SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Kremlin negou nesta segunda-feira (13) que o submarino russo de ataque com mísseis que surgiu na costa da França no fim da semana passada tenha tido problemas técnicos, enquanto o secretário-geral da Otan, Mark Rutte, fez piada da condição da embarcação.

“Que mudança desde o romance ‘A Caçada ao Outubro Vermelho’. Hoje, parece mais a caçada ao mecânico mais próximo”, disse o holandês em discurso na Eslovênia. “É um submarino russo solitário e quebrado, mancando de volta para casa de sua patrulha.”

Lançado em 1984, o livro de Tom Clancy conta a história de um submarino soviético avançadíssimo cujo capitão decide desertar para os Estados Unidos, causando uma megaoperação no Atlântico Norte. Hollywood lançou um famoso filme homônimo, com Sean Connery, em 1990.

A embarcação em questão é o B-261 Novorossisk, um modelo modernizado da classe de propulsão diesel-elétrica Kilo, que integra a Frota do Mar Negro —principal unidade naval envolvida na Guerra da Ucrânia. Ele estava em patrulha no Mediterrâneo e segue para estaleiros russos no Ártico.

Segundo o Ministério da Defesa russo, ele está em um trânsito entre frotas, sem mais detalhes. Ele foi fotografado por aeronaves da Otan e escoltado por uma fragata de Paris junto à costa da Bretanha, no noroeste francês, na quinta passada (9). No sábado (11), já estava no mar do Norte, acompanhado por um rebocador.

No fim de setembro, um canal do Telegram dedicado a divulgar informações militares secretas, o VChK-OGPU, havia dito que o Novorossisk deixaria o Mediterrâneo por um vazamento perigoso de combustível, o que foi negado pela Rússia.

A Frota do Mar Negro tinha, antes da guerra, seis embarcações do tipo. Os modelos carregam mísseis de cruzeiro Kalibr, e foram usados pontualmente no conflito —a maior parte dos disparos desse armamento é feito por pequenas corvetas, mais baratas de operar.

Ao menos um dos submarinos, o Rostov-no-Don, foi ou destruído ou severamente afetado por um ataque com mísseis ucranianos enquanto passava por reparos em Sebastopol, na Crimeia, em dezembro de 2023.

A vulnerabilidade das instalações e das embarcações da frota a mísseis e drones, tanto aéreos quanto aquáticos, é um dos calcanhares de Aquiles de Vladimir Putin no conflito —o afundamento da nau-capitânia Moskva é símbolo disso. Não que Kiev esteja em melhor forma: sua força no mar Negro, que já não era robusta, foi virtualmente aniquilada na guerra.

A Rússia opera 50 embarcações submersíveis. Dessas 12, são modelos com propulsão nuclear destinados a disparar mísseis com ogivas atômicas e 19, de ataque convencional. Outros 19 submarinos de ataque têm motores diesel-elétricos, como o Novorossisk.

A abordagem de Rutte buscou evitar o alarmismo das mais recentes intercorrências entre a Rússia e a aliança militar ocidental, cuja relação está em um nível de tensão inaudito desde a Guerra Fria desde que Putin invadiu a Ucrânia, em 2022.

Afinal de contas, uma das leitura possíveis do incidente seria a exibição proposital da embarcação, com seus mísseis de cruzeiro, perto da costa francesa. Quando drones russos invadiram o espaço aéreo polonês no mês passado, uma ação intencional segundo envolvidos que o Kremlin negou como tal, a Otan criou uma nova operação de defesa aérea no seu flanco leste.

Os episódios com drones se multiplicaram em países como Dinamarca e Alemanha, fechando aeroportos civis, mas sem nenhuma correlação comprovada com ação russa, apesar das suspeitas da Otan. E caças de Moscou fizeram uma intrusão, também negada como intencional, contra a capital da Estônia.

Agora, Rutte preferiu fazer piada, o que pode estar calcado na realidade ou apenas ser uma tentativa de manter os ânimos europeus mais contidos.

Chamada de histeria por Putin, a reação europeia foi exatamente o que um estrategista russo desejaria: aumentar a percepção de medo e ameaça no continente, o que tem impacto sobre popularidade de governos abertamente russófobos.