SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Israel começou a transferir os presos palestinos que devem ser trocados por reféns, afirmou Tel Aviv neste sábado (11), horas após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dizer que os sequestrados estavam sendo reunidos na Faixa de Gaza pelo Hamas.

De acordo com comunicado do Serviço Prisional de Israel, milhares de agentes de segurança trabalharam para a transferência dos detidos, durante a noite, para as prisões Ofer, na Cisjordânia ocupada, e Ketziot, no deserto de Negev, no sul do país.

Eles permanecerão nessas prisões até que os líderes israelenses deem a ordem para continuar a operação —assim que as forças israelenses concluíram a retirada das principais áreas urbanas de Gaza na sexta, controlando ainda cerca de metade do território, o tempo começou a correr para que o Hamas libertasse seus reféns em 72 horas.

O anúncio do Serviço Prisional ocorreu após o presidente americano afirmar, na noite de sexta-feira (10), que os reféns “estavam sendo recuperados” naquele momento e que alguns estavam em “lugares subterrâneos bastante difíceis”. A expectativa, segundo ele, é que os sequestrados sejam devolvidos a Israel na segunda (13).

O acordo de paz, baseado em um plano de 20 pontos proposto pelo republicano, prevê a libertação dos 47 reféns restantes, vivos e mortos, de um total de 251 sequestrados durante o ataque terrorista do Hamas a Israel, em 7 de outubro de 2023. Em troca, Tel Aviv libertará 250 prisioneiros palestinos e 1.700 moradores de Gaza detidos desde o início da guerra —a lista não inclui nenhuma figura emblemática da luta armada palestina.

“Acho que há consenso sobre a maior parte [do acordo], e alguns detalhes, como qualquer outra coisa, serão resolvidos. Você vai descobrir que, quando estava sentado em uma bela sala no Egito era mais fácil resolver”, afirmou Trump sobre o local em que as negociações foram realizadas ao longo da semana e para onde ele deve viajar nos próximos dias.

O presidente americano e seu homólogo egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, copresidirão a cúpula sobre Gaza, que também contará com a presença de outros líderes, informou o Ministério das Relações Exteriores do Cairo em um comunicado neste sábado, sem confirmar a data.

O presidente da França, Emmanuel Macron, viajará ao Egito na segunda, anunciou a Presidência francesa neste sábado, e o premiê da Espanha, Pedro Sánchez, e a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, também são esperados.

Trump ainda deve viajar a Israel e discursar no Knesset, o Parlamento israelense, tornando-se o primeiro presidente dos EUA a fazê-lo desde George W. Bush, em 2008.

“Estamos muito animados, esperando por nosso filho e por todos os 48 reféns”, disse Hagai Angrest, cujo filho Matan está entre os 20 reféns israelenses que se acredita ainda estarem vivos —26 reféns foram declarados mortos à revelia e o destino de mais dois é desconhecido. “Estamos aguardando o telefonema.”

Houve manifestações pró-Palestina em diversas cidades da Europa neste sábado, incluindo Berlim, Viena e Berna. Em Londres, Ben Jamal, diretor da Campanha de Solidariedade à Palestina, que organiza manifestações mensais na capital britânica desde o início da guerra, disse que compartilha o alívio dos palestinos. “Mas também viemos aqui compartilhando a apreensão de que este cessar-fogo não se manterá”, afirmou à agência de notícias AFP.

Um dos principais impasses ao longo dos dois anos de guerra na Faixa de Gaza foi em relação ao desarmamento do Hamas. O primeiro ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, sempre afirmou que o objetivo do conflito era aniquilar a facção, que por sua vez nega entregar as armas sem a criação de um Estado palestino.

Ao que tudo indica, a questão deve continuar sendo um problema: um membro do grupo terrorista afirmou à AFP neste sábado que o desarmamento está fora de discussão, embora Trump tenha afirmado que o tópico seria abordado na segunda fase do plano de paz.

Outras questões ainda em aberto são a governança de Gaza —a proposta de Trump é estabelecer uma autoridade de transição liderada por ele mesmo— e a reconstrução do território, devastado por bombardeios israelenses praticamente diários nesses dois anos.

Segundo o Acled (Banco de Dados de Localização e Eventos de Conflitos Armados), o Exército israelense atacou Gaza ao menos 20 mil vezes durante o conflito, e as cerca de 50 milhões de toneladas de escombros podem demorar até 21 anos para serem retiradas, de acordo com uma avaliação de janeiro da ONU. As Nações Unidas avaliam ainda que deve levar 10 anos para limpar o território de materiais explosivos.

Os enviados americanos Steve Witkoff e Jared Kushner, genro de Donald Trump, visitaram o território neste sábado após participarem de uma manifestação em Tel Aviv antes da libertação dos reféns.

Por enquanto, o cessar-fogo permitiu que centenas de milhares retornassem à Cidade de Gaza, onde mais da metade de população de 2,2 milhões de pessoas do território vive. De acordo com Mahmoud Basal, porta-voz da Defesa Civil de Gaza, que opera sob a autoridade do Hamas, o número chega a 500 mil palestinos.

A multidão foi vista voltando a pé, de carro ou de carroça ao longo da costa de Gaza. A moradora Raja Salmi foi uma das que fez o périplo de de 15 km entre Khan Yunis e a Cidade de Gaza.

“Caminhamos por horas, cada passo era repleto de medo e angústia pela minha casa”, relata a mulher na Cidade de Gaza.M as quando finalmente chegou a Al Rimal, seu bairro, descobriu que nada restava do seu lar. “Não existe mais, não passa de um monte de escombros. Fiquei em frente e chorei. Todas as lembranças são apenas poeira.”

A trégua deve ainda permitir um fluxo maior de ajuda ao território, que sofre bloqueios de Tel Aviv —em agosto, a ONU declarou estado de fome na Cidade de Gaza. O Ocha (Escritório das Nações Unidas para Assuntos Humanitários) afirma que Israel deu sinal verde para entregar 170 mil toneladas de ajuda como parte de um plano de resposta para os primeiros 60 dias da trégua.

“As necessidades mais básicas continuam urgentes em Gaza: equipamentos médicos, remédios, alimentos, água, combustível e abrigo adequado para dois milhões de pessoas que enfrentarão o inverno sem um teto sobre suas cabeças”, disse Jacob Granger, coordenador de Gaza da organização Médicos Sem Fronteiras.