SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “É como ver seu irmão sendo assassinado e esperar sua vez.” Ubai al-Aboudi é um cidadão palestino de Ramallah, na Cisjordânia, e falou à reportagem sobre o aumento de operações israelenses no território palestino ocupado, em paralelo à ofensiva na Faixa de Gaza, e o medo que ronda a população local.
Para Aboudi, a situação na Cisjordânia antes do 7 de Outubro já era “longe de ser perfeita”. Ele diz ser indispensável lembrar que os palestinos daquela região vivem sob uma ocupação militar israelense iniciada em 1967 marcada por constantes violações, prisões injustificadas, restrições de movimentação e impedimentos à atividade econômica plena.
Após o ataque terrorista do Hamas e o consequente início da ofensiva de Tel Aviv em Gaza, no entanto, o que ele classifica de regime colonial de apartheid “usou ainda mais esteroides para cometer genocídio”.
O que se seguiu, segundo Aboudi, não foi uma mudança no modo de agir do Exército israelense, mas um aumento drástico em seu volume de operações. “A ocupação israelense aumentou sua repressão quantitativamente, mas não qualitativamente. O qualitativo sempre esteve lá”, afirma, ao fazer referência à ocupação de terras da Cisjordânia por colonos de Israel.
A lógica vigente, diz Aboudi, somente se perpetuou ainda mais, com um sistema que “para os palestinos, é chamado de apartheid, já que os judeus israelenses têm todos os direitos e os palestinos, que não são judeus, não têm nenhum”.
A declaração de território da Cisjordânia como terras do Estado de Israel processo que, na prática, leva à ocupação posterior por colonos judeus cresceu de maneira inédita durante a ofensiva em Gaza.
Somente em 2024, Tel Aviv declarou 24 mil dunams medida equivalente a 1.000 m² da área palestina como tal. Ao somar os 23 anos anteriores, de 2000 a 2023, foram pouco mais de 23 mil dunams determinados da mesma maneira.
Para além das declarações formais, conta Aboudi, houve um agravamento na “repressão quantitativa” da vida diária. Segundo ele, em decorrência da instalação de centenas de postos de controle israelenses que o governo de Binyamin Netanyahu justifica pela necessidade de controlar a movimentação de supostos terroristas uma locomoção de cerca de 40 km, entre as cidades de Ramallah e Nablus, “às vezes dura 7 ou 8 horas, mesmo sendo possível fazê-la em 40 minutos”.
Não somente o cotidiano pessoal, mas também o trabalho de Aboudi, segundo ele, continua sendo dificultado com repetidos ataques digitais e operações das forças israelenses. O Centro Bisan para Pesquisa e Desenvolvimento, de onde ele é diretor, foi designado como terrorista por Israel em 2020, juntamente com outras cinco organizações palestinas de direitos humanos algo que as Nações Unidas declararam se tratar de afirmações “sem provas e arbitrárias”.
Em entrevista à Folha de S.Paulo em agosto deste ano, o porta-voz das forças israelenses Rafael Rozenszajn afirmou que não se trata de uma “questão de colonizar a Cisjordânia”, mas de “fazer operações militares que garantam a defesa do Estado de Israel”.
Mesmo expressamente contra a proposta de cessar-fogo de Donald Trump, que Aboudi diz ser “um plano para reposicionar a ocupação e reimaginar as ferramentas de genocídio e limpeza étnica”, o palestino acredita na esperança de seu povo e na ação da comunidade internacional para encerrar a guerra e encontrar um caminho de prosperidade sem a ocupação em seu território.
“Nós, palestinos, ensinamos a vida, ensinamos a esperança e ensinamos que o amanhã trará novas oportunidades”, afirma, “então, nos apegamos à esperança, sabemos que a mudança está chegando. Os povos do mundo estão unidos e pressionando seus governos a agir”.