SÃO PAULO, SP E AQUIDAUANA, MS (FOLHAPRESS) – Quatro pessoas morreram na queda de um avião de pequeno porte na noite desta terça-feira (23) na cidade de Aquidauana, em Mato Grosso do Sul. O acidente ocorreu quando a aeronave se preparava para pousar na Fazenda Barra Mansa. Não houve sobreviventes e os corpos foram encontrados carbonizados.

Entre as vítimas está o arquiteto chinês Kongjian Yu, 62, mundialmente reconhecido por idealizar o conceito de cidades-esponja, técnica que usa a vegetação e o desenho de rios e córregos em projetos urbanísticos para mitigar enchentes.

Também estavam a bordo o documentarista Luiz Ferraz, 42, e o diretor de fotografia Rubens Crispim Júnior, 51. A equipe acompanhava estava na região do pantanal com o arquiteto para a produção de um documentário.

O piloto Marcelo Pereira de Barros, 59, também era o proprietário do avião, um modelo Cesnna 175 fabricado em 1958. O equipamento estava regular nos registros da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

A agência informou, porém, que a aeronave não estava autorizada a fazer voos noturnos. As informações fornecidas pelos órgãos de controle até a publicação deste texto não permitem afirmar que o piloto havia sido contratado para fazer táxi aéreo, serviço que ele não estava autorizado a realizar.

Designada para investigar as causas do acidente, a delegada Ana Cláudia Medina informou que o grupo havia decolado ainda na manhã de terça, por volta das 7h, e fez três sobrevoos em fazendas da região. O retorno para a fazenda ocorreria após as 18h, fora do horário permitido –até as 14h40. A pista tem autorização somente para pouso visual. O pôr do sol ocorreu às 17h39.

“Ele [avião] veio com uma performance não muito alinhada para o primeiro pouso e acabou arremetendo”, afirmou. Depois disso, segundo relato de testemunhas à delegada, eles perderam contato visual e, em seguida, observaram a fumaça no local em que, mais tarde, os destroços foram encontrados.

Medina é a titular da Dracco, departamento policial responsável por atuar contra o crime organizado, mas que tradicionalmente investiga acidentes aéreos na região.

Funcionários da fazenda Barra Mansa, onde funciona a pousada em que as vítimas estavam hospedadas, foram ao local para apagar o fogo, disse o prefeito de Aquidauana, Mauro do Atlântico (PL). A queda, segundo ele, ocorreu em uma área desabitada e relativamente distante da pista de pouso.

A operação de busca e resgate durou cerca de nove horas, devido a distância e as condições de acesso ao local.

Após a análise das Polícias Científica e Civil, os corpos foram retirados das ferragens pelo Corpo de Bombeiros e entregues ao serviço funerário.

O delegado de Aquidauana, Amylcar Paracatu Romero, explicou que o corpo do arquiteto ficará armazenado e lacrado até a chegada da família da China para que autorizem o exame de necropsia, quando será feita também a coleta do padrão de DNA.

“Por um pedido do consulado, e respeitando as tradições religiosas do país, o IML não vai fazer o exame enquanto a família não estiver presente, isso foi uma solicitação do consulado”, disse o delegado.

A necropsia das demais vítimas, brasileiras, já foi finalizada, mas liberação dos corpos depende do exame de DNA.

Investigadores do Quarto Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos foram destacados para a apuração inicial das causas do acidente, de acordo com a FAB (Força Aérea Brasileira).

O Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) não havia chegado ao local até a noite desta quarta-feira (24). A expectativa é que as equipes realizem o trabalho no local nesta quinta-feira (25).

QUEM SÃO AS VÍTIMAS

– Marcelo Pereira de Barros, 59 anos

– Kongjian Yu, 62 anos

– Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz, 42 anos

– Rubens Crispim Jr., 51 anos

Além de participar da gravação de um documentário durante sua última passagem pelo Brasil, Kongjian esteve na semana passada presente na abertura da Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, que expõe alguns de seus projetos.

Em visita anterior ao país, no início de setembro, o arquiteto fez uma palestra na Conferência Internacional CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo). Na ocasião, ele falou sobre o conceito cidades-esponja, aplicado em mais de 250 cidades, e defendeu soluções baseadas na natureza para enfrentar enchentes urbanas e os efeitos da crise climática. Em nota, o CAU lamentou a morte de Kongjian.

O chinês fundou o escritório Turenscape, em Pequim, e recebeu prêmios como o IFLA Sir Geoffrey Jellicoe Award (2020), o Cooper Hewitt National Design Award (2023) e o RAIC International Prize (2025). “Sua contribuição influenciou políticas públicas ambientais na China e em outros países”, segundo a nota do CAU.

A presidente do conselho no Brasil, Patrícia Sarquis Herden, afirma que a obra do arquiteto deixa um legado de compromisso com a sustentabilidade, a paisagem e a vida urbana.

Também morto no acidente, o documentarista Luiz Ferraz, produziu o filme “Dossiê Chapecó: O Jogo por Trás da Tragédia”, que trata sobre o acidente aéreo que matou jogadores, comissão técnica da Chapecoense e jornalistas em novembro de 2016 e foi indicada ao Emmy Internacional.

O documentarista Luiz Ferraz é descrito no site da Academia Brasileira de Cinema como especialista em projetos de documentários e produções de não ficção. Desde 2007 ele produzia e dirigia na Olé Produções e também trabalhava com outras empresas do mercado.

Ferraz também dirigiu a série “To Win or To Win”, sobre o time de futebol árabe Al Nassr FC, onde joga atualmente Cristiano Ronaldo. Também assina um episódio da série “All or Nothing: Seleção Brasileira de Futebol”, projeto da Amazon Prime Video no Brasil, assim como a direção da série “Cine Terror” para o canal Prime Box Brazil.

Foi criador do bloco de Carnaval Confraria do Pasmado. Nas redes, o bloco lamenta a morte do cineasta. “Luiz sempre esteve presente como símbolo do espírito coletivo que nos move. Seu trabalho e sua paixão ajudaram a moldar não só o nosso bloco, mas também o carnaval de rua paulistano, que hoje pulsa forte e diversos graças, em parte, à sua dedicação”, declara o bloco.

A Olé Produções, onde trabalhavam o documentarista e Rubens Crispim Júnior, lamentou as mortes. “A família lamenta profundamente o ocorrido e agradece as inúmeras mensagens de carinho e solidariedade recebidas neste momento de dor”, diz a empresa.

A Fazenda Barra Mansa, onde a aeronave caiu, foi usada pela TV Globo para a gravação da novela Pantanal, exibida originalmente em 1990 e regravada em 2022. A propriedade foi fundada por Aniceto Rondon, nos anos 1940, quando recebeu as terras como herança de família, e foi aberta para visitantes em 1996.

No site da propriedade, que também funciona como hotel, é explicado que o acesso por meio terrestre é uma “aventura” e pode durar cerca de três horas e meia, caso o hospede saia de Aquidauana, cinco horas e meia, partindo de Campo Grande e seis horas de Bonito, também em Mato Grosso do Sul.