BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPESS) – A Câmara Municipal de Belo Horizonte deve apreciar nesta sexta-feira (3) um projeto que prevê tarifa zero para todos os passageiros de ônibus municipais.
A proposta reuniu a assinatura de 22 dos 41 vereadores e precisa de 28 votos para aprovação. O texto, porém, encontra resistências do prefeito Álvaro Damião (União Brasil) e de setores do comércio e da indústria da capital mineira.
De autoria da vereadora Iza Lourença (PSOL), o projeto prevê a isenção da tarifa para todos os passageiros da capital mineira em até quatro anos.
O custo estimado pelos autores do projeto é de R$ 2,16 bilhões por ano e prevê o financiamento do programa por uma taxa a ser paga por empregadores públicos e privados do município.
Hoje, o sistema tem um custo de cerca de R$ 1,8 bilhão e é custeado pelas tarifas pagas por usuários -incluindo o vale-transporte- e os subsídios pagos pela prefeitura, que têm crescido a cada ano.
Em 2024, a gestão municipal destinou R$ 713 milhões às empresas prestadoras do serviço para financiar o sistema de transporte municipal. Neste ano, o preço da passagem é de R$ 5,75 para as linhas convencionais.
O modelo atual já prevê isenções para algumas modalidades, como nas linhas que circulam nas vilas e favelas, para mulheres vítimas de violência, usuários do serviço de saúde e estudantes do ensino médio na rede pública.
A ideia dos autores da proposta é financiar a tarifa zero para todos com a TTP (taxa do transporte público), prevista para substituir o vale-transporte.
Empregadores que possuam dez ou mais funcionários pagariam uma taxa de R$ 185 sobre cada empregado para financiar o sistema.
Isso incluiria entidades públicas, como universidades e órgãos de governo, e empresas que hoje não arcam com o vale-transporte para o funcionário que não usa ônibus.
O último fator é o que concentra as críticas daqueles que se opõem ao sistema.
A Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) produziu um estudo em que afirma que a tarifa zero poderia até dobrar a demanda no transporte em relação à atual, o que também aumentaria seu custo na mesma proporção.
Nos cálculos da entidade, isso levaria a uma queda de faturamento de até R$ 3,1 bilhões das empresas e a um corte de 55 mil empregos formais.
Roberto Andres, professor de arquitetura da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e um dos autores e apoiadores do projeto de tarifa zero, discorda das premissas do estudo da Fiemg.
“Você pega cidades [com tarifa zero] que triplicaram a demanda, como São Caetano do Sul, e o custo aumentou 40%. Estou falando de uma coisa empírica, não é opinião”, disse.
Hoje, a maior cidade do país com a política de tarifa zero é Caucaia (CE), com 355 mil habitantes, que adota a modalidade desde 2021.
Andres justifica sua conclusão com base na ocupação de linhas que hoje estão com capacidade ociosa, além do fim de serviços -de bilhetagem, por exemplo- que não seriam mais necessários com a tarifa zero.
Ele e outros pesquisadores emitiram uma nota para rebater as conclusões da Fiemg.
Eles afirmam que a entidade não considerou nos cálculos o gasto que as empresas têm com vale-transporte, que varia de R$ 300 a R$ 400 por cada funcionário, e que o dinheiro não gasto pela população na passagem seria revertido em consumo.
Além da Fiemg, a CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas) da capital também rejeita a proposta.
A entidade, que reúne cerca de 13 mil empresas do setor de comércio e serviços na cidade, enviou aos vereadores uma nota na qual recomenda a rejeição do projeto e afirma que o debate demanda “análise mais aprofundada e precisa ser amadurecido”.
Na tentativa de reduzir as críticas em torno da proposta, a vereadora Iza Lourença planeja apresentar um substitutivo que isenta as empresas da capital de pagarem a TTP para os funcionários que moram na região metropolitana –e continuariam precisando do vale-transporte.
Para viabilizar essa queda de arrecadação, os autores do projeto estimam que a prefeitura precisaria manter um subsídio de R$ 400 milhões.
O prefeito da capital tem reforçado sua opinião contrária ao projeto e acionou sua base na Câmara para rejeitá-lo.
A Folha de S.Paulo apurou que há vereadores que assinaram a proposta inicial, mas que avisaram aliados da prefeitura de que devem mudar de posição.
Em declarações recentes, Damião afirmou que a obrigação de uma nova taxa faria com que as empresas mudassem seu domicílio fiscal para as cidades da região metropolitana.
Os defensores do projeto argumentam que a contribuição das empresas no município para a TTP seria, em média, de 1,65% da folha salarial.
Eles também afirmam que há outras entidades favoráveis ao projeto, como a Abrasel (associação de bares e restaurantes), e apostam na pressão da população junto aos vereadores para alcançar os 28 votos necessários para a aprovação da proposta.
Tema sensível à população belo-horizontina, o transporte público de BH acumula reclamações entre os usuários e foi um dos principais assuntos das eleições municipais do último ano.
A nova gestão será responsável por renovar o atual contrato do serviço, que foi celebrado em 2008, com validade de 20 anos.