SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A abertura de um terminal para cargas frias não poderia ter chegado em um momento mais propício para o Ceará. Com as exportações estagnadas de pescados e outros produtos refrigerados para os Estados Unidos, devido ao tarfifaço de Donald Trump, a possibilidade de armazenar as cargas enquanto o problema persiste ou não aparece um novo mercado no exterior dá aos produtores a chance de ganhar tempo.

“É uma ferramenta para auxiliar os exportadores do Ceará a ter mais durabilidade nos produtos enquanto esse imbróglio não é resolvido pelos governos. Os produtores têm a chance também de mudar o foco para uma distribuição nacional. Os pescados que não podem ir para os Estados Unidos, estamos armazenando”, diz Thiago Abreu, diretor-geral da Fracht Log, terminal de cargas frias do porto de Pecém, próximo a Fortaleza.

O empreendimento da multinacional de origem suíça foi inaugurado no mês passado. Para maximizar espaço, mais produtos diferentes refrigerados têm sido colocados nos mesmos contêineres refrigerados, à espera de uma definição.

“O conceito foi apresentado no Pecém no final de 2021, quando percebemos que o mundo estava bem fragilizado na economia, por causa dos fretes. Agora temos essa situação das tarifas”, completa.

O Ceará é o estado brasileiro proporcionalmente mais afetado pela sobretaxa de 50% imposta por Donald Trump às exportações brasileiras.

No início do mês passado, o governador Elmano Freitas (PT) assinou decreto declarando situação de emergência por causa dos impactos econômicos causados pelas tarifas.

Neste ano, até a entrada em vigor das barreiras protecionistas, os Estados Unidos foram destino de 52% do Ceará, uma ascensão de 7% em relação a 2024. Na isenção posteriormente anunciada, 1,38% do que é vendido pelo estado foi beneficiado.

Em agosto, as exportações para o país caíram 46,3% em relação a julho.

As tarifas afetam especialmente municípios que têm cadeia de empregos apoiada na exportação de água de coco, castanha, frutas, mel e pescados para os EUA. Neste último, são milhares de empregos diretos e indiretos.

A maior parte das exportações taxadas em 50% são de aço fabricado da AcelorMittal (70%): US$ 414 milhões.

“Nessa indústria todo mundo está taxado igual. A concorrência continua a mesma. Mas há os US$ 130 milhões que eram dos pescados, dos sucos, cereais, calçados, castanha de caju, frutas, água de coco”, afirma Ricardo Cavalcante, presidente da Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará).

“O maior problema é para setores menores. O início da safra da castanha será daqui a três meses e se colhe para o ano todo. É uma cadeia que envolve 50 mil trabalhadores, por exemplo. Se a gente olhar para a cera da carnaúba, só é fabricada no Ceará, Piauí e Maranhão. São 150 mil pessoas em um setor que existe há mais de 100 anos”, completa.

O Ceará é o maior exportador de pescados do mundo, e o comércio envolve espécies como lagosta, atum e peixes vermelhos. Toda a venda é para os Estados Unidos. Pelos dados da Fiec, são 18 mil pescadores. Mas, para cada 1 no mar, são 3 em terra na cadeia. Isso multiplica o número de trabalhadores para 60 mil.

A busca por novos mercados existe e é uma das prioridades do governo estadual. Mas não é simples,

“Estamos falando de alimentos. Nosso peixe é pescado em uma área de águas mornas. Não dá para vender para a China porque lá a água é fria. Tem as questões sanitárias. Não se consegue entrar em um novo país em 20 dias. Isso é normal. É coisa de cinco, seis meses. Não se resolve da noite para o dia”, constata Cavalcante.

A iniciativa privada relatou ao governo cearense os riscos econômicos. Empresas de logística, como a Fortallog, mostraram a queda no volume de cargas. A JM Negócios Internacionais, que oferece consultoria em comércio exterior, afirmou que a cadeia de transportadores e operadores portuários tem sido prejudicada.

“Mesmo antes da adoção das tarifas, quando ainda eram rumores, nos reunimos com empresas que poderiam ser afetadas e tentamos fazer ajustes. O estado tenta ajudar a encontrar novos mercados e realiza diálogos nas esferas pública, privada e com a academia”, afirma o secretário da Fazenda do Ceará, Fabrício Gomes.

O governo aprovou medidas para oferecer incentivo fiscal, subvenção econômica e pagamento de crédito de exportação acumulado. O Fazenda reembolsa a empresa que comprovar ter sido prejudicadas pelas tarifas por 40% do imposto de exportação cobrado pelos Estados Unidos. Isso acontece de forma financeira ou descontando outros tributos devidos.

O estado tem comprado parte da produção de pescados e castanha de caju para incluir na merenda oferecida nas escolas públicas e no programa Ceará Sem Fome.