RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Uma empresa credenciada pela Loterj, autarquia do governo Cláudio Castro (PL), para operar máquinas de apostas em estabelecimentos comerciais do Rio de Janeiro tem no quadro de sócios e administradores de dois familiares de bicheiros.
A Too All Games Operações Lotéricas, que afirma possuir capital social de R$ 7 milhões, tem no quadro societário Fernando Andrade de Lima Souto, sobrinho de Castor de Andrade, bicheiro morto em 1997, e Ailton Guimarães Jorge Junior, filho de Ailton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães. O dado consta na Redesim (Rede Nacional para a Simplificação de Registro e da Legalização de Empresas e Negócios).
Fernando e Ailton aparecem como sócios através de suas empresas, F. Souto Participações e GC Invest Participações.
Advogados cadastrados como representantes de ambos foram procurados pela reportagem, mas não responderam. A Folha de S.Paulo também pediu posicionamento para a To All Games através de mensagens e telefonemas aos sócios, mas não houve retorno.
O Ministério Público apontou em um processo em 2006 que Fernando mantinha sociedade com Castor e um primo na exploração de jogo do bicho e videopoker em Angra dos Reis, Mangaratiba e Paraty. À época, ele negou as acusações.
Já Ailton é mencionado em processos da Justiça Federal de 2006 sobre bingos clandestinos. Um caderno de anotações apreendido durante operação policial indicaria divisão dos lucros entre ele, o pai e os primos.
Ele também é citado em conversas de supostos operadores de esquema de propina e policiais. Ailton ocupou o cargo simbólico de prefeito da Cidade do Samba em 2006 e 2007, época em que seu pai, Capitão Guimarães, foi presidente da Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba).
Nenhum deles possui processos criminais em aberto atualmente.
Castro assinou em agosto um decreto que autoriza e regula a exploração dos chamados VLTs (Video Lottery Terminals), totens eletrônicos de apostas que poderão ser instalado em bares temáticos. O decreto também prevê a instalação dos equipamentos em estabelecimentos lotéricos. O pagamento será por meio de Pix.
“O credenciamento [das empresas] envolve análise jurídica e documental, avaliação técnica e de compliance, homologação dos equipamentos e assinatura do contrato”, afirmou em nota a Loterj.
“A fiscalização é contínua, com monitoramento diário e auditorias, assegurando que os recursos sejam corretamente destinados principalmente a projetos sociais”, afirmou ainda a autarquia.
A Loterj não respondeu quantas e quais empresas estão credenciadas para operar VLTs.
VLTs e máquinas de caça-níquel usam algoritmos de combinações aleatórias. A estrutura física, com telas, botões coloridos e ilustrações chamativas, como fantasmas, bolas de futebol e frutas, são semelhantes.
No caso dos VLTs, o gerador de número aleatório é passível de acompanhamento em tempo real. Segundo a Loterj, os equipamentos serão integrados a um sistema central.
A To All Games pediu no último dia 5 uma autorização para instalar e operar 105 máquinas no Jockey Club Brasileiro, na Gávea. O espaço tem 366 metros quadrados, com um salão de apostas, com áreas de bar e cozinha, e um segundo salão reservado para clientes VIP.
A intermediação com a gestão Castro é feita através de Pedro Vianna da Silva, representante legal da empresa. Os nomes de Ailton e Fernando não aparecem nos contratos anexados junto ao sistema do governo estadual. Pedro foi procurado por telefonema e mensagem, mas não respondeu.
A To All Games foi aberta em julho de 2024 e se credenciou dois meses depois no edital da Loterj que permitia exploração de apostas via aparelho celular, VLT e totens. A GC Invest foi aberta em setembro de 2024 e a F. Souto em novembro do mesmo ano.
No plano de negócios apresentado ao governo no dia 5, a To All Games prevê 630 mil apostadores potenciais em 28 municípios do estado. A empresa propõe a instalação de 9.000 terminais VLT e 91 salas de jogos, com investimento de R$ 108,9 milhões.
A estimativa da empresa é acumular R$ 715,69 milhões em cinco anos. Os totens VLT representariam 44,11% das receitas estimadas.
O prefeito Eduardo Paes (PSD) foi contra o decreto de Castro e afirmou que vai suspender alvarás dos estabelecimentos que implementarem o sistema. A Prefeitura do Rio chegou a conceder no dia 3 de setembro alvará de licença para a To All Games instalar um posto de aposta na Tribuna A do Hipódromo da Gávea, mas a Seop (Secretaria de Ordem Pública) suspendeu.