SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um projeto criado pela trancista Vitória Emanoely Castro, 24, de Franco da Rocha, na região metropolitana de São Paulo, coleta resíduos do material usado nas tranças box, penteados afro que usam extensões de cabelo sintético, e encaminha para a reciclagem.

A jovem, que concilia a rotina de professora de biologia com o trabalho no salão de beleza e o Recicla Braids, conta que seu objetivo é dar visibilidade a profissionais da periferia que também estão preocupados com o impacto ambiental de suas atividades.

Vitória diz sempre ter se incomodado com a quantidade de fibra que ia para o lixo comum ao final dos atendimentos, mas a preocupação com o descarte dos cabelos sintéticos aumentou após ingressar no curso de biologia, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em Sorocaba.

“A faculdade era muito ligada à conservação ambiental e, na época, conciliava o curso com o meu trabalho e, quando estava trançando, comecei a ficar muito incomodada com o tanto de jumbo [material usado para trançar] que era jogado fora.”

Foi nessa época, em 2023, que ela começou a pesquisar sobre possibilidades de reutilizar a fibra, mas o projeto só saiu do papel no final de 2024, depois de retornar para sua cidade. Hoje, ela organiza coletas com as trancistas que integram o Recicla Braids, encaminha os lotes para reciclagem e também divulga o trabalho em seu perfil no Instagram.

Sete profissionais participam ativamente das atividades do projeto, que têm 30 trancistas da região de Vitória cadastradas.

A iniciativa ganhou visibilidade quando Vitória começou a compartilhar o projeto nas suas redes sociais. Trancistas de outros estados mostraram interesse em participar e compartilharam a vontade de entender como destinar corretamente os resíduos das fibras que usam.

Mesmo em fase inicial, ela se diz contente com o alcance que tem conseguido, já que sua intenção era “começar do jeito que dá” para não deixar a ideia se perder.

Segundo ela, a logística é um desafio porque o plástico é volumoso e leve. Então, para juntar uma quantidade que as empresas de reciclagem possam trabalhar, é necessário ter espaço para armazenar os resíduos e arcar com o custo do transporte, o que, afirma, sem financiamento, impede que as remessas sejam mais frequentes.

A depender do penteado, as trancistas cortam sobras do jumbo para dar o acabamento certo e deixar o cabelo com o comprimento desejado, essas são as sobras que o projeto recolhe -elas são pequenas para serem aproveitadas, por isso são descartadas.

O próximo passo do projeto é conseguir destinar para a reciclagem a fibra retirada dos penteados após o uso, com resíduo de produtos capilares. O cabelo usado nas tranças box e em outros penteados afro geralmente é feito de plástico, neste caso o polipropileno.

Vitória conta que queria ter certeza de que o material das tranças poderia ser reaproveitado, já que não havia encontrado empresas que trabalhassem com o polipropileno neste formato. Foi então que ela entrou em contato com uma professora do departamento de engenharia de produção da UFSCar que estuda propriedades do plástico. Vitória começou a levar amostras para a professora que, junto de outras duas alunas da pós-graduação, fez testes para comprovar que a fibra poderia ser derretida e transformada em novos produtos.

As pesquisadoras moldaram placas utilizando o jumbo, com e sem resíduos de produtos capilares, e submeteram os materiais a testes. Os resultados indicaram que a fibra pode ser reaproveitada sem perda significativa de qualidade e o grupo publicou as descobertas em um artigo apresentado no ano passado no Congresso Brasileiro Interdisciplinar em Ciência e Tecnologia.

O passo seguinte foi procurar uma empresa para receber o cabelo que ela já havia começado a juntar. Ela encontrou uma companhia em Caieiras, cidade vizinha à Franco da Rocha. Explicou o projeto ao responsável, que nunca havia usado o material, mas topou fazer a reciclagem da fibra.

O local que costumava trabalhar apenas com toneladas de resíduos que recebe de grandes indústrias agora recebe, também, entregas de 15 kg ou 20 kg do Recicla Braids.

“Pode até parecer pouco, mas em volume é bastante”, afirma ela que completa contando ter planos de conseguir recursos para expandir a iniciativa para outras cidades.