SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O MPF (Ministério Público Federal) afirma que o sistema de saúde de Belém está despreparado para atender ao aumento da demanda nas semanas da COP30, a conferência climática das Nações Unidas a ser realizada em novembro. A Procuradoria alerta para o risco de um colapso generalizado em prontos-socorros e hospitais da cidade.

Em nota enviada nesta quinta-feira (2) a órgãos municipais, federais e estaduais, o MPF recomendou a criação de um hospital de campanha durante a cúpula.

A Secretaria Estadual de Saúde do Pará disse ao Ministério Público que havia solicitado a instalação, mas voltou atrás na decisão. “O estado possui uma ampla rede assistencial preparada para o atendimento no período do evento”, afirmou a pasta à Procuradoria.

O Ministério Público classificou como inconstitucional a possibilidade de que participantes da cúpula entrem em uma fila de espera separada no SUS, algo que a Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) de Belém teria cogitado.

“A Sesma informou, em reunião com o MPF, no dia 27 de agosto de 2025, que haverá ‘regulação específica para COP’, ou seja, uma regulação para o cidadão que não participa da COP e outra regulação para o participante da COP. Isso implica que o gringo participante da COP entrará em uma fila de espera de leito, enquanto a empregada doméstica residente no Tapanã [bairro da periferia da capital] se submeterá a outra fila”, diz o documento.

Segundo o MPF, a Secretaria de Saúde do Pará afirmou que a diferença seria “em nível de sistema” e negou a possibilidade de diferença no tratamento, mas não houve detalhamento de como isso funcionaria na prática.

A Folha de S.Paulo procurou a Secretaria Extraordinária para a COP30, vinculada à Casa Civil da Presidência, e os demais órgãos mencionados. Não houve retorno até a publicação da reportagem.

O Ministério Público recomenda a ampliação no número de leitos, a contratação temporária de médicos e enfermeiros, o fortalecimento de equipes de socorro (incluindo em embarcações) e a mobilização da Força Nacional do Sistema Único de Saúde em Belém.

O comunicado também lista condições precárias identificadas em UPAs (unidades de pronto atendimento) e hospitais de Belém conforme um relatório de fiscalização do Conselho Regional de Medicina entregue neste ano ao Ministério da Saúde.

O Pronto Socorro Mário Pinotti, administrado pela Prefeitura e reconhecido como a principal unidade de emergência da região Norte, sofre com falta de insumos básicos, como gaze, algodão, luvas, antibióticos e outros medicamentos essenciais, de acordo com o relatório.

Ainda segundo a fiscalização, a UPA Dasac Sacramenta trata pacientes com tuberculose e doenças pulmonares sem isolamento adequado, tem recepção lotada e sofre com escassez de anti-inflamatórios, analgésicos e corticoides.

A UPA Icoaraci se encontra com mobiliário e equipamentos sucateados e enferrujados, passa por falta de medicamentos e materiais para os procedimentos e não apresenta disponibilidade para transferência imediata com ambulância, conforme o CRM.

A reportagem procurou os três estabelecimentos por telefone, mas não houve retorno.

“Salta aos olhos que, ao contrário do divulgado, a saúde de Belém, notadamente de urgência e emergência, não se preparou para a COP30. Se esta é a realidade cotidiana dos moradores, imagine-se com a chegada de mais de 50 mil pessoas”, afirma o MPF, citando o público esperado para o evento.

Não há informações sobre cobrança ou penalidade por parte do governo municipal à empresa que administra as duas UPAs citadas. Segundo a nota enviada aos órgãos, a Prefeitura de Belém recebeu R$ 292 milhões em recursos federais para média e alta complexidade até julho de 2025.

O Ministério Público diz que nenhum real do orçamento da cúpula, calculado em cerca de R$ 4,7 bilhões, foi destinado à saúde pública.

“A COP30, diante da quantidade bilionária de recursos públicos, é ou era a oportunidade de ouro para significativo aumento do número de leitos clínicos e de UTI, o que seria um legado da COP na saúde. Ou seja, União, estado e município não fizeram seu dever de casa de ao menos regularizar à suficiência o número de leitos para a população paraense”, critica a Procuradoria.