SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Diante do alerta de saúde pública causado pelo surto de bebidas contaminadas por metanol, clientes frequentes de bares paulistanos procuram meios de manter o consumo de álcool com segurança. Enquanto alguns trocam drinques por cerveja e vinho, outros utilizam clubes da garrafa para beber destilados e dizem se sentir seguros dessa forma.

Tradicional em São Paulo nos anos 1990, o serviço permite ao cliente comprar a própria garrafa fechada e deixá-la armazenada no bar para consumo em visitas futuras, com seu nome registrado.

É isso que o dentista Ricardo Nakamura, 70, faz no Bar do Juarez, em Pinheiros, desde 2008. “Compro garrafas aqui desde que o bar abriu. Eu tenho uísque em casa também, mas lá eu não bebo. Prefiro beber na mesa de bar, onde eu conheço todo mundo”.

Segundo ele, a confiança no local faz diminuir seu temor com metanol. “Eu tenho medo ao ver as notícias, mas aqui eu me sinto totalmente seguro. E, por exemplo, a garrafa que tenho hoje está aberta desde antes de essa questão do metanol começar. Minha garrafa nunca me fez mal nenhum”, brinca.

Desde a abertura de sua primeira unidade, em 1999, o Bar do Juarez oferece o clube da garrafa. Hoje, as seis filiais contam com cerca de 480 associados. “A pessoa que já possui uma garrafa tem ainda mais confiança. Ela já comprou outras vezes, já renovou e nunca teve problema. São fatores determinantes neste momento”, diz o dono e fundador, Juarez Alves.

O Charles Edward, no Itaim Bibi, também oferece esse serviço desde sua inauguração, há 30 anos. Hoje, o clube conta com mais de 4.000 assinantes. “Cerca de 40% dos nossos clientes vêm toda semana, pelo menos um dia. Sentimos que, mesmo com as notícias do metanol, esse público continua seguro de comprar uma garrafa ou beber a que já estava aqui. Já os clientes não habituais migraram para cerveja ou vinho”, relata Gabriel Veiga, um dos sócios.

Na semana passada, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, reforçou a recomendação de que, neste momento, o mais indicado é evitar bebidas destiladas, especialmente líquidos incolores.

O advogado Edilson Bianconi, 53, frequenta o Charles há 14 anos e há 10 compra as próprias garrafas. “Eu vou toda semana. Se você me perguntar se eu beberia em outro bar nesse momento, a resposta é não. Mas lá eu me sinto seguro. Mesmo quando for comprar uma garrafa nova, o que vai acontecer logo, porque a minha está acabando”.

Outro ponto positivo para a sensação de segurança dos consumidores é a diversidade de rótulos oferecidos nesses estabelecimentos. “Muitos dos nossos produtos você não costuma ver por aí, são bebidas mais difíceis de encontrar e que não tem falsificação, pois são mais caras e com pouco volume no mercado”, diz Veiga.

VETO À ROLHA

Outra mudança que a crise do metanol trouxe para estabelecimentos em São Paulo é a proibição da taxa de rolha, serviço que permite ao cliente pagar para levar a própria bebida a bares e restaurantes —normalmente, a medida é utilizada para vinhos, mas há casas que aceitam também destilados.

“Nós permitíamos com a cobrança de 70% do preço do cardápio, mas agora proibimos a entrada de qualquer bebida, porque gera insegurança. Eu não sei onde o cliente comprou e se está tudo certo com aquela garrafa. Não tem a mesma confiabilidade que tem o meu produto, que compro de fornecedores homologados”, afirma Veiga, do Charles Edward.

O Guarita Bar, em Pinheiros, também proibiu a prática. “Acontecia em alguma comemoração de um cliente habitué perguntar se poderia levar um uísque, uma bebida de família. Hoje, mesmo se for um cliente superespecial, nós não poderíamos ceder”, diz Jean Ponce, sócio do bar.

O Guarita trabalha com os mesmos quatro fornecedores principais desde sua inauguração, em 2016. “Eu tenho certeza da procedência dos meus produtos, não apenas pelas notas fiscais, mas pela parceria e cadeia que criamos. Quando surgiu o problema com o metanol, alguns clientes entraram em contato perguntando se poderiam trazer destilados, mas eu não posso garantir a qualidade desses produtos”.

Ponce reforça que não é falta de confiança no cliente. “O problema é que não tenho como saber onde ele comprou, qual foi o caminho da bebida. Aqui dentro eu consigo fazer um rastreamento completo”.

Ao ser questionada sobre as mudanças de atendimento e proibições causadas pelo surto de bebidas com metanol, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) disse que não faz qualquer recomendação que interfira na gestão autônoma de cada negócio.

Para auxiliar os estabelecimentos neste momento, a entidade lançou um FAQ (perguntas frequentes) e uma cartilha com orientações para identificar bebidas autênticas. Além disso, a associação realizou treinamentos gratuitos sobre bebidas falsificadas.