SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A designer de interiores Rhadarani Domingos, 43, disse ter consumido três caipirinhas de frutas antes de ter perdido a visão devido à intoxicação por metanol. Bruna Araújo, 30, que morreu em São Bernardo do Campo nesta segunda-feira (6) havia consumido um combo de vodca com suco.
Outras vítimas confirmadas de intoxicação por metanol também tomaram quantidades variadas de bebidas alcoólicas contaminadas pela substância.
Existe um nível mínimo necessário de consumo da substância para prejudicar a saúde?
“O metanol é extremamente tóxico, por isso qualquer consumo deve ser evitado”, adianta Thiago Carita Correra, do Instituto de Química da USP. O motivo é que a quantidade mínima pode variar de pessoa para pessoa e em qual tipo de bebida o metanol está inserido.
Uma garrafa de vinho tinto, exemplifica Correra, já estaria imprópria para consumo com em torno de 300mg por garrafa, o que seria entre seis a oito gotas mesmo esta sendo uma dose abaixo do que provavelmente causaria danos.
Em uma bebida com mais um teor mais alto de álcool etílico pode atrapalhar a metabolização do metanol, por competição. “É por isso que o álcool farmacêutico pode ser utilizado como tratamento”, explica.
O peso corporal da pessoa, seu metabolismo, estado de hidratação, o quanto de etanol que foi ingerido em conjunto são os fatores que interferem no quanto o metanol vai prejudicar a saúde, diz Marcus Gaz, cardiologista e gerente médico das unidades avançadas do Einstein Hospital Israelita.
“Menores quantidades levam a sintomas mais leves, mas ainda assim colocam em risco de perda de função como a visão e doses maiores levam a comprometimentos maiores e até risco de vida”, afirma.
Apesar de não existir um limiar seguro de ingestão, a literatura científica permite estabelecer faixas de doses do produto puro para diferentes graus de toxicidade, diz Jéssica Ramos, médica infectologista do Sírio-Libanês.
“Segundo a literatura, uma dose diária considerada tolerável de metanol para adultos é de até dois gramas, enquanto uma dose tóxica é estimada em cerca de oito gramas”, explica.
Considerando um grama de metanol equivalendo a 1,27 ml, 10 ml de metanol puro poderia ocasionar em sintomas mais brandos, enquanto uma dose mais próxima de 30 ml está associada à toxicidade grave, como o risco de cegueira e morte.
No entanto, a infectologista lembra que há pacientes que responderam de forma diferente à certas doses de metanol. “Isso sugere que a toxicidade depende não apenas da quantidade ingerida, mas também do contexto clínico e da presença de fatores protetores”, diz, complementando que qualquer exposição ao metanol deve ser considerada grave e manejada com urgência.
Um ponto importante, segundo Ramos, é que o efeito do metanol no organismo é fortemente influenciado pela presença do etanol na bebida. Assim como Correra, ela relata que ambas as substâncias competem no organismo, e a ingestão conjunta de ambas pode atrasar o início dos sintomas.
“Em casos de bebidas adulteradas contendo metanol e etanol, a toxicidade do metanol é reduzida temporariamente, mas não é eliminada; o risco persiste após a eliminação do etanol, quando o metabolismo do metanol é retomado”, diz.
Sem o etanol, o aparecimento dos sintomas seria entre seis a 24 horas e com o metanol passa para 72 a 96 horas. Os sintomas iniciais, nas primeiras 24 horas segundo Gaz, ocorrem no início da metabolização e envolvem dor abdominal, dores de cabeça muito fortes, letargia, desequilíbrio e alterações visuais, como visão turva.
O estado de São Paulo, epicentro da crise, informou nesta terça-feira (7) que há 18 casos confirmados, 176 notificações e 10 mortes, sendo três confirmadas e sete em investigação. O estado também descartou 38 casos que estavam sob investigação. O Ministério da Saúde não atualizou os dados nesta terça, mas deve divulgar os números atuais nesta quarta-feira (8).