RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Justiça determinou que a prefeitura do Rio de Janeiro e o atual proprietário do sobrado onde viveu o escritor Machado de Assis, no centro da cidade, adotem medidas emergenciais para conter a degradação do imóvel, que está em ruínas e atualmente funciona como estacionamento.
A decisão é da 15ª Vara de Fazenda Pública da Capital, que acolheu o pedido do Ministério Público estadual em ação civil pública ajuizada pela 1ª Promotoria de Justiça de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural da Capital. O órgão responsabiliza o município e o dono do imóvel pela omissão na conservação de um bem tombado e pelo risco de colapso da estrutura.
A prefeitura ainda não informou se recorrerá da decisão nem quando pretende iniciar as obras de restauração. O Ministério Público afirmou que acompanhará o cumprimento das determinações judiciais e que poderá solicitar novas medidas caso o imóvel continue degradado.
O prédio, localizado no número 147 da rua dos Andradas, foi moradia de Machado e de sua esposa, Carolina Augusta Xavier de Novais, de 1869 a 1871.
O imóvel é tombado pelo patrimônio histórico e cultural municipal desde 2008, ano do centenário de sua morte. O sobrado está em área de proteção do ambiente cultural e está no entorno de bens tombados pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Segundo o Ministério Público, o imóvel encontra-se em “péssimo estado de conservação”, com infiltrações, fiação elétrica irregular e partes da fachada prestes a se desprender. A promotoria afirma que, embora coubesse ao poder público fiscalizar e exigir a preservação do bem, nenhuma medida efetiva foi adotada pela prefeitura para impedir a deterioração.
A Justiça determinou a retirada cuidadosa dos elementos arquitetônicos originais que estão se soltando da fachada, com posterior acondicionamento para reaproveitamento ou execução de réplicas. Também ordenou a remoção da cobertura de fibrocimento instalada irregularmente e de demais estruturas em mau estado, além da instalação de proteção no topo da alvenaria para evitar infiltrações.
Na determinação judicial, foi fixado prazo de 45 dias para o início das obras e 120 dias para sua conclusão, sob pena de multa diária de no mínimo R$ 10 mil em caso de descumprimento. O município e o proprietário deverão ainda adequar a fiação elétrica externa conforme as normas vigentes.
A Promotoria havia ingressado com a ação em 19 de setembro, após vistoria técnica confirmar o avanço das avarias e a descaracterização do imóvel. A investigação apontou que o sobrado perdeu parte de seus elementos originais e sofre risco de colapso parcial, com impacto potencial sobre imóveis vizinhos e pedestres.
O sobrado da rua dos Andradas foi uma das primeiras residências do autor após o casamento. Em pesquisa de 1955, a biógrafa Lúcia Miguel Pereira encontrou um bilhete de Machado, datado de 19 de novembro de 1869, em que ele relata ao amigo Ramos Paz as dificuldades financeiras “na casa da Rua dos Andradas”.
Outros sete endereços são apontados como possíveis moradias do escritor, segundo levantamento publicado pela Prefeitura do Rio no centenário de sua morte, em 2008. Entre eles, um imóvel na rua da Lapa, nº 242, também tombado, onde o casal teria vivido em 1874 e 1875, e residências no Catete, em Laranjeiras e no Cosme Velho, bairro onde Machado morreu.
Em parecer de 2008 que embasou o tombamento, a conselheira Natércia Rossi, relatora do processo, escreveu: “Não tem como fugir: por todos os cantos do Rio de Janeiro há um Machado atravessando a rua. As lentes do Bruxo do Cosme Velho não deixaram escapar nada. Os costumes, a moral, a elite e a ralé, a mediocridade, os grandes sonhos e os pequenos pecados –tudo foi visto, revisto e previsto por ele.”