SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar está em queda nesta segunda-feira (6), com investidores repercutindo falas do presidente do BC (Banco Central), Gabriel Galípolo, em evento da Fundação Fernando Henrique Cardoso.

A paralisação do governo dos Estados Unidos segue impondo cautela sobre as movimentações, e o mercado ainda tem no radar a ligação entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Donald Trump.

Às 12h16, a moeda recuava 0,29%, a R$ 5,320, na contramão do exterior. Lá fora, a renúncia do novo primeiro-ministro da França e a possibilidade da eleição de uma premiê nacionalista no Japão têm aumentado a percepção de risco político e impulsionado a divida norte-americana em relação às de economias fortes.

Já a Bolsa recuava 0,35%, a 143.693 pontos.

Em evento que integra o ciclo “O Brasil na visão das lideranças públicas”, iniciado em 2024, Gabriel Galípolo afirmou que a dispersão da inflação tem recuado depois de atingir um nível “bastante elevado” em abril.

Esse processo, porém, tem se concentrado nos preços de bens, com a inflação de serviços seguindo em nível incompatível com a meta. O presidente do BC ainda destacou que as expectativas inflacionárias do mercado apontam para uma inflação acima da meta de 3% até 2028, segundo o Boletim Focus —um indicativo “bastante incômodo” para o BC.

No relatório divulgado nesta segunda, economistas ouvidos pelo BC esperam que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), indicador oficial da inflação do país, feche 2025 em 4,8%. Para 2026, a projeção é de 4,28%.

O centro da meta oficial para a inflação é de 3%, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos. Galípolo reiterou que o BC persegue os 3%, vislumbrando a manutenção da taxa Selic em um patamar restritivo por um período prolongado a fim de atingir o objetivo.

O Copom (Comitê de Política Monetária) decidiu por manter a Selic inalterada em 15% ao ano pela segunda vez consecutiva na última reunião, em setembro. A política monetária, de acordo com o colegiado, entrou em uma nova fase: agora, os dirigentes irão observar os efeitos acumulados dos juros altos sobre a economia, antevendo um período de manutenção do atual patamar por tempo indeterminado.

A perspectiva de juros altos por mais tempo favorece a renda fixa brasileira, ainda que o Ibovespa tenha batido sucessivos recordes nominais no mês de setembro. A injeção de ânimo na renda variável doméstica deriva da chegada de investidores estrangeiros aqui, depois que o Fed (Federal Reserve, o banco central dos Estados Unidos) cortou os juros pela primeira vez no ano, também na reunião de setembro.

A continuidade do ciclo de cortes, no entanto, depende da evolução da economia norte-americana. O mercado espera novas reduções até dezembro, mas a paralisação do governo limita a visibilidade dos agentes ao congelar a divulgação de novos dados. O relatório de emprego “payroll”, por exemplo, estava previsto para sexta-feira e foi adiado indefinidamente.

Sem os números oficias, o mercado se ampara em publicações laterais e em falas de autoridades. Na quarta, a ata da última reunião de política monetária do Fed será publicada, e investidores seguirão atento a pistas sobre os próximos da autoridade.

A agenda da semana é relativamente leve, na visão de Bruno Shahini, especialista em investimentos da Nomad. “Destaque para as expectativas de inflação do Fed de Nova York na terça-feira, a divulgação da ata do Fed na quarta e o índice de confiança do consumidor da Universidade de Michigan na sexta. Ao longo da semana, vários dirigentes do Fed discursam, entre eles [o presidente] Jerome Powell, podendo oferecer novas pistas sobre a trajetória da política monetária”, afirma.

O mercado ainda repercute a ligação entre os presidentes Lula e Donald Trump nesta manhã.

A conversa foi “positiva”, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que também participou da reunião.

“Uma nota vai sair daqui a pouquinho do Palácio [do Planalto] sobre o tema, dando os detalhes que foram pactuados”, afirmou.

No mês passado, ao discursar na Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, Trump disse que teve “bastante química” com Lula e que havia combinado de ter uma reunião com o brasileiro durante um rápido encontro nos bastidores do evento.

As falas de Trump seguiram a esteira de um aumento nas tensões entre Brasil e EUA. O presidente norte-americano anunciou tarifas comerciais de 50% sobre uma série de exportações e seu governo impôs sanções e revogou vistos de autoridades brasileiras, tendo a seara política como principal motivação. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, foi alvo da Lei Magnistiky por seu papel como relator nos processos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

“No momento, o mercado aguarda o resultado dessa ligação, que pode determinar o rumo da relação entre Brasil e EUA, o nosso segundo maior parceiro comercial. Isso pode afetar tanto o câmbio quanto os ativos em Bolsa que operam no exterior”, diz Dante Araújo, especialista da Valor Investimentos.

A isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000 por mês também segue no radar dos investidores. O projeto ainda precisa passar pelo Senado Federal antes de começar a valer em 2026, e a expectativa é que ele seja aprovado sem grandes intercorrências.

O projeto levantou temores de ingerência fiscal no ano passado, o que, entre outros fatores, levou o dólar ao recorde histórico de R$ 6,20. Mais do que a isenção em si, o mercado temia que o texto fosse desidratado na Câmara sem uma compensação para a perda de receita, desequilibrando as contas públicas e impondo dúvidas sobre a sustentabilidade da dívida do governo.

Mas, mesmo com a medida compensatória de taxação dos superricos, investidores seguem temerosos. Circulam pelas mesas de operação rumores de que o governo Lula estaria estudando a possibilidade de um programa federal para implementar tarifa zero em transporte coletivo de passageiros em todo o Brasil.

Há o receio de que iniciativas como essa possam se multiplicar com a proximidade do ano eleitoral, gerando mais gastos para o governo.

“Essa ideia tem causado certa preocupação entre investidores. A questão fiscal tem sido um tema sensível, ainda que mais no ano passado do que nesse, e rumores como esse aumentam a percepção de risco sobre os ativos brasileiros”, comenta Leonel Mattos, analista de inteligência de mercado da StoneX.

“Mas essa discussão sobre as tarifas zero parece ainda um pouco incipiente.”