SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A militante comunista americana Assata Shakur, ex-membro dos Panteras Negras e do Exército de Libertação Negra (BLA), morreu nesta quinta-feira (25) aos 78 anos em Havana, a capital de Cuba, país onde se exilou depois de ser condenada pela morte de um policial nos Estados Unidos em 1973 e de fugir da cadeia em 1979.

A informação foi divulgada nesta sexta (26) pelo regime cubano, que informou que Shakur morreu de causas naturais.

Shakur se tornou um ícone do movimento negro nos EUA e em todo o mundo após seu julgamento e condenação, considerados injustos por apoiadores e ativistas de direitos civis. Depois de mais de cinco anos presa, boa parte desse tempo passado em isolamento solitário, Shakur fugiu da cadeia com a ajuda do BLA e da organização comunista 19 de Maio.

Em 1984, ela ressurgiu em Cuba, tendo recebido asilo político de Fidel Castro. Shakur viveu no país caribenho o resto da vida, escrevendo livros e trabalhando como editora em língua inglesa da Rádio Havana. Autoridades americanas fizeram várias tentativas de extraditá-la e ofereciam, até hoje, uma recompensa de US$ 2 milhões por informações que levassem à sua captura.

Nascida em 1947 em Nova York com o nome JoAnne Deborah Byron, Shakur se mudou com três anos de idade para a Carolina do Norte após o divórcio dos pais, vivendo com os avós sob a dura realidade da segregação do sul dos EUA nos anos 1950 e 1960.

Filha de uma professora de ensino secundário, Shakur voltou a morar em Nova York por volta de 1965, fazendo faculdade em universidades públicas da cidade, em que se envolveu com o movimento de direitos civis dos EUA e com organizações comunistas, como o Partido dos Panteras Negras e o BLA. Os dois foram fortemente reprimidos pelo governo americano e pelo FBI, que infiltrou as organizações, e logo Shakur se tornou conhecida das autoridades.

Em 1971, como era comum entre alguns militantes do movimento negro da época, renegou seu nome de batismo como um “nome de escrava” e passou a usar Assata Olugbala Shakur, um nome da África Ocidental que significa “aquela que luta, que salva e que agradece”. Apesar de não possuir grau de parentesco, era amiga da Pantera Negra Afeni Shakur e madrinha de seu filho, o conhecido rapper Tupac Shakur.

De 1965 a 1973, Shakur se envolveu mais profundamente com o BLA, organização marxista-leninista que pregava a luta armada e tinha como objetivo a derrubada do governo americano. Ela passou a participar de crimes como roubos à banco e ataques a viaturas policiais em Nova York.

A militante foi acusada pelas autoridades de vários ataques contra agentes de segurança, ações que o BLA via como autodefesa e reação a casos conhecidos de violência policial contra pessoas negras, racismo e linchamentos nos EUA na época.

Em maio de 1973, Shakur e dois outros membros do BLA, Zayd Malik e Sundiata Acoli, se envolveram em um tiroteio com dois policiais em uma rodovia próxima à cidade de New Brunswick, no estado de Nova Jersey.

De acordo com a polícia, os três abriram fogo depois de serem abordados, enquanto Shakur afirmava que Acoli foi o único dos ocupantes do carro a disparar contra os agentes. O incidente terminou com a morte de Malik e de um dos policiais, Werner Foerster.

Após um longo e tortuoso processo jurídico, interrompido graças à gravidez de Shakur, que deu à luz sua filha Kakuya enquanto estava presa, a militante foi condenada pela morte de Foerster em 1977. Sua condenação se deu apesar do fato de que Acoli já havia sido identificado e condenado como o autor dos disparos em 1974 e de provas médicas indicando que ela havia sido baleada no braço e no ombro, um ferimento que paralisou seus movimentos e a impediria de disparar uma arma.

O julgamento foi amplamente coberto pela imprensa americana e internacional da época, tornando-se particularmente conhecido na União Soviética. Os advogados de defesa de Shakur denunciaram, ao longo do processo, terem sido vítimas de intimidação de policiais, escutas ilegais do FBI, racismo contra integrantes negros da equipe jurídica e uma invasão do escritório onde trabalhavam.

Condenada à prisão perpétua, Shakur fugiu da cadeia em 1979, quando membros do BLA que a visitavam conseguiram entrar com pistolas e dinamite na penitenciária. Eles fizeram dois guardas reféns durante a ação e escaparam com uma van -ninguém foi ferido.

Pelos próximos anos, até que a fuga de Shakur do país fosse conhecida, o FBI monitorou as comunicações de seus amigos e família, e fez operações frequentes em bairros majoritariamente negros de Nova York onde suspeitavam que a militante poderia estar escondida.

Em 1987, o jornal Newsday publicou uma entrevista com Shakur, revelando que ela estava em Cuba desde 1984, tendo recebido asilo político de Fidel Castro, que a militante chamou de “herói dos oprimidos”. Em 2005, Fidel defendeu Shakur, dizendo que ela era vítima de perseguição racial.

O governo dos EUA tentou extraditá-la várias vezes, sem sucesso. Em 2005, o FBI aumentou a recompensa por sua captura para US$ 1 milhão (R$ 5,35 milhões) e, em 2013, dobrou o valor e colocou Shakur na sua lista de terroristas mais procurados, a primeira vez que uma mulher recebeu essa classificação.

Em 2017, em seu primeiro mandato, o presidente Donald Trump exigiu de Havana a extradição de Shakur como precondição para quaisquer conversas sobre as sanções americanas contra o regime. A diplomacia cubana sempre se recusou a negociar a entrega da militante.