RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Polícia Civil do Ceará investiga o ataque a tiros que deixou dois adolescentes mortos e outros três feridos na escola estadual Luis Felipe, em Sobral (CE), na manhã de quinta-feira (25). O caso ocorreu no bairro Campo dos Velhos, marcado por disputas entre facções criminosas.
Um homem suspeito de participar do crime foi preso nesta sexta-feira (26). Segundo o secretário da Segurança e Defesa Social, Roberto Sá, ele é apontado como um dos autores dos disparos. A identidade não foi divulgada. Em depoimento, o homem de 29 negou envolvimento, mas caiu em contradição, de acordo com a polícia.
O governo estadual reforçou o policiamento, anunciou medidas emergenciais e deslocou equipes de Educação e Direitos Humanos para acompanhar a comunidade escolar. A busca por um segundo envolvido continua.
Veja a seguir o que se sabe sobre o caso até o momento.
Como o ataque aconteceu?
O atentado ocorreu por volta das 9h30, pouco depois do início do intervalo das aulas. Uma câmera de segurança registrou o momento em que dois homens estacionaram uma motocicleta na rua Coronel José Silvestre, desceram do veículo e caminharam em direção ao colégio. Em seguida, é possível ouvir barulho de tiros. Os suspeitos retornaram correndo, subiram na moto e fugiram.
O bairro Campo dos Velhos, onde fica a escola, é conhecido por disputas entre facções criminosas. A Polícia Militar afirma que o ataque tem relação com o tráfico de drogas na região. Com uma das vítimas, foram apreendidas drogas, uma balança de precisão e embalagens para venda.
Qual seria a motivação?
A investigação aponta que o ataque está ligado a uma guerra entre facções criminosas. O bairro Campo dos Velhos é disputado pelo Comando Vermelho, de origem carioca, que tem avançado no Ceará e reduzido a influência do GDE (Guardiões do Estado), facção local marcada por chacinas.
O episódio também se conecta com a rivalidade com o PCC (Primeiro Comando da Capital), presente em comunidades vizinhas. Um dos adolescentes mortos era vizinho de um aluno da escola que havia pedido transferência após receber ameaças, mas não foi atingido no tiroteio. Essa rede de conflitos sugere que o crime pode ter sido mais um capítulo da disputa entre facções rivais.
Quem são as vítimas?
Os estudantes Victor Guilherme Sousa de Aguiar, 16, e Luiz Cláudio Sousa Oliveira Filho, 17, morreram ainda na escola, minutos após o início do tiroteio. Os dois foram enterrados nesta sexta-feira (26) no Cemitério São Francisco, em Sobral.
Três colegas ficaram feridos. De acordo com a Santa Casa de Misericórdia de Sobral, dois adolescentes receberam alta hospitalar já na tarde de quinta-feira (25). Um terceiro permanece internado sob cuidados da equipe multiprofissional.
Um dos adolescentes feridos, de 16 anos, já responde por atos infracionais análogos a crimes como homicídio, porte ilegal de arma de fogo, roubo e dano. Os outros dois atingidos têm 17 anos.
Quem foi preso?
O homem de 29 anos preso nesta sexta-feira (26) é apontado pela Secretaria da Segurança do Ceará como um dos responsáveis pelos disparos contra os alunos. Embora sua identidade não tenha sido revelada, o secretário Roberto Sá afirmou que ele tem uma longa ficha criminal, incluindo passagens por homicídio e roubo.
De acordo com Sá, o suspeito já havia sido preso por homicídio em 2016, foi solto em 2018 e detido novamente em 2019, por roubo. Em março deste ano, voltou a deixar o sistema prisional. Ele é investigado por um novo homicídio ocorrido em julho, e estava sob mandado de prisão quando, segundo a polícia, participou do ataque em Sobral.
O que ele disse à polícia?
Segundo o secretário Roberto Sá, o suspeito nega envolvimento no atentado, mas entra em contradição durante os depoimentos. A polícia afirma ter provas e indícios de que ele esteve no local do crime. “Há muitos indícios, muitas provas de que ele esteve no cenário do crime. A autoridade policial que vai efetuar o auto de prisão em flagrante tem a convicção de que ele praticou os disparos”, disse Sá.
As armas usadas ainda não foram localizadas. A polícia apreendeu duas armas que estão sob perícia, mas não confirmou se foram utilizadas no ataque. De acordo com o secretário, o suspeito se recusa a revelar onde estariam os armamentos.
O que foi feito após o ataque?
O governo estadual criou um Gabinete Extraordinário de Segurança em Sobral e enviou à Assembleia Legislativa projeto que autoriza a compra de parte das férias de policiais militares para aumentar o efetivo nas ruas. O reforço policial foi imediato, e a cúpula da Secretaria da Segurança foi deslocada para acompanhar as investigações.
O governador Elmano de Freitas (PT) classificou o caso como “intolerável e gravíssimo” e prestou solidariedade às famílias. O ministro da Educação, Camilo Santana (PT), que é cearense, também lamentou o episódio e afirmou que equipes especializadas do MEC acompanham a situação por meio do Núcleo de Resposta e Reconstrução de Comunidades Escolares.
A Secretaria Estadual de Educação suspendeu as aulas na escola nesta sexta-feira (26) e afirmou que a comunidade escolar receberá apoio psicológico. A Frente Parlamentar Mista da Educação, no Congresso, manifestou pesar e defendeu a aprovação do projeto que cria a Política de Prevenção e Combate à Violência em Âmbito Escolar.
Qual é o contexto da violência em Sobral?
Sobral está entre as cidades mais violentas do país. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, tem taxa de 59,9 homicídios por 100 mil habitantes -a 12ª maior do Brasil. Nos últimos dias, o próprio bairro onde fica a escola já havia registrado dois ataques armados.
O cenário contrasta com a imagem da cidade como referência em educação básica. Sobral lidera há anos os rankings nacionais do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) e tem resultados de alfabetização que superam médias internacionais. Em 2023, a cidade alcançou nota 9,6 no índice, reflexo de políticas iniciadas em 2004.
O que falta esclarecer?
A Polícia Civil segue em busca do segundo suspeito e tenta localizar as armas utilizadas no crime. Além disso, investiga a possível ligação do atentado com outros ataques recentes no bairro.
Ainda não está claro se o alvo dos disparos era algum estudante específico ou se o ataque teve caráter de intimidação mais amplo dentro da disputa entre facções. As autoridades afirmam que o caso não ficará impune e que novas medidas de segurança devem ser adotadas nos próximos dias.