PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) -Antes de completar um mês de governo, o primeiro-ministro Sébastien Lecornu pediu demissão na manhã desta segunda (6), agravando a crise política vivida pela França há mais de um ano. O pedido foi aceito pelo presidente Emmanuel Macron.
A renúncia aumenta a chance de uma dissolução do Parlamento e da convocação de novas eleições. A França teve cinco primeiros-ministros nos últimos dois anos: Élisabeth Borne, Gabriel Attal, Michel Barnier, François Bayrou e Lecornu.
Lecornu discursou no pátio do Hôtel de Matignon, residência e local de trabalho do premiê. “Não se pode ser primeiro-ministro quando as condições não são preenchidas”, afirmou. “É preciso sempre preferir seu país a seu partido.” Segundo o premiê demissionário, “os partidos políticos continuam a se comportar como se todos tivessem a maioria absoluta”.
Após o anúncio da queda de Lecornu, alguns líderes da oposição pediram a renúncia de Macron. “A contagem regressiva começou”, disse a deputada Mathilde Panot, líder do partido A França Insubmissa (LFI), considerado de ultraesquerda. Jordan Bardella, presidente do maior partido de ultradireita, Reunião Nacional, defendeu a dissolução da Assembleia Nacional, o equivalente francês da Câmara dos Deputados.
Lecornu havia sido nomeado por Macron no dia 9 de setembro, e no último domingo (5), depois de mais de três semanas de tratativas de bastidores, anunciou um ministério parecido com o de seu antecessor, Bayrou -de quem havia sido ministro da Defesa.
O ministério de Lecornu foi fortemente criticado pela oposição, tanto de ultraesquerda quanto de ultradireita. Até mesmo um dos integrantes do gabinete, Bruno Retailleau, reconduzido ao Ministério do Interior, responsável pela segurança pública, expressou publicamente o descontentamento de seu partido, os Republicanos, de direita.
Com ambições de chegar à Presidência, Retailleau acusou Lecornu de “esconder” o nome escolhido como novo ministro da Defesa, Bruno Le Maire. Ex-ministro da Economia durante os sete primeiros anos de Macron na Presidência (2017 a 2024), Le Maire não era a opção que agradava aos Republicanos.
A ameaça da perda de apoio da sigla direitista foi fatal para Lecornu, pois significaria que seu governo não sobreviveria a uma moção de censura.
Com apenas 27 dias, o governo Lecornu entra para a história como o mais curto da Quinta República, sistema de governo adotado pela Constituição francesa de 1958, um parlamentarismo com um papel forte do Executivo.
A origem da crise é a impopularidade de Macron, provocada por medidas como uma reforma que elevou de 62 para 64 anos a idade da aposentadoria. A dívida pública francesa é de 3,3 trilhões (cerca de R$ 20,8 trilhões), ou 114% do Produto Interno Bruto. Em parte, seu agravamento se deve à Covid-19: antes da pandemia, estava em 98% do PIB. O déficit público em 2024 foi de 5,8% do PIB.
Em seu segundo mandato, que vai até 2027, Macron não pode concorrer à reeleição. O presidente já disse mais de uma vez que pretende cumprir seu mandato até o fim.
Nas eleições para o Parlamento europeu, em junho do ano passado, o partido de Macron, o Renascimento, foi derrotado. O presidente agravou a situação ao convocar novas eleições para a Assembleia Nacional. O resultado foi um Parlamento rachado em três blocos -esquerda, centro-direita e ultradireita- sem que nenhum tivesse obtido maioria para governar.
Macron nomeou sucessivamente Barnier, Bayrou e Lecornu, mas nenhum dos três conseguiu formar uma maioria para aprovar leis. Barnier ficou três meses no poder; Bayrou, nove.
A bolsa de Paris abriu em queda de cerca de 2%, diante da notícia.