Da Redação
Depois de quase década e meia atrás das grades, Francisco Mairlon Barros Aguiar recuperou a liberdade na madrugada desta quarta-feira (15), após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anular sua condenação pelo chamado “Crime da 113 Sul”, um dos casos mais marcantes do noticiário policial de Brasília.
A Sexta Turma do STJ, em decisão unânime, reconheceu que a sentença que levou Mairlon à prisão foi construída sobre provas frágeis e depoimentos colhidos fora do ambiente judicial, sem a presença de advogado. O colegiado determinou ainda o encerramento definitivo do processo.
O crime ocorreu em agosto de 2009 e chocou o país: o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela, sua esposa, Maria Villela, e a empregada doméstica Francisca Nascimento da Silva foram brutalmente assassinados a facadas no apartamento da família, na Asa Sul. Objetos de valor foram levados, levando a polícia a tratar o caso como latrocínio.
Preso em 2010, aos 22 anos, Mairlon foi acusado de ser um dos executores, com base em relatos de Leonardo Campos Alves, ex-porteiro do prédio das vítimas, e de seu sobrinho, Paulo Cardoso Santana. Ambos mudaram versões ao longo da investigação. Leonardo chegou a afirmar que a filha do casal, Adriana Villela, teria encomendado o crime — e foi a partir dessa linha de acusação que Mairlon acabou condenado, em 2013, a 55 anos de prisão, pena depois reduzida para 47.
No entanto, o julgamento foi revisado após atuação da ONG Innocence Project Brasil, que apontou uma série de irregularidades nas investigações e na coleta de depoimentos. Em vídeo exibido à TV Globo após deixar o Complexo da Papuda, Mairlon emocionou-se ao agradecer à equipe que revisou seu caso:
“Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Agradeço à minha família, aos meus advogados e à ONG que nunca desistiu de provar minha inocência. É impossível descrever o que estou sentindo.”
Durante o julgamento, o relator Sebastião Reis Júnior criticou duramente as falhas do processo:
“Não se pode admitir que alguém seja condenado apenas com base em depoimentos extrajudiciais, sem contraditório e sem defesa técnica. Isso fere o próprio Estado Democrático de Direito.”
Os demais ministros acompanharam o voto, destacando a gravidade das irregularidades. Rogério Schietti mencionou “expedientes incompatíveis com a civilidade”, enquanto Carlos Pires Brandão classificou o episódio como “uma tragédia jurídica”. Já Og Fernandes afirmou que as gravações das oitivas evidenciam “coação moral” contra o acusado.
Com a decisão, um dos capítulos mais controversos da justiça criminal brasileira chega ao fim, marcando um raro caso de revisão completa de sentença após tantos anos de prisão.