BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O novo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Edson Fachin, defendeu em seu discurso de posse no cargo contenção e independência no Judiciário, pregou o diálogo com outros Poderes e demonstrou apoio ao colega Alexandre de Moraes, relator de casos que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados.
“A independência judicial não é um privilégio, e sim uma condição republicana. Um Judiciário submisso, seja a quem for, mesmo que seja ao populismo, perde sua credibilidade. A prestação jurisdicional não é espetáculo. Exige contenção”, disse Fachin nesta segunda-feira (29).
O ministro assume o comando da corte no momento em que ministros, como Moraes, são alvos de sanções do governo Donald Trump, nos Estados Unidos, por causa do julgamento de Bolsonaro e em meio a tensões com o Congresso em razão de ações envolvendo emendas parlamentares, entre outros temas.
Em seu discurso, ele defendeu a separação entre o Judiciário e o mundo político.
“Nosso compromisso é com a Constituição. Repito: ao direito, o que é do direito. À política, o que é da política”, disse o ministro.
“A separação dos Poderes não autoriza nenhum deles a atuar segundo objetivos que se distanciem do bem comum”, acrescentou.
Fachin também prometeu uma gestão austera no uso dos recursos públicos pelo Judiciário. O Poder tem sido alvo de críticas nos últimos anos pela profusão de penduricalhos usados para turbinar o salário de juízes.
Ao longo de seu mandato, Barroso fez uma série de manifestações contrárias às críticas aos gastos da Justiça.
O novo presidente do STF também falou sobre o combate à corrupção no Brasil. Ao assumir a presidência, o ministro deixou a relatoria dos casos da Operação Lava Jato, que ficou sob sua responsabilidade a partir de 2017, após a morte do ministro Teori Zavascki em acidente aéreo.
Sem mencionar a Lava Jato diretamente, Fachin disse que o combate à corrupção “deve ser firme, constante e institucional”.
“O Judiciário não deve cruzar os braços diante da improbidade. Como fiz em todas as investigações que passaram pelo meu gabinete, os procedimentos foram dentro das normas legais, em atenção ao devido processo, à ampla defesa e ao contraditório.”
Na primeira manifestação como presidente do STF, Fachin também fez defesa das minorias. O ministro é conhecido pela sua atuação voltada a esses públicos no Supremo.
“Às comunidades indígenas são endereçadas as proteções constitucionais e seus direitos originários às terras tradicionais. E no âmbito e limite de nossas atribuições, estaremos atentos aos correlatos deveres de um tribunal constitucional nesse tema, a fim de que a Constituição seja efetivada para assegurar esse direito que compreende respeito integral às suas culturas, línguas, crenças e formas próprias de organização.”
O magistrado fez menções ao que classificou como “drama da justiça criminal” e citou o sistema carcerário brasileiro, marcado por superlotações e precariedades.
Ele citou que os negros são atingidos pela desigualdade no Brasil.
“A confiabilidade da promessa de um futuro melhor depende também que ele seja possível. Precisamos estar atentos para entender como diferentes formas de desigualdade e discriminação não atuam isoladamente, mas se cruzam e se reforçam mutuamente na vida das pessoas. Para o enorme número de pessoas negras neste país, essa, no entanto, é sequer uma possibilidade.”
Ao defender a igualdade de gênero, momento em que foi aplaudido pelos presentes, Fachin disse “as mulheres conhecem bem as dificuldades que uma sociedade ainda carimbada pela desigualdade de gênero lhes impõe”.
“Por isso mesmo, temos um encontro marcado com esse âmbito da igualdade e o Judiciário não se furtará a este dever”, afirmou Fachin no plenário do STF, que possui apenas uma ministra, Cármen Lúcia, dentre os 11 que compõem o colegiado.
DEFESA DE ALEXANDRE DE MORAES
O ministro tomou posse, na tarde desta segunda-feira (29), como presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e defendeu a atuação de Alexandre de Moraes, principal alvo de críticas do bolsonarismo na corte em razão de sua atuação nos casos que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro. Fachin sucedeu Luís Roberto Barroso no cargo.
Após o início da sessão, o novo presidente do STF fez o jura mento de posse. A cerimônia acontece no plenário do Supremo e conta com a presença de autoridades dos três Poderes.
No início do discurso, Fachin elogiou Moraes. “Sua Excelência (Alexandre de Moraes), como integrante deste tribunal, merece nossa saudação e nossa solidariedade, e sempre a receberá, como assim o faremos em desagravo a cada membro deste colegiado, a cada juiz ou juíza deste país, em defesa justa do exercício autônomo e independente da magistratura.”
O ministro reforçou a necessidade de colegialidade no STF e defendeu previsibilidade nas relações jurídicas. “Realçando a colegialidade, aqui venho a fim de fomentar estabilidade institucional. O país precisa de previsibilidade nas relações jurídicas e confiança entre os Poderes. O Tribunal tem o dever de garantir a ordem constitucional com equilíbrio.”
Fachin fica na presidência do Supremo até setembro de 2027. O novo vice-presidente é o ministro Alexandre de Moraes, reeditando a dobradinha do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de 2022.
A posse de Fachin tem a presença de autoridades como os presidentes da República, Lula (PT), da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), além de governadores, ministros de outras cortes superiores, ministros do governo e do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Beto Simonetti.
Também estão presentes o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Beto Simonetti.
Gaúcho de Rondinha (RS), Edson Fachin cursou direito na UFPR (Universidade Federal do Paraná), onde também é professor titular de direito civil. Ele também fez carreira no estado, como advogado nas áreas de direito civil, agrário e imobiliário e procurador do Estado.
Fachin foi indicado ao Supremo por Dilma Rousseff (PT) em abril de 2015, para a vaga deixada por Joaquim Barbosa um ano antes.
O ministro tem indicado como uma das prioridades no Supremo a distensão das relações políticas em torno da corte, além do arrefecimento aos questionamentos sobre a atuação do tribunal.
A ideia da autocontenção do Judiciário tem sido um mantra repetido pelo ministro nos últimos meses, quando a corte esteve em embates com o Congresso Nacional, setores da advocacia e aliados de Jair Bolsonaro (PL) em meio ao julgamento da trama golpista.
O estilo discreto de Fachin é semelhante ao de Rosa Weber, que presidiu o tribunal por pouco mais de um ano, entre 2022 e 2023. O ministro não tem o hábito de conversar com jornalistas, concede poucas entrevistas à imprensa e costuma preferir manifestações nos autos processuais.
Um exemplo da discrição de Fachin é a recusa das ofertas de associações do meio jurídico para bancar uma festa em homenagem à posse dele, na noite de segunda. Avesso a extravagâncias, ele decidiu servir apenas água e café na solenidade.
Fachin decidiu deixar a relatoria de mais de cem processos ligados à Operação Lava Jato ao assumir a presidência do STF. Ele assumiu a relatoria dos casos em fevereiro de 2017, por sorteio, após o responsável pela Lava Jato no Supremo, ministro Teori Zavascki, morrer em um acidente aéreo.
A chegada ao principal cargo do Judiciário marca o fim de uma trajetória de oito anos de Fachin à frente da principal investigação que mirou políticos e empresários. A operação acabou enterrada, sob o argumento da existência de vícios processuais e de nulidade de colaborações premiadas.
Aprovado por 52 votos a 27 pelo Senado em 2015, Fachin foi o último nome de Dilma para o STF. Em tese, ela teria mais duas indicações, mas a aprovação da PEC da Bengala no Congresso postergou as aposentadorias de Marco Aurélio Mello e de Celso de Mello por cinco anos.
Fachin começou a estruturar seus planos para a presidência há alguns meses, organizando equipe, dinâmica de trabalho e a lista dos processos que pretende levar consigo. O catálogo de processos que Fachin decidiu manter sob seu comando mostra as prioridades do ministro para o novo ciclo.
O novo presidente terá em seu gabinete processos ligados à pauta trabalhista. O principal deles é o recurso especial sobre a “uberização”, que discute se há relação empregatícia entre os motoristas e os aplicativos.