BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Edson Fachin, criticou a tentativa de interferência na economia e no Poder Judiciário brasileiro e, sem citar o presidente americano Donald Trump, chamou as investidas de “atentado à soberania”.

O comentário foi feito em edição especial do podcast do Supremo sobre o aniversário de 37 anos da Constituição Federal de 1988.

“Esse conceito legítimo de soberania significa que nenhum país, com qualquer argumento que seja, está legitimado a ferir a autodeterminação de outro país. E essa autodeterminação pode ser na área econômica, pode ser na sua dimensão política, pode ser uma expressão de sua institucionalidade”, disse Fachin.

Segundo o ministro, a autodeterminação dos povos é afetada quando um país tenta interferir em questões econômicas ou institucionais de outro.

“Quando um país se imiscui na ordem jurídica alheia querendo interferir no funcionamento do sistema judiciário deste país ou querendo provocar consequências econômicas que derivam de uma concepção hegemônica da preponderância, que uma economia forte deseja realizar sobre a economia um pouco mais débil, isto é induvidosamente um atentado à soberania portanto”, completou.

Para o ministro, o Brasil precisa reforçar sua identidade nacional na proteção de seus valores e “rejeitar qualquer tipo de interferência”.

A entrevista não tratava especificamente da atuação do governo dos Estados Unidos contra o Brasil, com a imposição de tarifas contra produtos brasileiros e de sanções contra autoridades brasileiras -com foco especial no ministro Alexandre de Moraes, do STF.

Os comentários do ministro foram feitos com base nos conceitos tratados na Constituição sobre as garantias individuais e sociais e a separação e equilíbrio entre os Poderes no contexto da globalização.

Fachin também defendeu que o Supremo não se submeteu à ditadura militar e que sua atual composição não aceitou posições autoritárias no cenário interno.

“O Supremo da contemporaneidade honra a melhor tradição daquele Supremo Tribunal Federal que não se vergou aos interesses autoritários de plantão, não se vergou ao contingente, mas se manteve fiel ao que é estrutural”, disse.

“Um juiz constitucional é, antes de tudo, fiel ao Estado de Direito numa república e numa democracia. Portanto, ele não subscreve o autoritarismo, ele não subscreve aquilo que atenta contra a vivência democrática.”

O ministro Edson Fachin tomou posse como presidente do STF na última segunda-feira (29), em sucessão ao ministro Luís Roberto Barroso. Ele está há dez anos no Supremo, indicado para a vaga pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Na entrevista, Fachin disse que a Constituição passou por mais de cem emendas, mas manteve seu foco na defesa da democracia. Relator dos processos da Lava Jato por anos, ele destacou que a carta magna foi central no combate à corrupção.

“Não precisa recordar as inúmeras turbulências que nesse período foram enfrentadas. Não só impedimentos de presidente da República, como um conjunto expressivo de escândalos de corrupção na administração pública. Nós tivemos um período vivo dinâmico e ao mesmo tempo muitas vezes rugoso e a Constituição [manteve] o seu núcleo central, que é a garantia do Estado de Direito Democrático e as cláusulas pétreas”, completou.

O ministro defendeu que a Constituição é suficiente para lidar com problemas modernos, como a nova dinâmica de trabalho. Ele citou o processo da “uberização”, no qual o Supremo discute se há vínculo de trabalho entre motoristas e os aplicativos.

“Ele representa a opção que a Constituição fez para assegurar a livre iniciativa, mas, ao mesmo tempo, assegurar a vida digna dos trabalhadores. Esse sopesamento está na Constituição. Por isso, entendo que é uma Constituição que andou com temperança também nesta matéria”, disse.