BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Não há nenhuma boa notícia no relatório anual Estado dos Oceanos da União Europeia. A nona edição do documento, patrocinado pelo serviço Copernicus de monitoramento ambiental, constata que uma tripla crise ambiental já afeta todos os oceanos do mundo. Mudança climática, perda de biodiversidade e poluição agora atingem, sem grande surpresa, proporções planetárias.
A lista de más notícias é extensa:
– Os oceanos estão ficando mais quentes e de maneira acelerada;
– Ondas de calor marinha bateram recordes em 2023 e 2024;
– O aumento do nível do mar também está mais rápido, ameaçando paisagens preservadas e populações;
– Ecossistemas são afetados pela temperatura marinha e acidificação;
– Espécies invasoras prejudicam a indústria da pesca;
– A poluição de plásticos e microplásticos é global;
– As massas de gelo diminuem nos dois polos.
“O relatório deixa claro que estamos nos aproximando dos limites do planeta”, afirma Pierre Bahurel, diretor do Mercator Ocean International, instituição responsável pelo braço oceanográfico do Copernicus, que agrega 120 especialistas em vida marinha em Toulouse, na França.
Oceanos absorvem 90% do calor gerado pela atividade humana, sobretudo pela queima de combustíveis fósseis. Desde os anos 1960, esse papel regulador vem sendo afetado também pelo próprio aquecimento dos mares. Em 2024, a temperatura global da superfície dos oceanos atingiu 21°C, na primavera europeia, um novo recorde.
Ondas de calor marinhas igualmente alcançaram novos picos em 2023 e 2024, 0,25°C acima da marca anterior, verificada em 2015 e 2016. O Atlântico experimentou condições de onda de calor durante 300 dos 365 dias de 2023.
E por que os oceanos estão aquecendo tanto? “Os oceanos estão aquecendo porque hoje, devido às emissões de gases de efeito estufa, a Terra está fora do equilíbrio energético: menos energia está saindo do sistema em comparação com o que ele está recebendo do Sol”, explica Karina von Schuckmann, coordenadora do relatório.
“Como consequência, o calor se acumula no sistema climático e é absorvido pela atmosfera e pelos oceanos, aquecendo os polos e também os continentes.”
Outro sintoma bem conhecido do aquecimento global também só piora. A elevação do nível do mar já ameaça regiões que abrigam 200 milhões de pessoas na Europa. O nível do mar subiu 228 milímetros de 1901 a 2024.
O estudo confirma as conclusões do relatório do Instituto Potsdam de Pesquisa do Impacto Climático (PIK, na sigla em alemão), publicado na semana passada, em conjunto com a associação Planetary Guardians. A acidificação dos oceanos ameaça a vida marinha e, por efeito dominó, toda a cadeia alimentar.
“Observamos que os corais criticamente ameaçados enfrentam pressões combinadas de rápido aquecimento, acidificação e poluição por plásticos. A perda de biodiversidade já ameaça espécies icônicas como o atum, cada vez mais vulneráveis, e criando um risco cada vez maior para as cadeias alimentares marinhas e a nutrição humana”, diz Schuckmann.
O relatório traz outro efeito deletério do aquecimento dos mares, a proliferação de espécies invasoras, com um tipo de siri que chegou a inviabilizar a pesca na foz do rio Pó, próximo à Veneza, no primeiro semestre deste ano. Na Sicília, o problema foi com o chamado verme de fogo, que se instala como praga em corais e prejudica a pesca artesanal.
Os plásticos já são encontrados em todas as bacias oceânicas no mesmo ano em que dois encontros organizados pelas Nações Unidas não alcançaram consenso sobre a produção desenfreada do produto. EUA, Arábia Saudita, Rússia e outros grandes produtores de petróleo se recusam a impor limites ao setor.
Finalmente, o Ártico registrou quatro mínimas históricas de área de dezembro de 2024 a março deste ano, quando constatou-se 1,94 milhão de km² a menos de gelo marinho do que a média de longo prazo no inverno (área maior do que seis Polônias).
Na Antártida, o documento da União Europeia destaca o terceiro ano consecutivo de baixa extensão do gelo marinho em 2024, após o recorde negativo de 2023. Em fevereiro deste ano, havia 1,6 milhão de km² a menos de gelo marinho do que a média de longo prazo (área quase três vezes maior do que a França).
“A ciência é inequívoca: o oceano está mudando rapidamente, com extremos e impactos crescentes. Sabemos as razões e o que isso significa. Não é apenas um alerta, mas um plano para restaurar o equilíbrio entre as pessoas e o oceano”, afirma a especialista.