SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar está em forte disparada nesta sexta-feira (10), com investidores temerosos sobre o equilíbrio das contas públicas no país.

A manhã contou com o lançamento do novo crédito imobiliário do governo federal, considerado estratégico para aumentar a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) às vésperas das eleições de 2026.

A medida segue a esteira da derrubada da MP dos Impostos no Congresso Nacional, e o mercado, pesando a possibilidade de aumento de gastos por parte do Executivo e a de uma reeleição, vê riscos para os ativos brasileiros e busca proteção no dólar.

Na ponta internacional, o fim da guerra entre Israel e Hamas e o índice de sentimento do consumidor da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, também influenciam nas cotações.

Às 13h51, a moeda disparava 2,11%, cotada a R$ 5,488. No pico da sessão, chegou a 5,495. Já a Bolsa marcava queda de 0,98%, a 140.318 pontos.

O novo modelo de crédito imobiliário, antecipado pela Folha e divulgado pelo governo federal nesta sexta-feira, prevê a liberação total dos depósitos compulsórios da poupança para ampliar o acesso da classe média à casa própria pelo SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo).

As novas regras devem injetar, de forma imediata, pelo menos R$ 20 bilhões em recursos para a contratação de financiamentos para a compra da casa própria. O desenho ainda aumenta o valor máximo dos imóveis financiados por meio do SFH (Sistema Financeiro de Habitação), que permite o uso do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) para a compra da casa própria. Desde 2018, esse teto é de R$ 1,5 milhão, e agora é de R$ 2,25 milhões.

A Caixa, além disso, volta a financiar até 80% do valor da casa própria no sistema de amortização SAC (Sistema de Amortização Constante), no qual as parcelas são maiores no início e menores no fim, por causa da diminuição progressiva dos juros.

O novo modelo deverá ter “plena vigência” a partir de janeiro de 2027.

As mudanças são vistas como uma forma de alavancar a popularidade do governo Lula antes das eleições de 2026. Como divulgado pela pesquisa Genial/Quaest na véspera, o presidente mantém a liderança nas simulações de primeiro e segundo turno para o próximo ano.

“Estamos a 12 meses da eleição, e ainda há muito o que acontecer até lá. Os investidores tendem a reagir positivamente quando há, digamos, notícias que mostram fraqueza do governo atual. O mercado acredita que uma mudança de governo pode levar a uma gestão mais responsável fiscalmente”, diz Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.

Com as medidas possivelmente colaborando para a popularidade do presidente, o sentimento é reverso -e investidores preferem fugir do risco de investir em ativos brasileiros.

“O volume de negociações está um pouco maior que o normal por conta da tensão fiscal, mas dentro do esperado para um momento como esse”, diz Ian Lopes, economista da Valor Investimentos.

Na análise de André Galhardo, economista-chefe da consultoria Análise Econômica, o novo desenho injeta estímulos que podem aquecer a economia a um nível que o mercado não precificava até então.

“Apesar da taxa Selic em 15%, o mercado imobiliário pode manter um ritmo de crescimento da economia num patamar talvez um pouco mais forte do que o precificado. Com consequência, as taxas de juros futuras sobem neste momento, talvez até precificando uma taxa Selic alta por um período mais prolongado”, afirma.

O novo crédito imobiliário segue a esteira da derrubada da MP (medida provisória) dos Impostos na Câmara dos Deputados na quarta-feira, uma medida que o governo considerava importante para sustentar a arrecadação e reduzir despesas obrigatórias em ano eleitoral.

A derrubada da medida deve causar um bloqueio nas despesas de 2025, incluindo emendas parlamentares, e obrigar um ajuste de R$ 35 bilhões no PLOA (projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2026. Para governistas, esse era justamente o objetivo de partidos do centrão e da bancada ruralista: restringir o espaço fiscal de Lula no ano em que ele deve buscar a reeleição.

Ao retirar do horizonte uma fonte de arrecadação para os próximos anos, o Congresso torna mais desafiadora a tarefa do governo de cumprir as metas estabelecidas pelo arcabouço fiscal.

Isso, “somado à percepção de que os gastos públicos continuam aumentando às vésperas das eleições, faz com que o real fique pressionado perante moedas mais seguras”, diz Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad.

“A questão fiscal saiu da pauta recentemente, e o real estava se fortalecendo apoiado no diferencial de juros [entre Brasil e EUA] e na expectativa de enfraquecimento global do dólar. Mas não dá para ignorar o endividamento brasileiro por muito mais tempo.”

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já afirmou que apresentará “várias alternativas” ao presidente.

Ao mesmo tempo, o fim da guerra entre Israel e Hamas derruba os preços do petróleo no mercado internacional, fortalecendo o dólar ante moedas de países de forte exportação da commodity, como o Brasil.

O barril do Brent, referência global de preços, caía 1,75%, cotado a US$ 64,08 na Bolsa de Londres.

“Essa queda também reforça a pressão sobre moedas de países considerados menos seguros”, diz Cristiane Quartaroli, economista-chefe do Ouribank.

Além disso, o mercado também avalia os dados da confiança do consumidor dos Estados Unidos. A Pesquisa de Consumidores da Universidade de Michigan mostrou que o índice pouco se alterou, ficando em 55,0 este mês em relação a uma leitura final de 55,1 em setembro. Economistas consultados pela Reuters projetavam que o índice cairia para 54,2.

O relatório mostrou estabilidade em outubro, com as famílias parecendo não se importar com a paralisação parcial do governo, embora as preocupações com o mercado de trabalho e a inflação continuem.