BELÉM, PA (FOLHAPRESS) – Um mercado do início do século 20, em estilo eclético, virou um centro gastronômico, turístico e cultural em Belém, em um complexo com 50 mil m². Trata-se do mercado de São Brás, projetado pelo arquiteto italiano Filinto Santoro e inaugurado em 1911, um dos símbolos do fausto da borracha na região.

A inauguração total do espaço, uma das principais obras para a COP30 na cidade, está prevista para esta quinta-feira (9), após duas aberturas parciais.

“A ideia é que seja um espaço que a gente tenha orgulho de frequentar e de levar um turista, uma pessoa de fora. Um local prioritariamente gastronômico, mas que também terá atividades culturais”, diz André Cunha, titular da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, responsável pela administração do espaço.

A obra, que custou cerca de R$ 150 milhões, tem financiamento da Itaipu Binacional e da Prefeitura de Belém e foi executada pela Codem (Companhia de Desenvolvimento e Administração da Área Metropolitana de Belém).

Serão 43 equipamentos gastronômicos no espaço interno do mercado. “Vamos ter restaurantes, bares, cafeterias, tapiocarias, lanchonetes, hamburguerias, casas de caldo, pizzarias, docerias, sorveterias. Será um mix bem variado, para oferecer uma verdadeira experiência gastronômica”, relata Cunha.

O mercado tem três níveis. No térreo, além dos empreendimentos gastronômicos, há dois pavilhões de 630 m², um de cada lado.

“Esses espaços podem abrigar atividades culturais, exposições, eventos privados. Cabem centenas de pessoas sentadas, ideal para apresentações e shows de pequeno e médio porte ou até mesmo para congressos”, afirma o secretário.

Já no primeiro mezanino, haverá 14 lojas, com produtos variados, como artesanato regional e souvenirs. O segundo mezanino abrigará quatro restaurantes maiores, com acesso a terraços, onde serão instaladas mesas com ombrelones, além de oito lojas.

O projeto de requalificação e restauro do espaço é da M2p Serviços de Arquitetura e Engenharia e foi liderado pelo arquiteto e engenheiro Aurélio Meira, fundador da empresa. Ele conta que visitou mercados europeus para buscar inspiração.

“Queria a mesma atmosfera do Covent Garden, de Londres, onde você pode escutar música erudita ao vivo, e do Campo de Ourique, em Lisboa, que tem um espírito lúdico e popular”, revela.

Meira se preocupou em manter as características originais do mercado de São Brás em suas intervenções, sem cair no que chama de “falso histórico” –quando se faz uma imitação fidedigna do que falta em um edifício.

“Para o piso, por exemplo, usamos o mesmo material original, ladrilho hidráulico, mas convidei o artista Geraldo Teixeira para criar um desenho novo, geométrico, com aspecto contemporâneo”, explica.

Já para os quiosques onde funcionarão os estabelecimentos gastronômicos, ele fez o forro do teto com freijó, uma madeira nobre da amazônia, e usou granito natural e polido nos balcões.

No subsolo, foi construído um estacionamento com 202 vagas, com acesso ao interior do mercado. O local contará ainda com oito lojas, com serviços como casa de câmbio, gráfica e chaveiro.

A ideia, segundo o secretário André Cunha, é que o funcionamento do espaço já supere os 90% para o período da COP30, em novembro, quando a cidade receberá cerca de 50 mil pessoas de todo o mundo.

INSPIRAÇÃO FERROVIÁRIA

Na área externa, atrás do mercado, o arquiteto projetou dois espaços modernos inspirados nos vagões de trem da estrada de ferro Belém-Bragança, que ligava a capital paraense ao município no nordeste do estado, inaugurada em 1884 e desativada em 1965.

“Este mercado foi construído para funcionar como um entreposto comercial para os produtos que vinham de Bragança, já que a estação central ficava aqui próxima, onde hoje funciona a rodoviária”, explica Meira.

Esses espaços de vidro e alumínio ficarão totalmente cobertos por plantas trepadeiras e abrigarão dois restaurantes, com mesas nas partes interna e externa. Já dois quiosques históricos funcionarão como bares.

Ainda na área externa, foram inaugurados, em 19 de agosto, os espaços destinados aos feirantes, que antes ocupavam o interior do mercado. São três zonas separadas: uma para refeições, uma para lanches e a feira propriamente dita.

Para os cerca de 195 permissionários, foram mais de dois anos de espera em um local provisório. “Foi um sofrimento, um lugar muito quente, fechado. Não tinha freguês, a gente não vendia nada”, lembra Idê Rodrigues, que tem um box na área de refeições. “Agora está uma maravilha, uma coisa de louco. Muitos fregueses”, elogia.

Gerson Santos, que ocupa um box de frutas na feira, concorda: “A feira provisória foi horrível. Ficamos sem movimento, não tinha estacionamento. Um caos”. Para ele, o novo espaço “é maravilhoso, mais aconchegante”.

Na área da feira, pode-se encontrar de tudo: de hortifrúti a artigos religiosos, passando por armarinho, mercearia, peixaria, açougue e pet shop, entre outros. No espaço de refeições, há 24 boxes, com cardápios variados, mas com destaque para a culinária local. Já a zona de lanches conta com 12 equipamentos.

Todos esses espaços são alimentados por energia solar, com placas instaladas nos telhados.

MEMÓRIA

O arquiteto Meira explica que, no projeto de requalificação, há também a implementação de uma espécie de “museu contextual”, buscando valorizar e preservar a memória local.

“Na praça Floriano Peixoto, em frente ao mercado, temos obras de Bruno Giorgi, que, ao lado de [Victor] Brecheret, está entre os maiores escultores do Brasil”, diz, referindo-se à estátua em bronze de Lauro Sodré, ex-governador do Pará, e à “Vitória”, escultura na parte superior de um obelisco.

Outro conjunto escultórico do artista, chamado de “As Três Graças”, representando o Trabalho, a Justiça e as Artes, foi furtado e nunca recuperado. Para ocupar esse espaço, Meira convidou o artista Fernando Pessoa, que fez uma releitura da composição, apenas com as silhuetas das figuras da obra original.

Na parte traseira do mercado, há instalações contemporâneas de artistas paraenses. A obra “Sinalizadores Ferroviários”, de Geraldo Teixeira, em ferro e fibra de vidro, representa os sinalizadores que havia, no início do século 20, na estação ferroviária. Já a obra de Emanuel Franco, batizada de “Pássaros dos Rios”, faz referência aos lemes das embarcações regionais amazônicas, em peças coloridas de madeira.