialistas afirmam que há esforços em andamento para simplificar as plataformas de registro e torná-las mais fáceis de usar.

Hafiz Chowdhury, consultor técnico/líder da Fundação CDC, que trabalha com governos em países de baixa e média renda, citou o exemplo das Ilhas Salomão, na Oceania, que, inicialmente, não contavam com coleta de dados organizada.

“A atenção primária à saúde não estava estabelecida em nível local e o registro da causa de morte era muito baixo. Começamos a implementar autópsias verbais [a partir do relato de familiares] e outras estratégias e progredimos na melhoria da qualidade dos dados de óbito”, afirmou.

Entre as ações da iniciativa estão a avaliação dos sistemas nacionais de CRVS, treinamento, assistência técnica, melhores práticas para apoiar a governança de dados, a transformação digital e a integração e interoperabilidade da CID-11, a classificação internacional de doenças da OMS.

Labrique, da OMS, disse que o acordo permitirá que os países gerem dados mais completos e confiáveis para se tornarem mais bem equipados para tomar decisões baseadas em evidências que possam melhorar os resultados de saúde e reduzir as desigualdades.