SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo brasileiro teme que o prêmio Nobel da Paz concedido à líder opositora María Corina Machado aumente as chances de uma intervenção militar americana na Venezuela ao empoderar a ala mais linha-dura do governo Trump, liderada pelo secretário de Estado, Marco Rubio.
Segundo funcionários de alto escalão do governo brasileiro, a láurea pode dificultar as tentativas de Brasília de “desescalar” a situação. Em telefonema com Trump no início da semana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abordou com o mandatário americano a necessidade de uma “saída diplomática” na Venezuela, como revelou a Folha de S.Paulo. Na conversa, Lula afirmou que não há temas proibidos entre os dois líderes e que era preciso olhar de perto a situação na América Latina.
Para o governo brasileiro, a oposicionista venezuelana Maria Corina é vista como de ultradireita, e o prêmio Nobel gerou surpresa. No início do ano, a venezuelana participou, por vídeo, da cúpula dos líderes europeus “Patriotas pela Europa”, ao lado do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, do vice-primeiro-ministro da Itália, Matteo Salvini, e da líder direitista francesa Marine Le Pen. María Corina dedicou o prêmio Nobel a Trump.
Segundo um funcionário do Itamaraty, ainda não há uma decisão de não publicar uma nota parabenizando a venezuelana pelo prêmio, mas a tendência é não haver comunicado oficial.
O governo brasileiro vê semelhanças entre María Corina e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que pressionou o governo Trump para adotar sanções e tarifas contra o Brasil. Ela pediu abertamente ao governo Trump que interviesse na Venezuela para tirar o ditador Nicolás Maduro do poder, ainda que não tenha mencionado ação militar, e disse que seu movimento poderia assumir a presidência.
Na visão do governo brasileiro, os dois políticos apoiam “mudança de regime” com ajuda dos Estados Unidos, e pressionam por interferência externa e violação de soberania.
O governo americano direcionou vários navios de guerra para o mar do Caribe e, atualmente, mantém ao menos 10 embarcações na região. Os EUA atacaram embarcações venezuelanas, afirmando serem narcoterroristas.
O Presidente Lula não fala com Maduro desde agosto do ano passado, após as inúmeras acusações de fraude na eleição venezuelana, cujo resultado não foi reconhecido por observadores internacionais como o Carter Center. Considera-se que as relações entre Brasil e Venezuela estão congeladas, ainda que não tenha havido um rompimento.
Mas o Brasil acha que qualquer intervenção ou tentativa de derrubar o ditador Nicolás Maduro vai produzir uma crise humanitária sem precedentes, com êxodo maciço de refugiados venezuelanos.
Outro fator que causa preocupação no governo brasileiro foi o escanteamento de Richard Grenell, enviado especial do governo americano para a Venezuela. Trump determinou nesta semana que Grenell suspendesse todos os esforços diplomáticos para aproximação com Maduro. Com isso, ganha força a abordagem mais linha dura de Rubio.