SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Senac Santo Amaro recebe até fevereiro de 2026 a exposição “Antônio Gaudério: Memória em Imagens”. A mostra apresenta mais de 30 fotografias do acervo do premiado fotógrafo gaúcho de 66 anos, que marcou o fotojornalismo brasileiro nas décadas de 1980 a 2000, quando integrava a equipe da Folha.
As imagens estão expostas em cavaletes duplos e nas paredes da biblioteca. Algumas obras foram impressas em tecido e estão colocadas no teto da entrada do ambiente. As demais obras foram feitas em papel museológico e aparecem com molduras e proteção em vidro.
O processo de seleção das fotografias tem uma particularidade. Em 2008, Gaudério sofreu um acidente doméstico que resultou em perda da memória. Desde então, passou a revisitar o próprio trabalho como espectador, sem a lembrança direta dos momentos em que cada registro foi feito.
Essa condição levou a um exercício de curadoria a partir de um olhar distanciado. Para a atual exposição, ele escolheu imagens que chamavam atenção em diálogo com o também fotojornalista Jorge Araujo, que participou da curadoria. O conjunto reúne obras que estão em acervos institucionais do Masp e Instituto Moreira Salles, além de fotografias premiadas e registros inéditos.
Entre as grandes fotografias está “Nau à Deriva”, na qual banhistas brincam na âncora de um navio atracado e abandonado na baía de Guanabara, em 2001. A imagem recebeu o Prêmio CNT de Jornalismo no mesmo ano e o 3º Prêmio Federação das Indústrias do Rio de Janeiro de Jornalismo Econômico, em 2002.
Outra foto presente é “Jesus Cristo de Braços Abertos”, feita em João Pessoa, em 2000. A imagem mostra um menino defendendo um chute a gol com um outdoor de Jesus ao fundo, que parecia ajudar o garoto nas defesas.
Durante a curadoria da exposição, foi encontrada uma foto inédita em negativo guardado em uma gaveta na casa da família, conta Ana Aurora Borges, filha de Gaudério e gestora de arte. A imagem mostra um homem segurando um espelho e aparece pela primeira vez na exposição.
Ainda sem título, a fotografia pôde ser identificada graças a seguidores nas redes sociais de Ana Aurora, que viram no reflexo a Igreja de Santa Rita, em Paraty. Esse tipo de redescoberta acompanha a trajetória recente de Gaudério, cujo trabalho passou anos afastado do público até que a filha decidiu organizar o acervo e compartilhar parte dele em plataformas digitais.
“O trabalho dele sempre teve um lado de denúncia muito forte. A partir disso, comecei a revisitar os arquivos e coloquei nas redes sociais. As publicações fizeram sucesso e surgiu a ideia de expor”, diz.
As imagens expostas no Senac tratam de pautas sociais que permanecem atuais, como exploração de trabalho infantil, falta de saneamento básico, desigualdade e direitos humanos.
Além da mostra, a programação inclui visitas guiadas (23/10, às 9h e 19/2/26, às 19h30) e bate-papo com mediação de professores do Senac (13/11, às 19h30), todos gratuitos e abertos ao público. As atividades discutem o papel da fotografia documental e a importância da preservação de arquivos fotográficos.
Nascido em Ijuí (RS) em 1958, Gaudério começou a trabalhar na Folha de S.Paulo em 1989. Recebeu distinções como o Grande Prêmio Folha, o Vladimir Herzog e o Prêmio Ayrton Senna de Fotografia. Entre os livros que lançou está “Viagem ao País do Futebol” (ed. DBA), em parceria com o jornalista Mario Magalhães.
A vida do fotógrafo vai ser retratada em um documentário chamado “Gaudério – A Estética da Indignação”. É um projeto do documentarista Chico Gomes e da produtora Modernista, apoiado pela Folha.