SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Farmácias brasileiras estão sem estoque de Rivotril (clonazepam) nas versões em gotas de 2,5 mg/mL e sublingual de 0,25 mg.

Segundo a Biopas Brasil Produtos Farmacêuticos, fabricante do remédio, o desabastecimento é temporário e ocorre devido a uma “alteração de local de fabricação do medicamento”. Questionada sobre mais detalhes nas alterações, se de mudança estrutural ou de endereço, a empresa não respondeu até a publicação desta reportagem.

A Biopas afirmou que a distribuição da versão em gotas deve ser regularizada ainda em 2025 e a do sublingual no primeiro semestre de 2026. Disse ainda que a apresentação comercial de Rivotril 2 mg com 30 comprimidos continua disponível normalmente.

O Rivotril é amplamente utilizado para tratar diversas condições, incluindo transtornos de ansiedade e de pânico, síndromes psicóticas, crises epilépticas, espasmos infantis (síndrome de West), pernas inquietas, problemas de equilíbrio, síndrome da boca ardente e vertigem, conforme detalhado na bula.

A reportagem acessou os sites das quatro principais redes de drogarias —Droga Raia, Drogasil, Farmácias Pague Menos e Drogarias São Paulo— para verificar a disponibilidade do Rivotril em gotas.

Nos sistemas da Pague Menos e Drogarias São Paulo não foi encontrado estoque do medicamento em nenhuma das cidades consultadas. Já no site da Droga Raia, há disponibilidade de Rivotril em gotas nas cidades de Curitiba e Campo Grande. Na Drogasil, o produto está disponível apenas em Campo Grande e São Paulo.

No entanto, ao ir a unidades da Droga Raia e Drogasil na capital paulista, a reportagem foi informada que não há Rivotril em gotas em nenhuma loja paulistana. O medicamento também não foi encontrado em farmácias menores.

Para a consulta, foi utilizado o CEP de um órgão público de cada uma das 26 capitais brasileiras, além do Distrito Federal. A escolha das drogarias foi baseada nas informações da Biopas, que, por email, recomendou essas quatro redes aos pacientes que reclamaram no site Reclame Aqui por não encontrarem o medicamento.

Pacientes de diversas cidades do país têm registrado reclamações no site Reclame Aqui devido à falta de Rivotril em gotas nas farmácias.

Moradores de grandes centros urbanos, como Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Goiânia e Campo Grande, bem como de municípios do interior, como Montes Claros (MG), Poços de Caldas (MG), Bauru (SP), Alambari (SP) e São Bento do Sul (SC), relataram a dificuldade de encontrar o medicamento em farmácias de suas cidades.

Alguns comentários expressam preocupação com os impactos na saúde devido à duração do desabastecimento, principalmente os pacientes que fazem uso contínuo do remédio e que relatam dificuldades na substituição pelo genérico.

Uma moradora de Teresópolis (RJ) relatou prejuízos pessoais e profissionais causados pela falta do Rivotril, afirmando que o genérico não substituiu adequadamente o medicamento original.

“A substituição pelo genérico já foi tentada, porém não surtiu o mesmo efeito terapêutico, acarretando prejuízos relevantes à continuidade do tratamento.”

Também há queixas de falta de informações e dificuldades de comunicação com as empresas responsáveis pela produção e distribuição. Uma pessoa que se identifica como médica em São Paulo, disse que estava indignada com a justificativa de “ajuste na planta de produção” e afirmou que faria reclamações na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Em novembro de 2024, a Blanver, atual detentora da patente do Rivotril, já havia anunciado a interrupção do medicamento nas seguintes versões: Rivotril 0,5 mg (apresentações com 20 e 30 comprimidos) e Rivotril 2 mg (apresentação com 20 comprimidos).

Apesar do desabastecimento temporário da versão em gotas e sublingual, especialistas afirmam que há alternativas genéricas contendo o princípio ativo clonazepam para que pacientes possam manter o tratamento sem interrupções.

DIFERENÇAS ENTRE O MEDICAMENTO DE REFERÊNCIA E O GENÉRICO

A psiquiatra Tânia Ferraz Alves, diretora de unidades de internação do IPq-HCFMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), recomenda com segurança o uso de versões genéricas do Rivotril, desde que o paciente mantenha o acompanhamento médico adequado e evite alternar entre marcas diferentes para garantir a estabilidade do tratamento.

“Quando há a necessidade de trocar do original para o genérico ou para um similar, recomendo escolher uma única marca e continuar comprando os produtos desse mesmo laboratório. Isso é importante porque ficar variando entre eles pode afetar a eficácia e a tolerância do paciente.”

Alves explica que um medicamento original, como o Rivotril, é o primeiro desenvolvido e estudado por um laboratório que detém a patente, neste caso, a Blanver.

Após a quebra da patente, surgem outras opções: o clone, feito pelo mesmo laboratório com outro nome para negociar preço, o similar, produzido por outro laboratório com nome fantasia, e o genérico, que usa o nome da substância (clonazepam).

Além do princípio ativo, os medicamentos têm diferentes substâncias que ajudam na ingestão, como corantes e estabilizantes, que podem variar entre laboratórios e causar diferenças na percepção do paciente, incluindo leves efeitos colaterais. Por isso a recomendação de permanecer com a mesma marca.

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“Ainda existe um grande tabu em relação aos medicamentos genéricos. Muitas vezes, quando um paciente recebe um genérico, parte do pressuposto de que ele não possui a mesma qualidade do medicamento de referência, o que nem sempre é verdade”, afirma Débora de Carvalho, gerente de farmácia do Hospital Sírio-Libanês.

Segundo ela, os genéricos no Brasil são regulamentados por normas rigorosas e precisam passar por testes de bioequivalência e biodisponibilidade para comprovar que têm a mesma disponibilidade do princípio ativo que o medicamento original.

“Existem algumas percepções que vêm do próprio usuário. Quando a pessoa usa regularmente uma marca específica, seja ela genérica ou similar, pode acabar percebendo diferenças, mas muitas vezes essa sensação é fruto da própria percepção do paciente”, afirma Carvalho.

Existem algumas percepções que vêm do próprio usuário. Quando a pessoa usa regularmente uma marca específica, seja ela genérica ou similar, pode acabar percebendo diferenças, mas muitas vezes essa sensação é fruto da própria percepção do paciente

gerente de farmácia do Hospital Sírio-Libanês

A reportagem entrou em contato com os órgãos responsáveis para esclarecer a situação sobre o fornecimento de Rivotril no sistema público de saúde.

A assessoria do Ministério da Saúde explicou que os recursos destinados à compra de medicamentos como o Rivotril são repassados aos estados, que ficam responsáveis pela aquisição conforme a demanda local.

A pasta afirmou que não controla diretamente a compra detalhada nem a marca adquirida, que pode ser tanto o medicamento original, Rivotril, quanto o genérico. O repasse é feito em valores globais para a atenção básica, sem especificação por medicamento, cabendo aos estados o detalhamento da distribuição para os municípios.

A SES-SP (Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo) afirmou que o clonazepam (genérico do Rivotril), nas apresentações de 2mg e 2,5mg, está sendo distribuído regularmente, sem interrupções ou atrasos, aos municípios participantes do Programa Dose Certa. Na cidade de São Paulo, a gestão do medicamento é feita pelo próprio município.

A SMS (Secretaria Municipal da Saúde) informou que possui estoque do medicamento clonazepam e que as unidades de saúde estão abastecidas com o insumo.

A reportagem tentou contato com a Anvisa para obter esclarecimentos, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.