PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Porto Alegre se tornou a primeira capital do Brasil a adotar cotas para pessoas transgênero em concursos públicos e processos seletivos de estágio municipais. A lei que reserva 1% das vagas para concursos e processos seletivos de estágio foi promulgada em um ato realizado na Câmara de Vereadores nesta quarta-feira (1).

A proposta, de autoria da vereadora Natasha Ferreira (PT), foi aprovada em plenário no dia 6 de agosto. O texto foi encaminhado ao prefeito Sebastião Melo (MDB), que optou por não sancioná-lo. Com isso, o projeto retornou ao Legislativo para promulgação automática.

A lei prevê a criação de comissões de heteroidentificação para validar a declaração de identidade de gênero antes da posse. Se as vagas reservadas não forem preenchidas, elas serão redistribuídas entre os demais candidatos aprovados.

Segundo Natasha, a escolha por uma banca de heteroidentificação composta por pessoas trans e travestis, além de representantes do governo e da organização dos concursos, é uma forma de evitar fraudes nas autodeclarações.

Essas bancas devem incluir informações que tragam um histórico de transgeneridade. “Se é início de transição, se é meio de transição, se tu fez uma opção de intervenções no corpo, se tu faz a hormonização ou não… Tem uma série de avaliações muito minuciosas que são feitas.”

“Nós sabemos que a questão étnica já abre brecha muitas vezes para uma divisão ou para questionamentos, inclusive de pessoas negras de pele clara, entendendo que o Brasil é um país extremamente miscigenado”, diz Natasha.

“No caso de pessoas trans, não é somente o que nós imaginamos no popular. Não é a pessoa que tem silicone, tem um corpão e cabelão. Pessoas trans hoje estão em um espectro mais amplo.”

Ainda assim, destaca a vereadora, a lei exige que postulantes ao cargo tenha uma boa pontuação. “Tem que fazer prova, tem que enfrentar a banca e tem que ter a média. A cota, na verdade, é para dizer assim: nós vamos garantir que pessoas trans entrem por esta média dentro deste espaço.”

O projeto original previa a reserva de 5% das vagas, mas a proporção foi reduzida durante a negociação devido à falta de dados sobre a população trans que pudesse preencher essa cota. Outro ajuste feito na proposta retirou a aplicação da cota para cargos comissionados.

O primeiro concurso sob vigência da nova lei está previsto para dezembro, com vagas na Secretaria de Habitação. Na próxima semana, uma reunião na Secretaria de Planejamento deve discutir a regulamentação da lei, incluindo pontos como a quantidade mínima de vagas necessária para que a reserva seja aplicada.

Natasha disse que a vigência de um decreto estadual implementado pelo governo Eduardo Leite (PSD) em 2021 que garante cotas trans em concursos sensibilizou partidos de centro e centro-direita.

Outra aproximação com a prefeitura ocorreu após uma reunião de movimentos sociais com a primeira-dama de Porto Alegre, Valéria Leopoldino, simpática à causa LGBTI+. De acordo com a vereadora, Melo havia sinalizado que silenciaria sobre o projeto.

“Acho que ele (Melo), a primeira-dama e o secretariado estão conscientes que a nossa luta é mais de uma política de ajuda do que propriamente de demarcação ideológica e desgaste.”

A medida foi aprovada por 17 votos, com 11 contrários. A Câmara tem 35 vereadores.