SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Justiça Federal negou um pedido de tutela provisória feito pela empresa Blue Sky e ordenou que a entidade cumpra determinação do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) para recapturar ararinhas-azuis diante de um surto de um vírus letal.

Até aqui, a empresa e a ONG alemã ACTP, que opera o projeto de reintrodução na caatinga baiana, têm se recusado a recolher as aves.

Em julho deste ano, o instituto anunciou a ocorrência de casos positivos de circovírus na população de ararinhas-azuis em Curaçá, na Bahia, onde funciona o projeto de reintrodução. O patógeno é causador da chamda doença do bico e das penas em animais do tipo psitacídeos, como papagaios, araras e periquitos.

A enfermidade não tem cura, é crônica e termina por matar a ave na maioria dos casos. O vírus não é perigoso para humanos ou para aves de produção, como galinhas.

A espécie, endêmica da caatinga brasileira, é uma das aves mais raras do mundo. Pouco mais de 300 delas existem hoje em todo o planeta, e a imensa maioria em cativeiros. As poucas que estão na natureza foram reintroduzidas no âmbito do programa de conservação da empresa Blue Sky e da ONG alemã ACTP.

Na decisão, publicada nesta quarta-feira (8), o juiz federal Leonardo Tavares Saraiva, da 9ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, diz que a organização deve cumprir integralmente a notificação do ICMBio “no prazo de 20 dias, contados da intimação desta decisão, quanto à captura, isolamento e testagem das ararinhas-azuis em vida livre, sob sua responsabilidade como mantenedora licenciada do plantel”.

A reportagem procurou por e-mail o biólogo sul-africano Cromwell Purchase, que trabalha no criadouro da organização em Curaçá, mas ele não respondeu até a publicação deste texto.

Em setembro, Cromwell Purchase disse em entrevista à Folha de S.Paulo que recolher as aves seria “irresponsável” e causaria a extinção da espécie —o que, acusa Purchase, seria o verdadeiro objetivo das autoridades ambientais brasileiras “desde que perceberam o sucesso que uma empresa estrangeira teve”.

Na decisão, o juiz afirma que, em caso de descumprimento, o ICMBio poderá realizar as medidas sanitárias cabíveis, inclusive com apoio das equipes, podendo, posteriormente, cobrar da organização os custos envolvidos.

“Caberá ao ICMBio adotar as providências necessárias para a adequação, supervisão e operacionalização do referido espaço, assegurando condições mínimas de biossegurança, alimentação e monitoramento dos animais, em consonância com suas atribuições institucionais de proteção à fauna silvestre”, diz o texto da decisão.

Apesar as recomendações do ICMBio, órgão do Ministério do Meio Ambiente que monitora o programa, a ACTP e Blue Sky têm insistido que não realizarão a captura das ararinhas-azuis em vida livre, argumentando que a medida não é necessária nem eficaz.

Purchase, biólogo sul-africano à frente da Blue Sky, afirmou ainda à Folha de S.Paulo, em setembro, que havia tomado medidas para conter o surto do vírus e que testes feitos desde a identificação inicial da doença (em um filhote, em fevereiro) têm sempre tido resultados negativos.

Já o ICMBio diz que testes feitos apenas em amostras de fezes das aves não comprovam a ausência da doença. Além disso, a autoridade ambiental ressalta que há uma possibilidade real de falsos negativos nos exames feitos pelo criadouro a partir das fezes.

Sem a recaptura para realização de testes, avaliar se o surto acabou ou se mais aves da região estão em risco é impossível, segundo o ICMBio.

Colaborou Victor Lacombe, de São Paulo.