SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Passado um dia da notícia de que a líder opositora da ditadura de Nicolás Maduro, María Corina Machado, ganhou o Prêmio Nobel da Paz, apenas duas autoridades da Venezuela comentaram a láurea uma delas indiretamente; outra, com ironia. Nenhuma pertencente ao alto escalão do regime.
O primeiro foi o embaixador venezuelano na ONU, Samuel Moncada, que foi questionado sobre a reação do regime ao prêmio durante entrevista coletiva na sede da organização, em Nova York, nesta sexta-feira (10).
“Eu não sei a reação do meu governo, mas eu posso falar a minha. Eu esperava que ela ganhasse o Nobel de Física, porque ela tem as mesmas credenciais para o Nobel de Física e para o Nobel da Paz. Talvez, no próximo ano, ela ganhe o Nobel de Física”, afirmou, em tom irônico.
O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodríguez, aliado de primeira hora de Maduro, também se manifestou, mas de forma indireta.
“Somos militantes do partido da paz”, afirmou, de forma genérica, em uma transmissão da emissora estatal venezuelana, a TVT. “Militantes do partido da paz é cada venezuelano e cada venezuelana de bem. Somos militantes do partido de qualquer forma que impeça a ação da violência ou o uso da violência para resolver assuntos políticos.”
Em seguida, afirmou que era preciso cuidar da paz e da harmonia. “Temos que cuidar delas. Cuidar da paz é cuidar da nossa soberania. Cuidar da paz é cuidar do nosso solo sagrado, dos nossos filhos, dos nossos pais, mas, sobretudo, cuidar da paz é cuidar de cada venezuelano e cada venezuelana, de cada lar”, continuou.
Rodríguez fez as declarações cercado de pessoas, muitas delas crianças, vestindo acessórios natalinos. No início de setembro, em meio a uma tensão militar com os Estados Unidos, Maduro decretou que as celebrações do feriado cristão começariam no dia 1º de outubro.
Não é a primeira vez que o ditador antecipa a data comemorativa diante de uma crise. Agora, a instabilidade tem a ver com manobras militares que Washington vem fazendo perto da Venezuela sob a justificativa de combater o tráfico de drogas na região gesto apoiado por María Corina e visto amplamente como uma forma de ampliar a pressão sobre Maduro.
Já no ano passado, após se autodeclarar vitorioso das eleições presidenciais sem apresentar as provas exigidas pela lei venezuelana, Maduro antecipou as celebrações para o dia 4 de outubro em meio a uma onda de protestos. A diferença, na prática, é que as ruas do país ganham decorações festivas e o regime intensifica a distribuição de auxílio e cestas de alimentos típicas da época de fim de ano.
O Itamaraty tampouco se pronunciou sobre a vitória. Segundo apuração da reportagem, o governo brasileiro vê María Corina como uma líder de ultradireita no início do ano, a venezuelana participou, por vídeo, da cúpula dos líderes europeus “Patriotas pela Europa”, ao lado do primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, do vice-premiê da Itália, Matteo Salvini, e a ex-candidata à Presidência da França Marine Le Pen.
Muitos políticos e lideranças venezuelanas cumprimentaram María Corina.
Juan Guaidó, por exemplo, que em 2019 se autodeclarou presidente da Venezuela, afirmou que a opositora “é um símbolo de resistência e esperança”. “Este Prêmio Nobel da Paz não só reconhece sua liderança, mas também o sacrifício de um povo que se recusa a ceder. É um apelo à comunidade internacional para que não abandone a Venezuela”, afirmou ele, atualmente exilado.
Henrique Capriles, ex-candidato a presidente e ex-governador do estado de Miranda, também parabenizou a líder. “Que este reconhecimento seja mais um impulso para alcançar a PAZ e para que nossa Venezuela deixe seu sofrimento para trás e recupere a liberdade e a democracia pelas quais lutamos por tantos anos”, escreveu na rede social X.
Já Trump, a quem María Corina dedicou o prêmio, falou sobre o assunto apenas na noite de sexta, durante uma entrevista coletiva. “A pessoa que recebeu o Prêmio Nobel hoje me ligou e disse: ‘Estou aceitando isso em sua homenagem porque você realmente mereceu’. Foi uma coisa muito gentil da parte dela”, afirmou.
“Eu não disse: ‘Me dê'”, acrescentou, em uma brincadeira sobre a sua campanha aberta pelo prêmio. “Ela foi muito gentil. E eu a ajudei o tempo todo. Ela precisa de muita ajuda. Há um desastre na Venezuela”, completou.
A primeira reação oficial da Casa Branca, durante a manhã de sexta, havia sido a de criticar o comitê, que teria provado que “prioriza a política acima da paz”. “[Trump] tem o coração de um humanitário, e nunca haverá ninguém como ele, capaz de mover montanhas com a força de sua vontade”, disse o porta-voz Steven Cheung no X.