SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Itamaraty tem uma segunda visita marcada nesta segunda-feira (6) aos 13 brasileiros que participavam da flotilha Global Sumud, que tentava levar ajuda humanitária a Gaza, e foram presos por Israel. O grupo está na prisão de Ktzi’ot, no deserto de Negev, perto da fronteira com o Egito, e quatro membros da delegação estão em greve de fome.
Segundo membros da chancelaria ouvidos pela Folha, até a tarde deste domingo (5) não havia previsão de soltura dos brasileiros. Eles já passaram por uma primeira audiência. Membros do Itamaraty em Israel realizaram uma primeira visita aos brasileiros na sexta-feira (4), que durou mais de oito horas.
A assessoria da flotilha afirmou, em um comunicado divulgado neste domingo (5), que quatro membros da delegação brasileira estão em greve de fome: Thiago Ávila, João Aguiar, Ariadne Telles e Bruno Gilca. A organização também disse que os detidos estão privados de tratamento médico essencial e de medicamentos.
Ávila, ainda segundo o comunicado, anunciou na audiência com autoridades de Israel que não beberia nem água até que os ativistas presos conseguissem as medicações necessárias.
A flotilha era composta por 41 barcos e mais de 400 pessoas de diversas nacionalidades, dos quais ao menos 170 já foram deportados. Ativistas de outras nacionalidades que já saíram de Israel e tiveram seus processos de deportação concluídos denunciaram supostos maus-tratos dentro da prisão. Tel Aviv nega.
Segundo a organização Adalah, que oferece assistência jurídica aos presos, vários participantes relataram ter sido interrogados por pessoas não identificadas, e outros relataram maus-tratos e abusos por parte dos guardas.
Ainda de acordo com os relatos, houve casos de presos que foram vendados e algemados por longos períodos, e uma mulher relatou ter sido forçada a remover seu hijab (véu islâmico) e recebeu apenas uma camisa como substituição.
Mara Conte Takahashi, mãe da vereadora de Campinas Mariana Conti (PSOL), que participou da missão e está presa, defende que o presidente Lula (PT) se pronuncie publicamente sobre o episódio e peça agilidade no processo dos brasileiros.
“Ativistas de países europeus onde os presidentes se pronunciaram oficialmente já foram deportados e já retornaram à Europa. Então, eu peço ao presidente Lula que ele se pronuncie oficialmente”, diz ela à Folha.
O ativista Nicolas Calabrese também pediu que o governo brasileiro adote uma postura mais firme para libertar os integrantes da missão detidos por Tel Aviv. Ele chegou a Milão neste sábado (4). Ele vive no Brasil há mais de dez anos, mas nasceu na Argentina e tem cidadania italiana –por isso, sua passagem para a Turquia, a primeira parada após a saída da prisão, foi custeada pelo consulado da Itália em Israel, segundo a Adalah.
O ativista afirma que, nos três dias em que ficou detido, não pôde se comunicar com familiares e amigos, e que os agentes israelenses agiram com muita violência contra todo o grupo, inclusive apontando armas para os integrantes da missão. “Passamos mais de 20 horas sem alimentação durante a interceptação, e passamos uma humilhação muito grande quando chegamos ao porto.”
Calabrese conta que os membros da flotilha foram deixados no chão, sob o sol, enquanto a ativista Greta Thunberg foi isolada do grupo. Ele corrobora o relato dos ativistas Hazwani Helmi, 28, da Malásia, e Windfield Beaver, 43, dos Estados Unidos, dois dos 137 integrantes libertados no sábado, de que a sueca teria sido forçada a vestir uma bandeira israelense.
“A cada hora passavam fazendo piadas com ela. Os policiais colocaram a bandeira de Israel e tiraram fotos dela. Estavam o tempo inteiro provocando a Greta, mas todo mundo sofreu maus-tratos.”
Os membros da flotilha eram forçados a ficar com as cabeças abaixadas e voltadas para a parede, diz o ativista argentino-italiano, e eram agredidos sempre que saiam desta posição. “A cada vez que levantávamos a cabeça, eles abaixavam de forma violenta. Eles chutavam nossos tênis quando passavam andando entre uma pessoa e outra, e arrancaram nossas pulseiras e o meu colar.”
Israel negou todas as acusações. “As acusações da Adalah são mentiras completas. Todos os detidos tiveram acesso a água, comida, banheiros e advogados, e seus direitos foram respeitados”, disse um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores à agência de notícias Reuters.
A flotilha partiu de Barcelona, na Espanha, no dia 31 de agosto, com cerca de 45 embarcações e ativistas de mais de 45 países. Os barcos começaram a ser interceptados na quarta (1º).
Na primeira visita, membros do Itamaraty narraram à Folha que o governo de Binyamin Netanyahu ofereceu aos presos a possibilidade de assinar um documento que, segundo as autoridades israelenses, facilitaria o processo de deportação, e 8 dos 13 brasileiros teriam se recusado a assinar.