SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Líder do mercado mundial de aviação civil, a fabricante europeia Airbus conseguiu mais uma vitória nesta terça-feira (7) contra sua arquirrival americana Boeing: os modelos da família A320 superaram o venerando 737 como o avião comercial mais vendido da história.

O feito foi contabilizado pela empresa de análise de mercado britânica Cirium, referência no setor. Um A320neo entregue para a linha aérea saudita Flynas foi o 12.260º avião da série que começou a voar em 1988.

No cômputo geral, modelos pequenos e militares lideram o ranking de aviões mais produzidos. O top 3 é composto pelo monomotor Cessna 172, com 44 mil unidades produzidas desde 1956, seguido pelo soviético Iliúchin-2 (36 mil) e o alemão Messerchmitt Bf-109 (35 mil), ambos da Segunda Guerra Mundial.

Até aqui, o Boeing 737 reinava, tendo começado a ser operado 20 anos antes do que seu rival. Nem europeus, nem americanos se pronunciaram ainda sobre a troca de guarda. Ambos os aparelhos são modelos de um corredor, o esteio das linhas aéreas mundo afora, com capacidades semelhantes no mercado em torno de 150 passageiros.

Ao ser anunciado como plano em 1981, o A320 causou ceticismo. O 737 dominava sozinho o mercado, tendo estabelecido uma nova forma para empresas lidarem com rotas de curto e média distância.

O programa europeu previa, entre outras coisas, que o avião seria controlado pelo sistema fly-by-wire, literalmente voar por cabos —no caso, elétricos, que transmitem os comandos dados por um joystick na cabine de comando às superfícies de controle aerodinâmico do aparelho.

A Boeing, por sua vez, só introduziu uma forma limitada do sistema na mais recente geração do 737, a Max, mas não de forma integral como os europeus. A iniciativa da Airbus gerou muita polêmica à época, com sindicato de pilotos se queixado de não ter mais os aviões “na mão”.

A avião foi um sucesso, salvando a empresa criada em 1969 como um consórcio franco-alemão, que depois recebeu aportes britânicos e espanhóis. Sob pressões políticas dos governos e das então empresas aéreas estatais, a Airbus surgiu no mercado de modelos maiores com o A300, em 1974, visando fazer frente aos americanos.

A opção quase foi redobrada na geração seguinte, mas a ideia de atacar o nicho do 737 prevaleceu, para sorte da empresa baseada em Blagnac (França).

O A320 derivou quatro modelos básicos: os reduzidos A318 e A319, o próprio A320 e o A321. Em 2016, uma nova geração, a neo, passou a voar, mas nela o sucesso é da versão de maior capacidade, o A321, que com de 180 a 244 passageiros tem sido testada em linhas transoceânicas.

A aposta deu certo: hoje 70% dos pedidos da família são do A321. Dominando a geração anterior, o A320 respondeu por cerca de 7.000 dos mais 12.200 aparelhos entregues até aqui. Ao todo, há hoje 7.128 encomedas dos modelos, ante 4.408 de 737.

Há 375 operadores da família A320 no mundo, sendo que o maior é a American Airlines, com 486 aviões. No Brasil e América Latina, a Latam opera 286 aviões do tipo e a Azul, 59. O 737 é o modelo básico da Gol, com cerca de 140 aparelhos.

A demanda maior hoje vem da Ásia, principalmente da China e da Índia, onde tanto os europeus quanto os americanos têm apostado suas fichas. O volume de tráfego aéreo disparou no continente, puxando a recuperação global depois do auge da pandemia de Covid-19, de 2020 a 2021.

Para a Boeing, esse foi apenas um dos itens de seu inferno astral, que começa a dar sinais de arrefecimento neste ano.

O principal envolveu justamente a engenharia do 737 Max. Diferentemente da Airbus, que desde o lançamento fez o A320 um aparelho com maior distância do solo para dar opções diferentes de motores para seus clientes, o Boeing refletia seu desenho dos anos 1960.

Para colocar motores maiores e mais eficientes, teve de alterar o a posição deles nas asas e, com isso, mudou o centro de gravidade da aeronave. Compensou isso com um sistema de correção automático, mas o funcionamento complexo e a falta de treinamento para os primeiros clientes resultou em tragédia.

Dois 737 Max caíram após a decolagem, matando 346 pessoas em 2018 e 2019. A frota do avião, então o best-seller mais rápido da história, foi colocada no chão por 20 meses, e o holofote sobre os processos produtivos da Boeing não parou de encontrar problemas.

Após idas e vindas e dois presidentes, a empresa procura manter o rumo de saída de crise. Donald Trump tem ajudado, embutindo vendas da Boeing em negociações tarifárias com diversos países e dando à empresa um contrato multibilionário para a produção do caça de sexta geração do país.

Enquanto isso, a Airbus segue na liderança global de entregas, tendo colocado no ar 766 aviões em 2024, ante 348 da Boeing. O duopólio em encomendas segue firme, com a brasileira Embraer vindo em terceiro lugar ainda dominando o mercado de aviões regionais, logo abaixo da classe do A320 e do 737, e com a ascensão de novos rivais como a chinesa Comac.